Há anos, tive a oportunidade de participar como ouvinte de uma palestra proferida por dois pilotos de caça da Força Aérea Americana, um coronel aviador, e um tenente coronel aviador, ambos com várias incursões em guerras recentes das bem conhecidas de todos nós. Esses "heróis" acordam cedo e já se entregam a estressante responsabilidade de tarefas difíceis com fins imprevisíveis muitas vezes, e com a esperança de um retorno tranquilo (nem sempre) ao fim da missão. Nesses anos de observação de centenas de obras, tenho visto outros "heróis" passando pelo mesmo estresse, em funções diferentes, mas com os mesmos ingredientes: "Uma responsabilidade estressante, tarefas difíceis, ocorrências imprevisíveis, acordando muito cedo, retornando muito tarde, nem sempre com a missão cumprida, mas comprida". São os nossos engenheiros de obras, do setor de produção, mas com vários agravantes, que explicarei adiante.
Os militares que ouvi, narram uma insistente e repetitiva organização. O início matutino, chamado de "briefing" é feito sob o comando de um líder, que com seus comandados irá ao campo de batalha. Nesse encontro, todas as tarefas são minuciosamente explicadas, todas as possíveis falhas são mitigadas, a meta, cumpri-las com sucesso. Ao fim da missão, há o "debriefing", onde trancados na mesma sala, agora sem líder e sem patentes, todos igualados, narram detalhadamente as falhas cometidas na missão. A minha falha, salvará sua vida na missão de amanhã.
Nas nossas obras, a despeito de todas as ferramentas disponíveis, dessa "sopa" de letras e títulos (geralmente em língua inglesa), focamos o que é bonito, o que parece poder executar obras, ou controlá-las, mas é na simplicidade de um "briefing e debriefing" diários que está o segredo da área de construção de obras de infraestruturas. Na reunião com seus engenheiros, encarregados, e operários pela manhã, discutindo todas as tarefas, aplicando os 6Ms (mencionados na matéria anterior) é que encontraremos o ritmo de nossas obras. Com um planejamento que dista deste dia de hoje não mais de 3 a 4 semanas, mas que hoje, aqui e agora, é o momento de nos organizarmos para a "missão do dia". No fim desse dia, outra reunião, o contracheque de tudo que nos prometemos fazer, comparado, falhas mitigadas para nos salvar no dia seguinte de repetidos erros.
Dentre os programas mais simplistas de controle o "LAST PLANNER" (tradução ainda em estudo para nosso setor), do Hermann Glenn Ballard, é um dos mais eficazes, requer é bom que se diga, a adaptação à simplicidade, a quebra de paradigma, a disposição de sentar-se diariamente, duas vezes, com todos os componentes de suas equipes, e por 30 minutos, não mais, rever a "missão". Não são quadros fixados nas paredes com gráficos de GANTT, ou Planilhas do MS Project, ou Primavera, ou outras tantas, que vão mitigar as falhas consumidoras de tempo e de recursos, retardadoras da execução das tarefas.
São "atitudes" como as mais simples aqui descritas, que nos permitirão enfrentar a falta de projeto (executivo?), e um sem número de problemas do dia a dia das obras (que o digam os que tocaram o RodoAnel e as Marginais de São Paulo). Na Folha de São Paulo, do dia 19 de Dezembro pp, na matéria de Cátia Seabra, ela informa que a Linha Ouro do Metrô de São Paulo, ligando o Aeroporto de Congonhas ao Morumbi, o processo está suspenso pela justiça (durma-se com um barulho desses) por falta de projeto básico, ou seja ainda que fosse o projeto executivo, o empreiteiro vai para a construção como? Como orçou? Deu descontos para conquistar a obra? Em cima do quê?
É uma pena ter que declinar, mas soube de um caso onde a empreiteira já terminou a obra, mas não desmobiliza o canteiro e seu pessoal, pois ainda não recebeu os projetos.
Diante de todos esses descalabros, diante da imobilidade do setor de profissionais de projetos e consultoria, diante da insanidade dos que contratam obras nessas condições, não há porque utilizar "pérolas" da tecnologia mais moderna da informação, há sim, que ter ferramentas para planejar tarefas e mitigar falhas, é essa a experiência que tem trazido algum lucro a obras que aparentemente, e só aparentemente dão lucro, mas que deixam para trás um rastro de engenheiros estressados, famílias destruídas, sub-empreiteiros falidos, um montanha de ferros-velhos (máquinas e veículos) sub ou mal utilizados, uma qualidade cuja inferioridade comparada aos padrões mundiais mais simples, salta aos olhos.
No nosso seminário em 2011 estaremos discutindo (veja bem discutindo mesmo) todos esses pontos, formando uma verdadeira cruzada pelo re-estabelecimento dos padrões de contratação, e execução de obras públicas com um mínimo padrão de planejamento e gestão da produção, que supere todas as dificuldades criadas, principalmente pela falta de um projeto executivo na fase licitatória.
Fonte: Estadão