Em 2024, o país viu inaugurar uma importante obra do setor energético nacional: o Gasoduto Rota 3, uma megaestrutura de 355km de extensão, dos quais 307 km estão sob o oceano Atlântico, ligando diretamente os campos do pré-sal ao novo Complexo de Gás Natural de Itaboraí (Gaslub), no Rio de Janeiro. Com investimento superior a R$12 bilhões, o Rota 3 já escoa até 18 milhões de m3 de gás por dia, e promete ser um divisor de águas na logística do gás natural brasileiro, com reflexos diretos na geração de energia elétrica, fertilizantes, indústria petroquímica e até no bolso dos consumidores.
Um importante sinal para o mercado nacional de óleo e gás.
A Petrobras tem o polo pré-sal da Bacia de Santos, com produção de gás natural, e em Itaboraí, o Complexo de Energias Boaventura. Por lá, existe um conjunto de dutos que recentemente foi construído para atender esse polo industrial, como explica Marcello Artimos Neves, engenheiro que foi gerente de construção e montagem da Petrobras do trecho terrestre do gasoduto Rota 3.
“Primeiro a gente tem o gasoduto Rota 3 que tem a finalidade de fazer o escoamento de gás do polo pré-sal da Bacia de Santos até o Complexo Industrial em Itaboraí. Ele é chamado de Rota 3 porque é a terceira rota de escoamento de gás do polo pré-sal da bacia de Santos. Para atender esse Complexo Industrial temos outras duas obras de dutos terrestres que são importantes. O emissário de efluentes do Comperj, na época batizado assim, e o objetivo dele é levar o efluente industrial tratado do Complexo Industrial para dar destinação final. A obra deste duto aconteceu nos municípios de Itaboraí e Maricá, no Rio de Janeiro. Temos um outro conjunto de dutos, chamado de Dutos Norte na Petrobras, que tem essa denominação porque a entrada e saída deles, no Complexo Industrial, é pelo lado norte do Complexo.
Temos ali uma adutora, um duto de GLP e um duto de gás não processado para vir de outro complexo da Petrobras, em Cabiúnas, para se juntar com a corrente de gás que vem do gasoduto Rota 3 e tudo isso poder ser processado na unidade de tratamento de processamento de gás natural, desse Complexo de Energias Boaventura”, explica Artimos.
O projeto do gasoduto Rota 3 contribui em grande escala para o desenvolvimento econômico do país, uma vez que amplia a capacidade de escoamento de gás natural das áreas produtoras do Polo Pré-Sal da Bacia de Santos (PPSBS) em cerca de 17,8 milhões m³/dia, viabilizando uma nova rota de escoamento do gás natural não-processado associado à produção do petróleo do PPSBS, chegando até a Unidade e Processamento de Gás Natural do Polo Gaslub.
“Falando um pouco de diâmetros de cada um desses dutos, o gasoduto Rota 3 tem um trecho em mar com mais de 300km de extensão, já na transição mar-terra o trecho é de mais de 1 km executado com perfuração direcional e depois disso temos um outro terrestre com 48km de extensão. Esse duto tem trechos de 24 e 22 polegadas, falando do mar e terra, e uma espessura muito grande, na ordem de uma polegada de espessura de parede do duto, porque a pressão do gás interna pode chegar a 250 kgf/cm².
Temos também a obra do emissário de efluentes que até compartilha alguns trechos [da faixa de dutos], o encaminhamento dele tem alguma similaridade com o do gasoduto Rota 3, com uma extensão parecida de 45km e leva o efluente industrial tratado do polo industrial até a praia de Maricá. Além disso, ele tem 32 polegadas de diâmetros. Temos uma adutora de 26 polegadas, 50 km, um duto de GLP, 10 polegadas, de aproximadamente 50km e outro duto de gás, um pouco menor, de 11 km, de 16 polegadas de diâmetro. Essas são as obras principais mais recentes e todas elas para atender o Complexo em Itaboraí”, conta o engenheiro.
Parte do sucesso desse projeto só foi possível graças a um método inovador que cada vez mais é aplicado na instalação, reparação e reforma de tubos, dutos e cabos subterrâneos, utilizando técnicas que minimizem o impacto dessas obras no meio ambiente. Conhecido por HDD (Horizontal Direct Drilling), o método não destrutivo direcionado, para instalação de infraestrutura subterrânea em um furo na trajetória projetada aproximadamente em forma de arco, a partir de uma máquina perfuratriz na superfície que realiza o furo-piloto, alargamentos e puxamento da infraestrutura, a grande estrela é a perfuração horizontal direcional, que, pelos recursos e facilidades, atende a uma grande gama de aplicações na instalação de redes de água, esgoto, gás, comunicações e dados e energia, seja cruzando essas redes por baixo de rodovias, ferrovias e rios ou em instalações de anéis desses serviços, como explica o engenheiro Sérgio Augusto Palazzo, idealizador do projeto.
“O processo, além de permitir a “navegação” por entre as interferências existentes, mesmo em subsolos densamente povoados, é ideal para utilização em cidades de grande porte, onde o sistema viário já não suporte mais qualquer estreitamento do leito carroçável e pode ser considerado o mais limpo, se comparado ao de escavação de valas a céu aberto. Dele se poderia, ainda, falar da economicidade, pela rapidez na execução das travessias, da redução do risco de acidentes e das perspectivas abertas, à engenharia de projetos, para a descoberta de soluções técnicas antes inviáveis”, explica Palazzo.
Em obras tradicionais, o método convencional de instalação de dutos sempre requer uma intervenção na superfície, um método mais prático, principalmente para essas obras de grande porte, grande diâmetro, em que se busca desviar das grandes manchas urbanas. O método mais aplicado é da vala a céu aberto, conforme conta Melina Almeida Rabelo, engenheira do Projeto Básico de Dutos Terrestres da Petrobras.
“Nas obras onde abrimos uma vala na superfície, se lança o duto montado dentro dela e depois há uma cobertura [da vala]. Mas em diversos pontos dessa rota que o duto atravessa, vamos nos deparar com impedimentos a essa escavação. No caso do Rota 3 nos deparamos com rodovias em que o tráfego não poderia ser interrompido para executar a escavação, poderia ser ferrovias, travessias em que a escavação dentro de um corpo hídrico fosse muito complicada, como é o caso da HDD do rio Caceribu, as chegadas de praia, que são a transição entre o duto submarino que está vindo do mar até chegar na praia, no trecho terrestre. Esse trecho de praia é muito comum apresentar grandes restrições à escavação, primeiro pela questão social, turística, se for uma praia bem habitada, grandes restrições ambientais por causa da restinga que tem nessas regiões, temos a nossa costa brasileira que tem muito defeso e as desovas de tartarugas que devem ser protegidas. Com isso as escavações interferem diretamente nas atividades.
Mas no caso da praia de Jaconé, onde chega o Rota 3, nessa transição do submarino para o terrestre, temos uma situação peculiar, que é a presença de beachrocks, uma curiosidade muito interessante, porque elas foram usadas por Charles Darwin para composição da teoria da evolução. É um patrimônio histórico brasileiro e qualquer escavação ali poderia causar um dano muito importante para a nossa história. Ali, inclusive, é um parque chamado Caminhos de Darwin, em que todas essas rochas são muito protegidas. É mais um ponto em que as técnicas não destrutivas são necessárias para minimizar o impacto na superfície”.
No caso da Serra do Revissemar, foi feito todo um estudo com sondagens geotécnicas diretas, combinadas com estudos geofísicos de eletrorresistividade e sísmica, junto com ensaios de laboratórios nos testemunhos coletados para ser caracterizado muito bem e ser formado um modelo geológico e geotécnico da serra e o do material de subsolo a ser perfurado.
“Conseguimos identificar que majoritariamente seriam perfurados uma rocha gnáissica e granítica na maior parte do tempo, só que com alguns trechos pontuais com alto grau de fraturamento, que pode causar diversos problemas [para um HDD] como desvios na navegação, perdas de fluidos de perfuração usado durante a atividade, colapso e instabilidade do próprio furo, podendo gerar travamento e quebras de ferramentas dentro do furo, podendo até inviabilizar essa obra. Conhecendo esse desafio o projeto tinha que prever uma medida mitigadora para transpor essas camadas que trariam grandes dificuldades para perfuração direcional. A solução adotada pelo projeto foi a consolidação da rocha de forma que ela se comportasse como um corpo sólido, em que essas fraturas não fossem mais um problema durante a perfuração”, conta a engenheira. Neste caso, foi adotada uma solução de consolidação com cimentação, do tipo squeeze, semelhante à utilizada em poços de petróleo, com os mesmos recursos.
“A Petrobras fornece para gente esses estudos geotécnicos e geofísicos que compõem todo estudo geológico para a gente poder determinar qual equipamento e plano de fluidos que serão utilizados e quais ferramentas serão aplicadas na obra. Isso é tão importante porque quando começamos a obra temos uma análise de consistência para verificar se necessitamos que as informações sejam mais detalhadas ou não. Neste caso fizemos mais alguns furos de sondagens, poucos apenas para ter certezas pontuais localizadas e o resultado disso é muito interessante. Essa foi uma obra feita com uma rocha de 105 MPA altamente abrasiva, e isso demandou uma quantidade de ferramentas, os tempos de perfuração, detalhamento disso, planejamento feito do qual a obra foi executada no cronograma. Temos uma taxa de penetração que se chama ROP, que é o quanto define qual avanço que a gente vai ter, de quanto em quanto tempo teremos que trocar uma ferramenta. Planejamos essa obra com ROP de 6 metros por hora e nós tivemos na execução um ROP de 6.9 metros por hora, ou seja, muito em cima, uma informação que afere bastante a qualidade do estudo que foi feito e a interpretação e aplicação desse estudo no planejamento da obra. Foi uma obra de sucesso do início ao fim, com grau de dificuldade alto e também a dificuldade de logística. Foram cerca de 4 meses de um trabalho bem sucedido, conta Alexandre Morgado, diretor da Drilltec/Drillcon.
A unidade de processamento de gás do Comperj é a maior do país, com capacidade de processamento de até 21 milhões de m³ por dia. O empreendimento deu um salto considerável na capacidade de escoamento e processamento de gás do pré-sal da Petrobras, que passou de 23 milhões de m³ para 44 milhões de m³ por dia.
ONDE COMEÇA E ONDE TERMINA GASODUTO ROTA 3
Origem: campos do pré-sal na Bacia de Santos, especialmente Mero, Búzios e Tupi.
Destino: UPGN (Unidade de Processamento de Gás Natural) do Complexo de Itaboraí, na região metropolitana do Rio.
A estrutura é composta por:
307 km de duto submarino;
48 km de duto terrestre;
Estações de compressão, controle, processamento e distribuição no Gaslub;
Capacidade de integração com gasodutos e consumidores do Sudeste.
POR QUE ELE MUDA O FUTURO ENERGÉTICO DO BRASIL?
O Brasil tem uma das maiores reservas de gás natural do mundo — mas historicamente deixou de aproveitá-las de forma estratégica.
Por falta de dutos e infraestrutura, boa parte do gás associado à produção de petróleo era simplesmente queimada ou reinjetada.
Com o Rota 3, essa equação muda.
A nova estrutura trouxe as seguintes mudanças:
Evita o desperdício de gás no pré-sal;
Injeta mais gás na matriz elétrica, diminuindo o custo da energia;
Reduz a dependência de GNL importado, que encarece os preços no mercado;
Estabiliza o fornecimento para termelétricas, promovendo segurança energética;
O QUE VEM DEPOIS?
O sucesso do Rota 3 abre espaço para novas rotas de escoamento no pré-sal.
Já existem estudos para um Rota 4, que incluiria novos campos ainda mais ao sul da Bacia de Santos e conexão com plantas de fertilizantes no Paraná e São Paulo.
Paralelamente, o gás natural do Rota 3 também pode ser aproveitado para projetos de hidrogênio de baixo carbono, inserindo o Brasil no mapa global da transição energética.
O Gasoduto Rota 3 é um marco técnico, econômico e ambiental.
Representa a vitória da persistência sobre indecisão, da engenharia sobre a burocracia, e da visão de longo prazo sobre o imediatismo político.
Com ele, o Brasil finalmente começa a aproveitar todo o potencial do gás do pré-sal — não apenas como um subproduto do petróleo, mas como um vetor central para a segurança energética, industrialização e transição ecológica do país.
FUNCIONAMENTO DOS DUTOS
Dutos na ala sul do Complexo de Energias Boaventura (CEB), anteriormente denominado Polo GASLUB.
Gasoduto Rota 3:
É a terceira rota de escoamento de gás do Polo Pré Sal da Bacia de Santos (PPSBS).
Tem mais de 300 km em mar e 48 km em terra.
Diâmetros de 24” e 22”
O trecho terrestre inicia em Jaconé-Maricá-RJ e termina no CEB.
Objetivo escoar gás da Bacia de Santos até a Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN), no CEB.
EMISSÁRIO DE EFLUENTES:
Duto terrestre de 32”, que leva efluentes industriais tratados do CEB até Itaipuaçu-Maricá.
DUTOS NA ALA NORTE DO CEB
Atualmente estão operando quatro dutos na faixa CEB(*)-REDUC, são eles:
ADERJ 26” – Adutora de 26” que liga a REDUC ao CEB – faz parte do escopo do contrato “Dutos Norte”;
Este duto será convertido em oleoduto (denominação OCERJ 26”), o qual irá levar gasóleo para ser processado no CEB.
Além dos dutos acima, da Petrobras, há o GASIG (propriedade da NTS) – Gasoduto de 24” que liga o CEB ao PE de Guapimirim;
GASERJ 16” – Gasoduto de 16” que liga o CEB ao Ponto de Entrega (PE) de Guapimirim;
OCERJ 10” – Oleoduto de 10”, transporta GLP do CEB para o Terminal de Campos Elíseos (TECAM).
EXECUTANTES DAS OBRAS:
Gasoduto Rota 3 (trecho terrestre): Consórcio GTR-3, formado pelas empresas Encalso e Concremat
Emissário de Efluentes: OAS (1ª fase) e GE Manutenções e Serviços (2ª fase)
Dutos Norte: Construcap
Fornecedores dos dutos:
Tenaris Confab
Tata Steel
TSA
PRÓXIMAS ETAPAS E INVESTIMENTOS PREVISTOS:
Além dos quatros dutos da ala norte citados acima, em operação, a Faixa de Dutos CEB-REDUC possui o seguinte duto parcialmente construído A descontinuação da construção se deu, à época, por mudanças na rota de investimentos da Petrobras.
OCERJ 20” – Iniciada a Construção e Montagem em 2013 e descontinuada em 2016; duto originalmente concebido para o transporte de Claros.
Possui aproximadamente 32 km construídos e 17 km faltantes.
As próximas etapas são a conclusão do OCERJ 20” e a conversão do OCERJ 26”.
O início está previsto para o final de 2025, com prazo de cerca de 2 anos de obra.







2 thoughts on “O gasoduto de 355 km pode redefinir o futuro energético do Brasil”
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