Quando muitos achavam que o arquiteto canadense esgotara suas formas, que parecem voar, nas suas edificações, celebradas a partir do museu Guggenheim de Bilbao, Espanha, até o complexo de concertos Walt Disney, em Los Angeles, EUA, eis que obra instigante, construída perto do parque Bois de Bologne, Paris, inaugura outra fase na sua polêmica trajetória
Joseph Young
A obra é o museu de arte contemporânea e sede da fundação Louis Vuitton — a marca global francesa que promove o design e qualidade da moda feminina, cujas lojas em Paris têm filas de clientes, principalmente chinesas e japoneses, esperando a hora de entrar. A empresa buscava uma sede que transmitisse instantaneamente seus conceitos de excelência em design e singularidade ao público. Embora possamos ter nossas opiniões pessoais a respeito da arquitetura vanguardista, somos obrigados a reconhecer que mais uma vez Frank Gehry desenhou uma estrutura que, uma vez feita, nunca mais se repete.
Quando a obra abriu as portas atraiu não poucas críticas. Um jornal inglês chegou a divulgar que “parecia um remake do Opera House, de Sidney, na Austrália”. Assim que Frank Gehry chegou à Espanha para receber o prêmio Príncipe das Astúrias, justamente na terra onde o Museu Guggenheim de Bilbao é o marco inconfundível da sua trajetória, participou de uma coletiva em que jornalistas mencionaram as críticas que ele vem recebendo pelo projeto da Fundação Louis Vuitton.
Ele mostrou o dedo para os críticos, num gesto de rebeldia, e ainda arrematou: “98% dos prédios projetados hoje são uma m… Poucos ousam falar algo diferente. Deus, deixe-nos em paz…” Aos 85 anos, e com 76 obras polêmicas, mas respeitadas, Gehry tem esse direito. O Centro George Pompidou, em Paris, exibe atualmente uma mostra especial de seus projetos mais conhecidos. Maquetes, fotos e vídeos podem ser vistos até 26 de janeiro de 2015.
Algumas das críticas apontam que as “velas de vidro”, a marca registrada do edifício Louis Vuitton, são supérfluas e nada acrescentam ao projeto. Desculpem, senhores. Nesse caso é melhor nem encomendar o projeto ao arquiteto Frank Gehry — e trocar por um caixotão de concreto aparente. É verdade que quem contrata Frank Gehry precisa ter bolsos fundos; nesse caso, era o dono da marca, o homem mais rico da França, Bernard Arnault.
O empresário conseguiu estabelecer uma negociação sui generis com o Estado francês, que cedeu o espaço perto do histórico Jardim de Aclimação, no parque Bois de Bologne, para a edificação, que será doada como bem público ao final de 55 anos. O projeto chegou a ser paralisado pelos grupos locais que a ele se opunham, mas a Assembleia Nacional votou uma lei declarando o empreendimento de interesse nacional e derrubou todos os vetos. Para não ferir a legislação local que limitava as edificações em caráter excepcional a um único andar, o museu Louis Vuitton tem uma série de mezaninos para se adequar a esta restrição. Business fala mais alto até na França, tão zelosa de sua tradição e artes. Aliás, do topo do museu há vistas deslumbrantes de Paris, com um único porém: um edifício alto de La Defense confunde a vista oferecida pela Torre Eiffel — como um flagrante lembrete da contradição entre as artes e os negócios.
A arquitura de Frank Gehry se enquadra na categoria dos artistas “radicais”— você vai amá-lo ou odiá-lo. Não há meio-termo. O museu Guggenheim de Bilbao, na Espanha, que marcou a estreia do arquiteto no cenário global, foi talvez uma exceção. Como se fosse uma lua de mel dele com o público e a crítica, numa linha estética que se estendeu até o prédio Walt Disney Music Hall, em Los Angeles, com alguns edifícios altos que pareciam não se dar bem com as formas livres típicas do arquiteto, construídos nesse período.
Gehry foi pioneiro na experiência com o uso de novos materiais e no resgate da madeira como elemento estrutural. Mas algo pouco conhecido é o domínio que ele conseguiu dos programas de software para desenhos em 3D, tornando possível a visualização dos resultados da edificação real antes de se cravar a primeira estaca da fundação, através de modelos 3D virtuais em escala. E ele avançou nessa tecnologia, a ponto de detalhar como cada painel curvo ou pilar fora do prumo pode ser construído, resolvendo a questão executiva, que era o pesadelo das construtoras.
A Fundação Louis Vitton representa, de certa maneira, um rompimento com a fase anterior, que começa com o Guggenheim de Bilbao e fecha com o Walt Disney Music Hall, em Los Angeles. Em Paris, no parque Bois de Bologne, Gehry parece embarcar numa nova estética. Isso pode ter desagradado os seus fãs de até então ou aqueles que achavam seu estilo desconstrutivo exaurido.
A nova criação já tem o apelido de iceberg na vizinhança, nave espacial entre os jornalistas, e um “excesso de egocentrismo” pelos críticos. Mas, se você puder vê-la pelo ar, pode parecer um casulo de borboleta se desfazendo, deixando sair as asas. O resultado corresponde à emoção que Frank Gehry sentiu ao visitar o sítio pela primeira vez, quando vislumbrou o desafio de conceber uma edificação que possa ser par aos monumentos históricos até os ícones contemporâneos, como o Beaubourg, em Paris. No voo de volta a Los Angeles, ele encheu um caderno de desenhos. Nesse particular, projetou uma edificação singular. Quanto à polêmica em torno do novo museu, isso faz parte da existência dos vanguardistas. Nem Le Corbusier foi unanimidade na sua época.
Fonte: Revista O Empreiteiro