O movimento do Porto de Santos tem previsão de ser triplicado nos próximos 13 anos, segundo dados da Codesp. Se, hoje, a situação já é extremamente crítica, como será então num futuro tão imediato como esse, se nada for feito para enfrentar as demandas advindas do crescimento?
Oquestionamento é de Martin Aron, presidente da Associação Brasileira dos Terminais Retroportuários e das Transportadoras de Contêineres (ABTTC) e diretor de Assuntos Institucionais do Grupo Libra, ao fazer uma projeção de como serão os portos nos próximos 50 anos. "A rigor, na infraestrutura portuária no Brasil e, principalmente, em Santos, que é o porto mais importante do País, é possível perceber que, na verdade, as décadas constituem a verdadeira unidade de medida de tempo e que meio século à frente, não é tanto tempo assim", analisa.
Um exemplo disso, segundo ele, é que já têm quase 100 anos as primeiras reclamações, de que se tem notícia, sobre falta de calado e profundidade suficiente para a operação de grandes navios em Santos e sobre os congestionamentos no acesso ao porto. O que mudou, ao longo do tempo, diz ele, "foi a dimensão das coisas, antes, se reivindicava um calado de 10 m, hoje, pede-se que seja de 15 m".
Infelizmente, para Aron, "a nossa cultura é a de sempre andar atrasado com o atendimento das necessidades e nunca buscar prevê-las, antecipando medidas e soluções. E, mesmo quando são previstas, nem sempre são executadas no tempo certo e adequado".
O presidente da ABTTC acredita que se não forem feitas previsões para daqui a 50 anos, certamente nos próximos 10 ou 15 anos o setor portuário já estará muito mais defasado ainda. "Precisamos ter plena consciência disso, em especial, na atual fase em que nos encontramos carentes de investimentos em infraestrutura, notadamente com vistas a alguns eventos importantes programados para o Brasil, como a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016", alerta.
Em 13 anos, Santos será
três vezes maior
O plano de expansão para o Porto de Santos, apresentado pela da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) e pela Secretaria de Portos, prevê que, em 2024, o movimento do porto deverá ser quase três vezes maior do que é hoje, quando responde por cerca de 100 milhões de t/ano (nos últimos 12 meses, até março de 2011, a movimentação de carga, em Santos, atingiu o recorde de 97 milhões t/ano). Quase 30% do comércio exterior brasileiro (cerca de US$ 25 bilhões) passam pelo Porto de Santos, o que dá uma ideia da sua importância, dentro do contexto nacional. A vocação atual do porto é para atender aos produtos industriais, mas as commodities ainda têm um grande peso dentro desse contexto.
Diante desse panorama, é preciso que efetivamente sejam resolvidos, a curtíssimo prazo, os problemas de acessibilidade ao porto, seja por rodovia ou por ferrovia. Os associados da ABTTC, segundo o presidente da entidade, têm graves limitações para exercer suas atividades, justamente porque elas se localizam na região de entrada do porto (chamada de retroárea ou retroporto), que receberam muito poucos investimentos, se comparado com o que foi investido nas áreas primárias.
Em relação à acessibilidade, no que diz respeito ao governo do Estado de São Paulo, lembra Aron, "está sendo feito o Rodoanel, muitíssimo importante para o Porto de Santos e para toda a cadeia logística de exportação. Mas, essa providência está sendo tomada com, pelo menos, 40 anos de atraso. Além do Rodoanel, é muito importante também que se construa efetivamente o Ferroanel. O governo deve definir, com urgência, todas as alternativas de planos para solucionar o problema de acessibilidade ao Porto de Santos, sob pena de continuar décadas atrasado nesse quesito fundamental para a economia do estado e do País".
Há muitos anos, destaca o entrevistado, o único acesso que as transportadoras têm para o porto é a Via Anchieta, que já tem 60 anos. "Ela tem um traçado muito sinuoso e não permite agilidade no tráfego de cargas. Velocidade com segurança é o mínimo que o setor pede e precisa". Some-se a isso o que Aron chama de "absurdo": a pista descendente da Rodovia dos Imigrantes não foi feita para o transporte de cargas, ela é exclusiva para veículos de passeio. Nesse sentido, uma terceira pista já seria mais do que necessária, só que essa nova rodovia deveria contemplar a possibilidade de tráfego de caminhões e de cargas.
Paralelamente, lembra Martin Aron, há projetos de melhoria do sistema de ferrovias que dão acesso ao Porto de Santos. Mas, segundo ele, os próprios ferroviários reclamam que a passagem pela Região Metropolitana de São Paulo é muito complicada e morosa, pois, o trânsito de trens é prioritariamente reservado para o transporte de passageiros, sobrando horários muito reduzidos para os trens de cargas.
Longo prazo
O modelo de arrendamento de áreas portuárias, em Santos e no Brasil, como um todo, prevê períodos de até 50 anos (25 anos prorrogáveis por mais 25 anos). Por isso, Aron acredita que qualquer projeto nesse segmento tem de ser pensado em longo prazo. É preciso, entretanto, que se corrijam erros de planejamento cometidos no passado, que integram o Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto de Santos (PDZ), da Codesp. Na década de 1960, gestões passadas do órgão colocaram os terminais de soja bem na ponta da praia, que fica na região do final do porto, para quem vem pela rodovia. Os trens graneleiros, que vêm do Planalto Paulista, são obrigados a cruzar toda a cidade e o Porto de Santos para descarregar sua carga. É por isso que só de 5% a 10% de todas as cargas (grãos, principalmente) chegam por transporte ferroviário. O transporte de contêineres é praticado, quase que exclusivamente, por rodovia. Essa é uma herança que a Codesp quer corrigir, mas tem de resolver a questão dos contratos que ainda estão vigentes e que devem perdurar por mais 15 ou 20 anos.
Todos esses assuntos têm sido discutidos no Conselho da Autoridade Portuária (CAP), que reúne representantes do poder público, dos operadores, dos trabalhadores e dos usuários dos serviços portuários. A ABTTC integra esse conselho, representando principalmente os Redex, que são recintos especiais para despacho aduaneiro de exportação, as transportadoras de contêineres e os terminais de contêineres vazios ou Depots. A entidade congrega cerca de 50 associados, número que representa a maior parte dos Redex de Santos, que movimentam 60% da carga de exportação do porto.
Faltam benefícios fiscais e investimentos
Empresas que atuam na área do retroporto – de Redex, de transporte e de terminais de contêineres vazios (Depots) – são, frequentemente, responsabilizadas pelos constantes congestionamentos e pela renitente falta de eficiência da região portuária. De acordo co
m Martin Aron, da ABTTC, essa não é uma situação que reflete exatamente a realidade dos fatos.
Segundo ele, o regime especial representado pelo reporto privilegiou, basicamente, a zona portuária primária e também os portos secos, que ficam localizados a 200 km ou 300 km de Santos, considerando-os "portos" e garantindo-lhes a suspensão de impostos para aquisição de equipamentos, por exemplo. As grandes empresas de Santos que utilizaram o sistema de reporto tiveram uma economia superior a 40% sobre o custo de equipamentos importados, como portêineres, shiploders, etc. Só que, "por uma injustiça", na opinião de Aron, "as retoráreas ficaram alijadas desse benefício, o que vem impedindo que façam os investimentos necessários para ter a mesma competitividade dos outros setores que já são beneficiados".
Em consequência disso, o presidente da ABTTC explica: "Quando provocamos algum congestionamento na região portuária somos acusados de não investir e de sermos ineficientes, quando, na verdade, isso é apenas o reflexo da não extensão do regime especial do reporto para os terminais portuários". No aspecto tributário e de regime fiscal, essa é uma das grandes reivindicações do setor, tanto no curto como em longo prazo.
Fonte: Estadão