Em entrevista exclusiva a Nildo Carlos Oliveira, da Revista O Empreiteiro, José Antônio Muniz, presidente da Eletrobrás, fixa um perfil da empresa, mostra por que ela está se internacionalizando, fala da retomada de Angra 3 e da identificação da primeira planta nuclear do Nordeste.
Como a empresa se posiciona no mercado brasileiro de energia elétrica?
"A Eletrobrás é a maior holding do setor elétrico da América Latina. Temos seis empresas de geração e transmissão, seis distribuidoras, 50% da usina Itaipu Binacional e o Cepel, maior centro de pesquisa de energia elétrica do hemisfério sul. Somos responsáveis por cerca de 40% da capacidade instalada para geração de energia no País, com 30 usinas hidrelétricas, 15 termelétricas e duas usinas termonucleares, além de aproximadamente 60% das linhas de transmissão que atravessam o Brasil.
Mas entendemos que, em um mercado competitivo como o atual, não podemos ficar parados, sob o risco de perdermos essa posição de liderança no setor. Por isso, estamos em pleno processo de transformação, cujos resultados já começam a aparecer. E estamos focando mais no nosso lado S.A., melhorando a governança corporativa das empresas do Sistema Eletrobrás, e buscando cada vez mais a eficiência, a sustentabilidade e a rentabilidade.
Além disso, nós também estamos investindo em negócios no exterior. Nosso foco principal, nesse momento, é a América Latina, mas também estamos recebendo propostas de vários países. Nosso objetivo maior é tornar a Eletrobrás uma megaempresa brasileira, atuando no Brasil e no exterior. Hoje somos a 10ª empresa de energia elétrica do mundo, em patrimônio."
Que balanço a empresa faz, hoje, do Plano de Ações Estratégicas concebido para o período 2009-2012, uma vez que ela previa, para até o final deste ano (2009), fazer investimentos de R$ 7,2 bilhões – R$ 3,6 bilhões dos quais somente em geração?
"Em um momento em que ainda estávamos trabalhando em um Planejamento Estratégico integrado para o Sistema Eletrobrás, o primeiro de sua história, nós precisávamos de uma diretriz, de uma primeira orientação estratégica corporativa. E foi isso que o Programa de Ações Estratégicas nos deu. Temos um conjunto de ações críticas para desenvolver de forma alinhada e só o esforço conjunto das empresas do Sistema possibilitará o seu cumprimento. Temos um grande indutor dessas realizações, que é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e, neste ano, nós já temos vitórias a comemorar, como o início da construção das usinas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, e a retomada das obras de Angra 3. E isso só na geração. No campo da transmissão, linhas importantes para a integração de regiões mais distantes do País ao Sistema Interligado Nacional (SIN), como a Jaurú (MT)-Vilhena (RO), que colocaram Rondônia e Acre no SIN e melhoraram o abastecimento e a segurança energética desses estados, também entraram em operação. Isso sem contar com a construção da linha Tucuruí-Macapá-Manaus, que vai diminuir ainda mais a área que está isolada, em termos de energia, do resto do Brasil."
Qual a estratégia que a Eletrobrás vem adotando para conciliar a retomada de atividades de origem, com o seu processo de internacionalização?
"Acredito que um Sistema Eletrobrás integrado, competitivo e rentável poderá contribuir muito mais para o desenvolvimento do país, podendo oferecer a energia necessária ao crescimento com sustentabilidade. Portanto, com todo esse processo de transformação que estamos vivendo, agora estamos mais fortes para atuar no Brasil e no exterior. Quanto à internacionalização, entendemos que a integração energética na América Latina precisa existir, principalmente quando os regimes hidrológicos são complementares. Se a América Latina fosse um único país, nós já teríamos a Venezuela interligada com o Brasil, já teríamos o Peru interligado com o Brasil, e já teríamos uma maior integração entre a Argentina e o Brasil.
Por isso, nós estamos estudando empreendimentos em oito países, envolvendo cerca de 16 mil megawatts de geração hidrelétrica e cerca de 10 mil quilômetros em linhas de transmissão. Os mais adiantados são os das usinas de Inambari, de 2000 megawatts, no Peru, e de Tumarín, de 220 megawatts, na Nicarágua. Já na transmissão, os estudos que devem ser concluídos primeiro são os das linhas que ligam o Brasil ao Uruguai, com cerca de 400 km de extensão.
E estamos chegando para ficar, tanto que estamos abrindo escritórios em Lima, no Peru, e em Montevidéu, no Uruguai para prospecção de novos negócios. Além disso, também recebemos propostas de negócios em vários países do mundo, como os Estados Unidos e alguns países da África."
O que a holding vem realizando a fim de ampliar a capacidade do sistema Eletrobrás, que é de 39.413 MW, índice que correspondia, até começo deste ano, a 39% do total nacional?
"Posso dizer à Revista O Empreiteiro que estamos vivendo um momento emblemático não só na Eletrobrás, mas no setor elétrico brasileiro. As hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia, já em construção, e Belo Monte, no Pará, são fundamentais para a expansão da infraestrutura brasileira.
Hoje, nós estamos em pleno processo de desenvolvimento da geração, estamos fazendo obras que vão garantir que não falte energia nos próximos anos. Essas usinas novas vão fortalecer o sistema e a segurança energética do Brasil.
Só neste ano, vamos investir cerca de R$ 5 bilhões, sendo que pelo menos metade disso já foi realizado, tanto na geração quanto na transmissão de energia. Para a geração, serão R$ 3 bilhões em usinas como Baguari, Batalha, Mauá, Candiota, além das do rio Madeira. E para a construção, ampliação e melhoria dos sistemas de transmissão do País, disoponibilizamos mais R$ 1,5 bilhão.
E não é só na energia hidrelétrica que investimos. O Brasil precisará de uma expansão constante de sua capacidade de geração elétrica nas próximas décadas, se quiser realmente dar um salto rumo ao desenvolvimento. Assim, as usinas nucleares serão essenciais para aumentar a confiabilidade de um sistema que terá que responder a desafios gigantescos. Por isso, tambémapostamos em Angra 3, cujas obras começam para
valer agora em dezembro.
Além de Angra 3, nós já estamos trabalhando na identificação do local da primeira planta nuclear do Nordeste. Essa planta deve abranger uma ou duas usinas de 1000 MW e depois vamos pensar em mais duas para o Sudeste.
Quais são hoje as obras novas, aqui e no exterior, das quais a Eletrobrás participa como investidora?
De uma maneira geral, os investimentos nos quais pretendemos investir neste período até 2012 estão previstos no Programa de Ações Estratégicas (PAE) do Sistema Eletrobrás, que foi o primeiro plano estratégico integrado para o nosso conjunto de empresas. Lá estão previstos R$ 30 bilhões em investimentos em geração, transmissão e distribuição, parte deles em parceria com a iniciativa privada.
Tenho a dizer também que agora, com a aproximação do leilão de Belo Monte, nossos estudos estão mais focados no Complexo Tapajós, que terá cinco usinas no Pará, com um conceito inédito para geração elétrica, que é o das usinas-plataforma."
Nesse caso, o Complexo Tapajós continua como a prioridade da holding?
"Vamos dizer que é um projeto muito importante, porque inaugura uma nova era na construção de hidrelétricas: a era da sustentabilidade. As usinas-plataforma utilizam a tecnologia que nós nos acostumamos a ver nas plataformas para extração de petróleo, mas que ainda não havia sido pensada para hidrelétricas. É uma revolução, já que, apesar de trabalharmos na selva, haverá o mínimo de intervenção possível.
Durante a obra, os trabalhadores ficarão em cidades próximas, sendo deslocados, em sistema de turnos, para os canteiros, como acontece hoje nas plataformas de petróleo. Quando já estiver em operação, os profissionais encarregados das hidrelétricas trabalharão da mesma forma.
Quanto a Belo Monte, estamos preparados para participar do leilão, que está marcado para dezembro. É um projeto particularmente importante para mim, que o acompanho há mais de 20 anos, e que finalmente vai sair do papel. Como nas licitações de Santo Antonio a Jirau, nossas empresas participarão por meio de consórcios, sempre como minoritárias. Assim, de um jeito ou de outro, estaremos prontos para participar da construção desse empreendimento que é tão importante para o desenvolvimento do País."
O que o Sistema Eletrobrás vem fazendo a fim de conquistara certificação na Lei Sarbannes-Oxley?
"Todas as diretrizes e ações do Plano de Transformação – cujo foco está no tripé rentabilidade, competitividade e integração – visam reduzir as despesas operacionais e aumentar a receita, para, no final, melhorarmos o resultado de nossas empresas. E isto está descrito de várias formas no Plano, em todas as frentes de negócio do Sistema, na flexibilização dos nossos processos de compras, na centralização da administração das empresas distribuidoras, e também na adoção das melhores práticas de governança corporativa. Temos um projeto especificamente para a implementação dos controles internos exigidos pela SOX. Até o final deste ano, o objetivo é fazer com que todas as empresas do Sistema Eletrobrás adotem uma estrutura de gestão de riscos e controles internos.Acredito que, com essas respostas, haja atendido às expectativas da Revista O Empreiteiro.
Fonte: Estadão