Couro ecológico cria novo ciclo da borracha na Amazônia

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Nos últimos anos, pesquisadores e cientistas se mobilizaram a fim de desenvolver tecnologias para proteger a Amazônia e permitir sua inserção econômica no contexto nacional. Foi dessa forma que universidades da região investigaram novas maneiras de transformar o velho látex — o mesmo que em duas ocasiões no passado distante trouxeram riqueza e decadência à região – em borracha ecológica.
Ao contrário do processo tradicional que produz o material bruto para uso das indústrias (pneus, artefatos etc.), as tecnologias alternativas trabalham de modo a garantir uma atividade sustentável. Em todas elas, o processo de defumação da borracha – considerado perigoso para a saúde dos seringueiros – foi eliminado.
O couro ecológico, desenvolvida pelo pesquisador Francisco Samonek, professor da Universidade Federal do Acre (UFA) em conjunto com as comunidades tradicionais da região, é uma das promissoras das tecnologias recém-implantadas. O novo processo, pelo fato de não defumar, oferece melhores condições de produção ao seringueiro. Ele é desenvolvido da seguinte forma: o látex nativo é colhido, coado e misturado com agentes vulcanizantes e fibras vegetais (embaúba e o algodoeiro). Depois, o tecido emborrachado é pré-vulcanizado. Paralelamente, são feitos moldes de madeira ou argila, retirados dos resíduos descartados nas indústrias madeireiras. Assim, o composto com a mistura do látex e das fibras é aplicado nos moldes e colocado ao sol para secar. A água evapora e a parte sólida permanece no molde para receber pintura com corantes feitos a partir de espécies locais.
O couro que surge pode virar tapete, toalhas de mesa e outros 20 artefatos.  Com o domínio do novo processo, Samonek e as comunidades de indígenas e seringueiros fundaram, em 2002, o Pólo de Proteção da Biodiversidade e Uso Sustentável dos Recursos Naturais (Poloprobio), uma Oscip voltada às pesquisas e aperfeiçoamento do couro. Hoje, em parceria com a Universidade Federal do Pará, a tecnologia é aplicada nos municípios das ilhas do arquipélago do Marajó e entorno de Belém, locais com os menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) da região.
Francisco Samonek explica o projeto: “Os produtos gerados são totalmente artesanais e os investimentos necessários são de baixo custo. Não exigem nem energia elétrica. As comunidades não vendem mais matéria-prima, porém, produtos prontos para o mercado, com alto valor agregado como utilidades domésticas e peças decorativas. São mantas, tapetes, pad-mouses, vasos, pinturas em látex em camisetas e bonés, com desenhos indígenas e motivos regionais, entre outros.”
Com um mercado nacional crescente, e começando a abertura para o mercado externo, a experiência tem trazido bons resultados, aponta o pesquisador: “A simplificação do processo de vulcanização da borracha, permite que um seringueiro no meio da floresta vulcanize, de forma artesanal, os seus 10 litros de látex da colheita diária. Um kg de borracha vendido no sistema convencional, com subsídios da Conab, vale R$ 3,50. No caso dessa tecnologia, um kg de mix de produtos atinge R$ 81,00, na média”.
Atualmente, existem sete projetos de pesquisa na Amazônia, financiados pela Petrobras e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), atendendo quatro estados: Acre, Amazonas, Pará e Roraima, em 48 comunidades, localizadas em reservas e projetos de assentamentos extrativistas e terras Indígenas, com 1.225 pessoas diretamente envolvidas. Eles atendem seringueiros, indígenas, ribeirinhos, pequenos produtores rurais e quilombolas. Participam dez etnias indígenas: Kaxinawá, Shanenawa, Kaxarari, Apurinã, Dessana, Tukano, Baniwa, Tariana, Piratapuya, Uanano.

USO DA TECNOLOGIA EM ESCALA INDUSTRIAL

Há três anos, uma empresa em Magda, região noroeste de São Paulo, fabrica o laminado de látex em escala industrial — utilizando o mesmo princípio de produção do couro ecológico —, após pesquisas realizadas na reserva de Maracatiara, no centro-oeste de Rondônia. Ele sai da fábrica em bobinas contínuas de 25 m lineares e 1,3 m de largura, em várias gramaturas (espessuras), cores e texturas. O material pode ser usado no revestimento de cadeiras, bancos de automóveis, além da fabricação de calçados e vestuário. Atualmente a empresa produz 25 mil m/mês do produto.    
Jaime Marques Rodrigues, diretor da Ecológica destaca um dos produtos que a empresa fabrica: “A Ecoball é uma bola esportiva, possui o tamanho oficial e é composta por látex natural, pesando de 260 a 280 g com 65 a 67 cm de circunferência. O interior é composto por uma câmara
de látex, miolo removível e lubrificado. A produção segue os padrões definidos pelas federações e confederações de voleibol e futebol. Em breve a bola poderá rolar oficialmente nos campos”.
A Ecológica tem uma fábrica na cidade de Xapuri (AC) onde os empregados trabalham na fabricação de bolas de futsal, voleibol, handebol e basquetebol. A meta inicial é a produção de 35 a 60 mil bolas ecológicas por ano.

  TÊNIS ECOLÓGICO

Os irmãos Rafael e Bruno Narciso, skatistas de longa data, procuravam um produto diferenciado quando pensaram em abrir uma pequena empresa. Em agosto de 2008, inauguraram a marca de calçado Oüs. “Desde o início nos preocupamos em começar algo diferente, com respeito ao meio ambiente. Assim, desde que lançamos a marca temos pesquisado soluções e alternativas em substituição aos materiais tradicionais. Um dos produtos é o tênis ecológico”, conta o jovem empreendedor.
Feito de látex natural e algodão, o couro usado na fabricação do tênis é comprado da Ecológica e não gera resíduos em nenhuma fase da produção. “A aderência é ótima e os tênis nunca furam”, garantem os skatistas consumidores.
Hoje, a Oüs está presente em 15 estados brasileiros e exporta o tênis de couro ecológico para o Chile, Austrália e Noruega. Em 2011 a empresa prevê fechar o ano com um faturamento superior a R$ 2 milhões.

 

Fonte: Padrão


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