Morreu ontem, no Recife, vitimado por um avc hemorrágico, o escritor Ariano Suassuna. Por causa dessa tragédia cultural fui à estante e, de lá, retirei o Almanaque Armorial, de sua autoria, que reúne ensaios, artigos, crônicas e o discurso que ele fez em agosto de 1990, quando tomou posse na cadeira nº 32 da Academia Brasileira de Letras, ocupada anteriormente por Genolino Amado.
Reli o discurso. Em parte, para revisitar a prosa memorável do autor de A Pedra do Reino e, em parte, para novo contato com os ensinamentos do mestre sobre o Brasil, tanto o real quanto o oficial. Na peça literária, ele diz que suas dimensões não são as de Euclydes da Cunha, mas “que é à linguagem dele que sempre procurei me filiar”.
Invoca leitura de Alfredo Bosi em que encontra uma distinção feita por Machado de Assis, que lhe dá uma pista sobre o processo histórico brasileiro. E cita a seguinte passagem do mestre de Memorial de Aires: “Não é desprezo pelo que é nosso, não é desdém pelo meu país. O país real, esse é bom, revela os melhores instintos. Mas o país oficial, esse é caricato e burlesco”.
No fundo, Ariano pretendia mostrar aos acadêmicos, em seu discurso, por que era o que era, no feitio humano e na peculiaridade de sua maneira de se apresentar. E dizia: “Não importa: a roupa e as alpercatas que uso em meu dia a dia são apenas uma indicação do meu desejo de identificar meu trabalho de escritor com aquilo que Machado de Assis chamava o Brasil real e que, para mim, é aquele que habita as favelas urbanas e os arraiais do campo”.
Ariano considerava que, o importante, para uma futura edificação do país como nação, seria a substituição da cisão atual pela indispensável identificação em que “pela primeira vez em nossa atormentada história, o Brasil oficial se torne expressão do Brasil real”.
Fonte: Nildo Carlos Oliveira