Há cerca de dois anos, a Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural (Abece) criou um comitê para discutir questões relacionadas à regulamentação do uso de ancoragens químicas no Brasil. Atualmente, o trabalho deste comitê finaliza um texto que traz recomendações para projetos de fixação com chumbadores químicos em concreto.
A revista OE conversou com Tiago Carmona, coordenador do comitê sobre chumbadores químicos na Abece, e Renato Shimokawa, engenheiro de especificação da fischer Brasil, empresa que faz parte desse grupo na entidade, para esclarecer detalhes da criação da recomendação técnica que pode se transformar em norma brasileira.
1 – O que representa a criação de norma nacional para projetos de fixação com chumbadores químicos em concreto?
Tiago Caromona: Representa uma evolução técnica fundamental em processos construtivos que, em alguma de suas etapas, utilizam as fixações. Quando se consolidam premissas técnicas mediante um consenso entre os intervenientes (projetistas, fabricantes e aplicadores) se evitam erros de especificação e execução, por meio da definição de regras claras a serem observadas em cada etapa do processo.
Renato Shimikawa: Normatizar sistemas de ancoragens em concreto é aumentar o nível de exigência no que se diz respeito à qualidade de produtos e da execução. Atualmente, falhas de execução e produtos inferiores representam a maior parcela de motivos de problemas em obra. Com a norma, será possível dimensionar e exigir mais dos fornecedores e instaladores, gerando uma competição mais justa em relação à compra e venda de produtos do ramo de fixações e mantendo um nível mínimo (desde que atendendo à norma) de qualidade de material e informação disponível.
2 – Por favor, comente sobre como anda a tecnologia de chumbadores químicos no Brasil, incluindo potencial e vantagens à construção?
TC: O Brasil vem acompanhando com agilidade a evolução dos sistemas de fixação com chumbadores químicos. Novos materiais e equipamentos são apresentados ao mercado da construção pelos representantes de empresas multinacionais que pautam o desenvolvimento desta tecnologia. As fixações com chumbadores químicos se arraigaram na indústria da construção de forma ampla, de pequenas a grandes obras, em função de sua execução rápida, limpa e racional.
RS: A tecnologia dos chumbadores químicos no Brasil tem avançado muito sob a dependência das inovações técnicas oriundas da Europa. As empresas que apresentam os melhores produtos do ramo estão sempre atentas às exigências do mercado nacional, importando suas soluções mais compatíveis com a realidade brasileira. A tecnologia fornecida pelas multinacionais tem atendido perfeitamente a construção civil e indústria por possuir flexibilidade para inúmeras peculiaridades de execução.
3 – Por que a criação de um comitê específico dentro da Abece para esse assunto?
TC: A entidade de classe formada por profissionais da área de estruturas com forte representação na cadeira construtiva, tem como um de seus objetivos o desenvolvimento e disseminação de tecnologia e boas práticas construtivas no Brasil. A constatação sistemática de erros construtivos, a falta de critérios claros de projeto e até mesmo de acidentes envolvendo este tipo de fixação motivaram a criação do comitê. A intenção do grupo é elaborar, inicialmente, uma recomendação técnica que servirá de texto base para uma futura norma brasileira.
RS: Os sistemas de ancoragem em concreto envolvem análises complexas para seu dimensionamento, pois a maioria das possíveis falhas do sistema envolvem o comportamento do substrato. Para isto, nada melhor do que ter à disposição especialistas nos quesitos projetos e cálculos estruturais, pois a “tropicalização” das normas europeias e americanas dependem de um processo clínico e analítico das normas brasileiras de concreto e aço.
4 – O que esse comitê pode contribuir para o mercado da construção no que refere aos chumbadores químicos?
TC: O comitê contribuirá de forma decisiva na regulamentação da prática, definindo tipologias de materiais, situações recomendáveis de aplicação e rotinas de cálculo/projeto. Processos construtivos com respaldo normativo estabelecem requisitos mínimos de segurança e desempenho em serviço, objetivando a qualidade final da construção e protegendo a sociedade.
RS: Impacta positivamente, tendo em vista que muitos profissionais da construção civil não consideram o assunto importante em uma visão macro da obra. Os chumbadores químicos são indicados para aplicações estruturais, portanto, espera-se que, com a normatização, os responsáveis passem a dar melhor atenção para estas instalações. Consequentemente, o mercado exigirá mais de seus fornecedores, aumentando a qualidade dos produtos, informações, comunicação e divulgação de seus serviços pré, durante e pós-vendas.
5 – Quais são os desafios para que essa tecnologia avance no País?
RS: Um dos obstáculos para um avanço na tecnologia dos chumbadores é a cultura “barateadora” da construção civil brasileira. Em nossa realidade, comparam-se valores e preços de produtos de qualidades distintas. A exigência para compra e utilização destes produtos ainda é baixa e a falta de informação (inclusive nas disciplinas oferecidas nas faculdades de engenharia civil) contribui para um mercado cujos produtos com melhor tecnologia são, por muitas vezes, descartados por conta do alto valor.
Com isto, uma das formas de melhor divulgar a necessidade de estudar e avançar na tecnologia dos chumbadores, independentemente das iniciativas estrangeiras, é abordando o assunto nas faculdades, em palestras e atividades extracurriculares; manter o nível de qualidade dos produtos já existentes; forte apresentação técnica e foco na análise estrutural junto aos executores, contribuindo para reverter esta cultura nacional.