A grandiosidade de Belo Monte, que com seus 11.233 MW de potência instalada será a segunda maior do País, perdendo apenas para Itaipu, de 14 mil MW, acabou se transformando em um entrave à sua implantação, por conta do possível impacto negativo do ponto de vista socioambiental. Mas se a usina Belo Monte de fato for construída, como anseia o governo federal, provavelmente será uma vitória marcante para o atual presidente da Eletrobras, José Antônio Muniz Lopes. Será o final feliz de uma longa história pela implantação desse projeto, que remonta à década de 1970, da qual Lopes foi um dos protagonistas do episódio mais marcante. Foi em 1989, quando a índia Tuíra, da tribo Kayapó, brandiu seu facão contra ele, na época diretor da Eletronorte, durante o I Encontro das Nações Indígenas do Xingu, que reuniu quase 600 índios contrários à construção da hidrelétrica. O ato desesperado da índia, registrado em foto, correu o mundo e, aliado ao impacto causado pela visita de dois caciques da mesma tribo à sede do Banco Mundial, em Washington, levou a instituição a cortar a linha de financiamento para hidrelétricas na Amazônia, engavetando o projeto por alguns anos.Na fase atual, o facão foi substituído por outra ferramenta igualmente poderosa: a liminar. Embora o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) tenha autorizado, em junho, a licitação da usina hidrelétrica de Belo Monte, prevista para ocorrer em setembro deste ano, o licenciamento ambiental estava paralisado, até o fechamento dessa edição, por conta de uma liminar da Justiça Federal em Altamira (PA).As principais questões ligadas ao impacto de uma hidrelétrica desse porte já foram solucionados, pelo que consta no EIA/RIMA entregue ao Ibama em maio. O projeto antigo previa a construção de duas barragens complementares, que inundariam 6.500 km². Além disso, seriam construídas outras cinco hidrelétricas no rio Xingu, inundando mais 14 mil km². Mas o atual projeto prevê um reservatório de apenas 516 km² e, após um novo inventário do rio, o CNPE definiu, em 2008, que apenas Belo Monte seria construída no rio Xingu, em região onde já existe intensa atividade agropecuária.A Leme Engenharia é a empresa responsável pela realização do EIA e do Rima. A Themag, a Intertechne e a Engevix estão encarregadas dos estudos das comunidades, terras e áreas indígenas. A elaboração do Rima contou com apoio das construtoras Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. Polêmicas a parte, Belo Monte gerará 5,5% da energia de que o Brasil necessita atualmente e será a terceira do País na relação entre MW gerado e km² inundado, o que indica um excepcional aproveitamento hidrelétrico. O prazo total para implantação da usina é de 10 anos. Do primeiro ao quinto ano serão construídas as estruturas principais (barragens, canais, casas de força e outros) e, do quinto ao décimo ano, as máquinas responsáveis pela geração total de energia nas duas casas de força entrarão em funcionamento. No pico das obras, durante o terceiro ano de construção, 18.700 trabalhadores estarão envolvidos diretamente no projeto, preferencialmente moradores da região, que receberão treinamento para isso. A obra deverá gerar também cerca de 80 mil empregos indiretos. A hidrelétrica atinge diretamente cinco municípios paraenses: Altamira, Brasil Novo, Vitória do Xingu, Senador José Porfírio e Anapu. O reservatório vai operar a fio d'água, ou seja, a usina vai gerar energia elétrica de acordo com a quantidade de água existente no rio, variando ao longo do ano, aproveitando a queda de 90 m entre Altamira e Volta do Xingu.Embora a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) provavelmente vá permitir alterações no projeto básico licitado, assim como ocorreu com a usina Jirau, do Complexo do Rio Madeira, no momento, a usina apresenta uma configuração bem diferente do usual. Geralmente o vertedouro e a casa de força são construídos praticamente lado a lado no local de barramento do rio. Mas Belo Monte será diferente. O aproveitamento hidrelétrico será formado por três sítios: Pimental, Bela vista e Belo Monte, interligados por um conjunto de canais. No barramento principal, em Pimental, localizado a 40 km de Altamira, serão construídos o vertedouro principal e casa de força complementar. Por canais de derivação, parte da água do Xingu seguirá para o reservatório, que terá seu nivel regulado por vertedouro complementar em Bela Vista. Em Belo Monte, a casa de força principal contará com 20 unidades francis de 550 MW cada e terá potência instalada de 11 mil MW. No sítio Pimental, fica o vertedouro principal e a casa de força complementar terá 233,1 MW de potência instalada, distribuída em nove turbinas do tipo bulbo, de 25,9 MW cada.Como o aproveitamento hidrelétrico está planejado a partir de reservatório complementar alimentado por canais de derivação, praticamente toda a obra poderá ser executada a seco. Serão criados cinco canteiros simultâneos, tornando a obra mais rápida. As bases operacionais serão instaladas nos municípios de Vitória do Xingu e Altamira, e os canteiros terão apenas uma infraestrutura básica para funcionar. Mudanças reduzem efeitos negativosNo projeto atual, a área inundada foi reduzida de 1.225 km² para 516 km², divididos em duas partes, sendo 134 km² localizados na parte chamada de reservatório dos canais, e 382 km² no reservatório do Xingu. Estas duas partes estarão ligadas por dois canais. No Reservatório do Xingu, 228 km² já são hoje o próprio rio. O projeto não prevê a inundação de Terras Indígenas.As principais mudanças que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) determinou para diminuir os efeitos negativos sobre o meio ambiente e a comunidade foram:Mudança para a cidade de Vitória do Xingu das 2.500 casas para funcionários das obras, que antes seriam feitas próximas ao local da casa de força principal, em uma vila residencial;Construção de 500 casas, também para funcionários das obras, espalhadas pela cidade de Altamira, ao invés de em uma vila fechada;Construção de um canal ao lado da barragem principal para passagem de peixes, ao invés de uma escada de peixes;Construção de um mecanismo próximo à barragem principal para fazer com que os barcos possam passar de um lado para o outro do rio Xingu;Definição de um hidrograma ecológico para o trecho do rio Xingu entre a barragem principal e a casa de força, garantindo a navegação e a sobrevivência de espécies de peixes e plantas.As enchentes naturais do Xingu em Altamira fazem com que 4.700 famílias morem em condiçoes precárias na sua orla e em igarapes. A cota de 97 m que o rio alcança ao natural, com vazão de 19 mil m³/s, será igual a do lago de Belo Monte. Apesar da cota igual a que atinge o rio naturalmente, o planejamento de implantação da usina inclui a requalificação urbana de Altamira e vai beneficiar toda a cidade. As áreas inundadas serão transformadas em parques ecológicos e de preservação ambiental. A cidade ganhará também áreas urbanas de lazer para todos os moradores. Além de Altamira e Vitoria do Xingu, outros municípios da área de influência receberão melhorias, como por exemplo Anapu, Brasil Novo, Uruará, Medicilândia e Pacajás.Principais fatos liga dos à hidrelétrica Belo Monte1975 - Início dos estudos para o aproveitamento hidrelétrico da bacia do rio Xingu.1980 - Conclusão dos Estudos de Inventário e início dos Estudos de Viabilidade da Usina Hidrelétrica Kararaô.1989 - Conclusão dos primeiros Estudos de Viabilidade do AHE Belo Monte.1994 - Revisão dos Estudos de Viabilidade com diminuição da área inundada e não inundação das áreas indígenas.1998 - A Eletrobrás solicitou à Aneel autorização para realizar, em conjunto com a Eletronorte, novos Estudos de Viabilidade do AHE Belo Monte.2002 - Os estudos são apresentados à Aneel, mas o Ministério Público consegue, por meio de ação na justiça, paralisar os trabalhos e o EIA não pode ser concluído.2005 (julho) - O Congresso Nacional autoriza a Eletrobrás a completar os estudos.2005 (agosto) - A Eletrobrás e as construtoras Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Norberto Odebrecht assinam Acordo de Cooperação Técnica para a conclusão dos Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica eSocioambiental do AHE Belo Monte.2006 (janeiro) - A Eletrobrás solicitou ao Ibama a abertura do processo de Licenciamento ambiental prévio. Começa a ser feito o EIA.2006 (março) - O Ibama realizou a primeira vistoria técnica na área do projeto.2007 (agosto) - O Ibama realizou vistoria técnica e reuniões públicas nos municípios de Altamira e Vitória do Xingu para discutir o Termo de Referência (TR) para o EIA.2007 (dezembro) - O Ibama emitiu o Termo de Referênciapara o EIA.2008 (julho) - O Conselho Nacional de Política Energética define que o único potencial hidrelétrico a ser explorado no rio Xingu será o AHE Belo Monte. A Aneel aprovou a atualização do inventário com apenas o AHE Belo Monte na bacia do rio Xingu.2008 (novembro) - O Ibama realizou nova vistoria técnica na área do projeto.2009 (fevereiro) - A Eletrobrás entregou a versão preliminar do EIA e do Rima.2009 (março) - A Eletrobrás solicitou a Licença Prévia.2009 (abril) - O Ibama realizou nova vistoria técnica na área do projeto.2009 (maio) - O EIA e o Rima foram entregues no Ibama.Fonte: EIA Rima do AHE Belo Monte Fonte: Estadão