As lições no diálogo entre três mestres da engenharia

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A construção da Editora Mandadori (projeto de Niemeyer) embasa princípios estruturais que os engenheiros observam nos trabalhos de Bruno Contarini

Fato raro, quase inédito, um encontro com três engenheiros da velha guarda – e põe velha guarda nisso – em um escritório no Rio. Um objetivo comum – falar do Bruno Contarini para a biografia dele, a ser lançada ainda este ano – permitiu o diálogo entre o engenheiro José Carlos Filizola, em seu escritório, na avenida Presidente Wilson, e seus colegas Carlos Alberto Fragelli e Godart Sepeda. Fragelli formou-se em 1953, Godart foi aluno de Contarini na PUC-Rio em 1969 e Filizola formou-se em 1968, todos no segmento da engenharia estrutural.

São engenheiros com ampla quilometragem de experiências, em suas vertentes de trabalho, cada um com seu histórico. Os relatos confluem para os estudos, projetos e soluções que os tornaram, dentre outros, vários dos quais já fora de cena,  nomes dos mais representativos da evolução da engenharia brasileira. O diálogo que se segue é um documento para a História.

Fragelli: O pessoal mais experiente está saindo. Está deixando a cena – ou o canteiro – para os mais novos.

Godart: Os mais novos chegam, mas não têm uma boa formação. E, enquanto os velhos saem, porque não há trabalho ou por causa da idade, os mais novos correm o risco de não contar com a experiência dos mais velhos. Uma falha terrível.

Filizola: Mas não é de hoje que os mais velhos estão saindo de cena. O tempo se encarrega de provocar esse distanciamento. Vejam vocês: Depois que me formei fui trabalhar na Machado da Costa Engenharia, fundada pelo engenheiro Machado da Costa na década de 1930.

Fragelli: Há quanto tempo, Filizola. Isso pode ser um exemplo de que tem faltado, ao longo do tempo, um canal de transmissão do conhecimento de uma geração para outra.

Godart: Naquela época – na época do Bruno, digamos assim – era absolutamente obrigatório que, ao se formar, o jovem engenheiro tivesse a sua iniciação dentro de um escritório de projeto de estrutura.

Filizola: Verdade. Ficávamos estagiando dois ou três anos – e mais quatro ou cinco – vendo os engenheiros da velha guarda difundirem sabedoria. Refiro-me ao Costa Nunes, Dirceu de Alencar Veloso, Sílvio Coelho da Rocha.

Godart: Seria bom acrescentar os nomes do Sidney dos Santos e o seu, Fragelli. Os engenheiros calculistas de hoje não são formados com o mesmo padrão dos engenheiros que estamos citando.  E, tem mais: o jovem engenheiro compra um computador e  o manual, senta e calcula. Se a obra fica em pé na tela, ele manda o projeto pra frente. Essa falta da experiência, que deveria ser obtida no contato com a geração mais velha, provoca milhões de interfaces. Acho que a engenharia de hoje precisa e deve ser repensada.

Fragelli: Tomemos o exemplo do Bruno. Diante de um projeto complexo, ele imaginava como colocá-lo em prática segundo a realidade objetiva. Porque o projeto pode parecer muito bonito. Mas, na hora da execução as coisas podem mudar. Por isso, ele invertia o processo: primeiro a realidade e os dados objetivos para executar o projeto. Portanto, cada projeto, segundo a sua realidade.

Filizola: Esse viés que o Fragelli coloca é sumamente importante. Porque essa coisa de você saber, por antecipação, como constrói uma obra, é uma coisa que acabou. O projeto precisa estar casado com a obra. Isso de chegar no canteiro e dizer que o projeto está bom, mas que tem de bolar outro modo de distribuir a armadura ou de usar outro tipo de perfil metálico, nos remete àquela necessidade de se poder contar com a sabedoria da velha guarda.

Godart: Quando não pudermos contar mais com um Bruno Contarini, um Mário Franco, com o José Luiz Cardoso, Fragelli, Filizola e outros, lamentaremos a falta que esses gênios da engenharia vão nos fazer para sempre. Outra coisa: como diz o Bruno, engenharia é inteligência. E, inteligência, não é computador. Computador é apenas um instrumento da inteligência.

Foi só um diálogo. Em favor da engenharia.

Fonte: Revista O Empreiteiro


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