Parque Olimpico do Rio somente terá obras em Julho

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Serão R$ 7,6 bilhões aplicados em 5 milhões de m² na zona portuária. No traçado há construção de túneis, um deles com função estrutural, a demolição da Perimetral e intervenção para preservar o Palacete D. João VI, de 1912, sede, a partir de março, do Museu de Arte do Rio (MAR)

Nildo Carlos Oliveira – Rio de Janeiro (RJ)

As intervenções ocorrem em área situada nos limites das quatro mais importantes avenidas centrais – Francisco Bicalho, Rodrigues Alves, Rio Branco e Presidente Vargas – que se interconectam com a avenida Brasil, a Linha Vermelha e a Ponte Rio-Niterói, além de situar-se perto do Aeroporto Internacional Tom Jobim, de dois terminais rodoviários e de estações de trem e metrô.

Há décadas degradada e abandonada pelo poder público, a zona portuária tem sua visão, a partir do mar, obliterada por um desses monstrengos de concreto e aço que constituíram, para alguns, no começo dos anos 1970, solução viária eficiente: o Elevado da Perimetral, que liga o bairro do Caju à Praça XV.

Com a demolição parcial da Perimetral (da Rodoviária Novo Rio ao Mosteiro de São Bento) poderá haver, segundo o projeto do Porto Maravilha, um reencontro da cidade – naquela região – com uma nova estética urbana. Antigos prédios históricos, como o palacete referido, avultarão no cenário. E, com eles, ganhará visibilidade o perfil de edificações modernas, uma delas já em fase de construção, o Museu do Amanhã, projetado pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava.

E outras mudanças ocorrerão naquela área: empreendimentos imobiliários de porte, residenciais e corporativos irão se encaixando na nova paisagem, a exemplo de dois edifícios de alto padrão, que somam 222.472 m² de área construída. Anunciados pela Tishman Speyer, o primeiro deles é o Port Corporate Tower, em construção nas proximidades do prédio do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia. O segundo, projetado pelo escritório do inglês Norman Foster, será construído na avenida Rodrigues Alves.

As obras em andamento na zona portuária resultam de uma das maiores parcerias público-privadas (PPP) já assinadas no País. O contrato foi firmado entre a Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (Cdurp) e a concessionária vencedora de licitação pública Porto Novo S.A., formada pela Construtora Norberto Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia. Elas constituíram o consórcio construtor Porto Rio. Pelo contrato, as intervenções deverão estar concluídas até 2016, ano da Olimpíada. Mas a concessionária continuará a prestar serviços de manutenção e conservação de vias públicas pelos próximos 15 anos.

Atualmente, além de procurar colocar em prática novos padrões urbanísticos na região do porto, a concessionária vem eliminando a fiação aérea e instalando uma rede subterrânea; implementando ainda, no subsolo, 122 km de redes de água potável; executando 36,5 km de redes de drenagem e 11 km de galerias; construindo 84 km de redes de esgotos e 26 km de redes de gás e instalando os dutos para cabeamento da rede de fibra óptica.

Nesse conjunto de obras, em que a cidade redescobre as suas origens, sobressaem aquelas, estruturantes, que vão compor um novo sistema viário para resolver o tráfego congestionado que passa ou tangencia a zona portuária. E é por ali que a engenharia é solicitada a empregar técnicas capazes de preservar o passado, na construção de caminhos novos.

O poço, o túnel e os prédios antigos

O engenheiro Ricardo Bueno, da Odebrecht Infraestrutura, diretor de contrato do Porto Rio, diz que faz parte do programa de obras o novo sistema viário que será constituído pela Via Binário do Porto e pela Via Expressa; a requalificação geral da zona portuária e a demolição de trecho da Perimetral.

Ricardo Bueno, diretor de contrato

“As obras que não fazem parte de nosso escopo, mas que são significativas para a região e para a cidade como um todo, são as do VLT (Veículo Leve sobre Trilho). Esse sistema de transporte, associado aos demais disponíveis – trem, metrô e ônibus – facilitará a circulação dos moradores e trabalhadores, o que inibirá, naturalmente, o uso do veículo particular”, afirma o engenheiro.

Na Via Binário está sendo construído o túnel da Saúde, que atravessa 70 m do morro da Saúde, e o túnel do Binário, que terá 1.100 m de extensão. Ele começa na rua 1º de Março, passa por baixo do morro de São Bento e emerge nas proximidades da avenida Barão de Tefé, seguindo, então, o traçado da antiga Via Trilhos. As obras da Via Binário, que terá 3,5 km de extensão, deverão ficar prontas este ano.

A Via Expressa terá 4 km de extensão e, nela, haverá um túnel de 1.540 m de comprimento. Ele parte das proximidades da avenida Presidente Vargas e volta à superfície na altura do Armazém 6 do Cais do Porto. A Via Expressa continua sobre o traçado da avenida Rodrigues Alves. O trânsito local será distribuído pela Via Binário do Porto.

O novo sistema viário, assim constituído, poderá aumentar em 40% a capacidade para atendimento do tráfego local, substituindo a função Perimetral, que atualmente, além de ser um obstáculo ao crescimento urbano e econômico na área, está saturada e deficiente. Com a nova solução viária, a capacidade de tráfego nas duas vias será da ordem de 10.500 veículos/hora até 2015.

Para a construção da Via Binário, e tendo-se em conta as questões da geologia local, a contiguidade com as fundações de edificações históricas importantes que não poderiam ser afetadas, a proximidade com a vizinhança que ali reside e trabalha, e a necessidade da utilização de explosivos nas escavações de túneis, o consórcio precisou estudar e utilizar procedimentos especiais, continuamente monitorados. Além das dificuldades impostas por essas limitações, sobrevin
ha outra: em razão do trânsito caótico no sistema viário atual, foi preciso distribuir os serviços em 22 canteiros compactos onde se movimentam, em espaços exíguos, máquinas e trabalhadores.

O diretor do contrato informa que boa parte do trecho por onde foi construído o Elevado da Perimetral se estende à beira-mar, sobre área aterrada. Trata-se de aterro formado basicamente de sedimento marinho, ao longo dos anos, no século passado. O traçado do túnel avançaria originalmente por esse aterro.

Com base nas sondagens realizadas na fase da elaboração do projeto, o consórcio construtor decidiu mudar o traçado, desviando-o do aterro sedimentar para a área onde há afloramento rochoso. O engenheiro Fernando Rebouças Stucchi, da EGT Engenharia, que, com a empresa Engecorps Engenheiros Consultores, elaborou o cálculo das “obras estruturantes”, costuma dizer que, naquele trecho, “há vários Pães de Açúcar enterrados”.

Para escavar o túnel da Via Binário do Porto foi executado um poço de acesso na Praça Mauá, com 27 m de diâmetro, 38 m de profundidade na cota mais inferior e 35 m no patamar geral. É a partir dali que está sendo escavado o túnel rodoviário de 14 m de largura, 8 m de altura e 1.100 m de extensão. O poço, contudo, teve outra finalidade: evitar que as fundações do Palacete Dom João VI e do prédio da Polícia Federal, ambos contíguos à obra, fossem afetadas.

O poço de serviço, para abertura do túnel a partir da Praça Mauá, foi provido de paredes-diafragma

O Palacete Dom João VI possui fundações executadas com estacas de madeira e o outro prédio, fundações executadas com estacas metálicas.

Ricardo Bueno informa que, quando da escavação do poço de acesso na Praça Mauá, um dos pré-requisitos da engenharia era evitar o rebaixamento do lençol freático. Não se poderia deixar que a água e o oxigênio afetassem as estacas de madeira. Esse material, quando só na água, não apodrece e, quando somente em terreno seco, também não. Mas a conjunção dos dois fatores seria danosa para as fundações.

A solução adotada foi a escavação do poço com a consequente execução de parede-diafragma, trabalho em que o consórcio utilizou uma hidrofresa alemã, dotada de um bit de escavação em rocha. As paredes-diafragma garantem a estanqueidade do poço e, consequentemente, a integridade das estacas de madeira. Contudo, conforme lembra Fernando Rebouças Stucchi, havia também o problema das estacas metálicas da edificação que abriga as instalações da Polícia Federal. Elas estão fincadas na rocha e, portanto, no processo de escavação do túnel, poderiam ser seccionadas.

Para preservar as estacas metálicas aventaram-se várias ideias. Uma delas seria a execução de uma subfundação para a transferência das cargas. Tal possibilidade foi analisada, mas, nesse interim, surgiu outra, mais simples: caso o túnel fosse executado com a maior profundidade, não seria preciso mexer nas estacas. O inconveniente consistia no seguinte: quanto mais fundo um túnel, mais comprido ele pode ficar e, quanto mais comprido, mais caro pode custar. Ocorre que tal solução contou com o apoio dos técnicos do consórcio construtor e está sendo levada adiante.

Um questionamento suscitado no começo das escavações dizia respeito ao uso da hidrofresa. Indagava-se: por que não o shield, comprovadamente eficiente nas escavações de túneis do metrô? E Ricardo Bueno responde: “O shield é viável quanto se tem em conta exatamente isso –túnel metroviário, com diâmetro específico para a passagem simultânea de dois trens. Mas o que nós estamos construindo é túnel rodoviário, com seção própria. Pela extensão e pelo diâmetro, o shield ali não seria recomendável”.

O processo em curso é perfuração, desmonte com explosivos, carregamento e transporte do material escavado para a área do bota-fora, a fim de ser posteriormente britado e utilizado em pavimentação. Em outros trechos, em solo, está sendo usado o método NTAM (New Austrian Tunneling Method) ou o sistema cut and cover invertido: faz-se a laje superior e, em seguida, escava-se por baixo.

O sistema de escavação, com o uso de explosivos, tanto no túnel da Saúde quanto no túnel do Binário do Porto, exigiu cuidados especiais por conta do desconforto que tais operações provocam na população local. Por isso, há um sistema de alerta por meio de sirenes. Depois, o operador e controladores de tráfego procedem ao bloqueio temporário no trânsito nas vias do entorno para veículos e pedestres. A detonação segue um rito planejado, controlado e seguro, segundo Ricardo Bueno.

O túnel da Saúde constitui engenhosa solução estrutural para suportar a extremidade da pedreira antiga sobre a qual se encontram fundações de condomínios

O túnel estrutural

O túnel da Saúde encaixa-se ao final de uma pedreira explorada no século passado para a compactação do aterro da região portuária. Havia até um dique, ali perto, de propriedade do Lloyd Brasileiro, inaugurado em 1911 e que foi aterrado com material oriundo dessa pedreira. Na década de 1980 a Caixa Econômica Federal favoreceu a construção de nove torres residenciais no morro. De modo que a área da pedreira não poderia sofrer alterações, sob pena de ocasionar problemas ambientais ou prejudicar aquelas torres. Contudo, a Via Binário do Porto teria de passar por ali. E passa, mas deixando espaço para a passagem, também, do VLT.

Desenhos esquemáticos do túnel mostram a localização dos emboques e a passagem do VLT

Mas como fazer o túnel, sem que isso implicasse quaisquer problemas estruturais? A solução foi a construção da obra com seção transversal e revestimento primário, executado durante a escavação. Pode-se afirmar que são, a rigor, dois túneis laterais (“side-drifts”) nos quais está incorporado o túnel central, para o VLT, c
onforme esclarece o engenheiro Marcelo Wainberg, também da EGT Engenharia.

Na fase da execução dessa passagem de 70 m sob o morro da Saúde foi necessária a instalação de tirantes que atravessam o maciço. Eles proporcionaram segurança na escavação. E houve aplicação de concreto projetado para evitar deslizamentos.

O túnel tem função estrutural. Devido à exígua cobertura de rocha e solo residual, e do empuxo desequilibrado na direção transversal, não há quase trabalho de arqueamento de carga no terreno. As camadas de solo e rocha acima do que os calculistas chamam da “geratriz superior” acabam pesando sobre a estrutura sem transportar carga transversalmente. O empuxo transversal desequilibrado gera flexões significativas na estrutura. O túnel, portanto, é uma peça estrutural, encaixada na formação rochosa da antiga pedreira – mais uma solução aparentemente simples, mas original, que resolveu uma série de problemas até econômicos e sociais.

A demolição da Perimetral

No dia 4 deste mês foi efetuada a operação para a remoção da primeira viga do Elevado da Perimetral, parte importante das obras do projeto Porto Maravilha. A peça metálica, de 40 m de extensão e 22 t, é a primeira dentre as 1.008 do gênero que serão retiradas dali e levadas para área selecionada para receber as vigas e os fragmentos da estrutura de concreto.

Ricardo Bueno explica que não há um método específico para o processo de demolição. Ali, todas as opções são válidas. A Perimetral não tem uma estrutura técnica única ao longo de sua extensão. Há pilares centrais, balanços com vigas metálicas, pórticos biapoiados num pilar, dois apoios e vigas centrais e trechos em caixão perdido. “Portanto, não temos uma receita única para colocar aquilo no chão”, diz o engenheiro.

Cada pedaço do elevado requer uma técnica diferente na desmontagem e na fragmentação da estrutura de concreto, um trabalho moroso, cuidadoso, que requer avaliações prévias para interferência no tráfego – sobretudo porque trechos do elevado continuarão em operação. De qualquer modo, o calendário é implacável. E 2016, ano da Olimpíada, não está longe.

Fonte: Padrão


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