Há espaço no Brasil para investimentos privados na infra-estrutura portuária? Há controvérsias. Para um grupo de investidores ligados à Associação Brasileira da Infra-estrutura e Indústrias de Base (Abdib), a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), amparada na legislação em vigor, impõe restrição à construção e funcionamento de portos privados no Brasil. Pela legislação, os Terminais Portuários de Uso Privativo Misto, podem ser construídos por empresas desde que elas possuam carga própria para a movimentação, além da carga de terceiros. Isso, para os empresários interessados em novos empreendimentos portuários, limita a entrada, no sistema de recursos privados da ordem de US$ 5 bilhões.
Contrariamente a essa posição estão as empresas que arrendaram, por meio de licitação pública, terminais em portos públicos, como o de Santos e o do Rio de Janeiro. Reunidas na Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público (Abratec), essas empresas, responsáveis por investimentos de cerca de US$ 2 bilhões, de 1995 a 2008, na modernização da infra-estrutura portuária, consideram que, para participar do mercado como novos terminais privados, os investidores deveria necessariamente se submeter processos de licitação pública.
Para a Abratec, a implantação de terminais integralmente privado para atuarem como se fossem terminais de uso público, sob o argumento da necessidade de novos investimentos e de expansão dos portos, é inconstitucional. Segundo, Sérgio Salomão, presidente da entidade, a resolução da Antaq segue a Constituição e a Lei dos Portos, que estabelecem que a atividade portuária no Brasil é um serviço público que precisa de licitação para ser concedido à iniciativa privada. “A criação de terminais a finalidade de uso público, sem prévia licitação, é inconstitucional e ensejaria uma total desorganização do setor”, diz Salomão.
A disputa se acirrou de tal maneira que foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). Os empresários ligados à Abdib pedem a revogação da resolução da Antaq, de outubro de 2005. Nesse grupo estão pesos pesados como a LLX, do empresário Eike Batista, OAS Investimentos, Grupo Coimex, Bunge, Triunfo (dona da Portonave) e Hamburg Süd.
O exemplo da Portonave
Para Osmari de Castilho Ribas, diretor-superintendente da Portonave S.A., administradora do Porto de Navegantes, na margem esquerda do Rio Itajaí-Açu, em Santa Catarina, o projeto Portonave é um exemplo do que o capital privado pode fazer pela modernização do sistema. Ele defende a modernização do arcabouço jurídico que normatiza o setor. “Gradativamente os terminais privados vão sendo incorporados ao sistema portuário brasileiro, que apresenta um forte crescimento e reclama por novos investimentos. Assistimos hoje a uma nova escala de negócios no setor e é preciso adotar novas formas de gestão”.
Ribas lembra que há inúmeros exemplos de países com tradição portuária, abertos para a economia globalizada e o capital privado, dentre os quais a Holanda, Bélgica e França, onde portos públicos e os terminais privados coexistem. “No Brasil, muitas empresas desenvolvem atualmente estudos para a implantação ou ampliação de terminais privados para atender a alta demanda. Existe a necessidade de modernização em todos os portos, com relação à aplicação de tecnologia de informação, segurança, gerenciamento e movimentação, que abrem espaço para a ampla participação privada”, assegura.
Considerado o mais moderno porto privativo de uso misto do Brasil, o porto de Navegantes consumiu investimentos de mais de US$ 200 milhões em sua construção e início de operação. “Navegantes foi idealizado para ser um dos terminais mais eficientes na movimentação de cargas conteinerizadas da América Latina. No ano passado, o porto movimentou 12 mil TEUs e a perspectiva é a de se alcançar 350 mil TEUs em 2008”, diz Castilho Ribas comentando que o porto é especializado na movimentação de contêineres e entre as cargas transportadas estão: carnes, frutas, madeira, cerâmica, têxteis, entre outras.
Metas e resultados
Em seu primeiro ano de atuação, o Porto de Navegantes tem como meta movimentar 180 mil contêineres até o final de 2008. Desde o final de 2007, quando começou a operar, o porto recebeu 67 navios de cargas que movimentaram 30 mil contêineres. Destes, pouco mais de 72% foram destinados à exportação.
Um contrato firmado com armadores alemães garantiu uma escala semanal em Navegantes com destino aos Estados Unidos. E em junho, o porto passou a operar em parceria com o armador japonês NYK Line, um dos maiores do mundo e primeiro do Japão.
Em conjunto com a Hyundai Merchant Marine, maior companhia de Coréia do Sul, foi criado um novo serviço da companhia, batizado de New Horizon Express (NHX). As rotas serão feitas para a Ásia, África do Sul e Costa Leste da América do Sul, em 10 navios com capacidade nominal de 2,5 mil TEUs cada. “O nosso principal diferencial é a agilidade. Hoje, a palavra de ordem no mercado mundial é investir constantemente em agilidade de operação e tecnologia de gerenciamento”, disse. Atualmente, o terminal também mantém acordos comerciais com o armador MSC, que movimenta cargas desde o inicio das atividades do porto, com a Hamburg Sud e a ZIM.
Para melhor atender seus clientes, a administração da Portonave promete inaugurar até setembro, o Iceport – Terminal Frigorífico de Navegantes. Trata-se do maior centro de armazenamento, distribuição e consolidação de carga frigorificada próximo a um cais no Brasil. O projeto prevê a construção, em uma área total de 50 mil m², de uma câmara frigorífica totalmente automatizada, cujo volume de armazenagem será de 170.251 m³ para uma capacidade estática de 18 mil t e movimentação de 16 mil posições de pallets. “Está sendo considerado o maior armazém automatizado de congelados próximo a um cais do Brasil”, comenta o diretor superintendente.
Parte da estrutura usará tecnologia de ponta para a movimentação de cargas, com a utilização de transelevadores – robôs de alta performance, vindos da Espanha, que manipulam até 360 paletes por hora. O terminal conta hoje com um cais de 900 m de extensão, quatro berços, uma retroárea de 270 mil m² e 960 tomadas reefers.
Possuiu uma área administrativa com mais de 8.600 m², além de oficina para manutenção, armazéns e instalações adequadas para os órgãos intervenientes, como a Receita Federal, o Ministério da Agricultura e a Agência Naci
onal de Vigilância Sanitária (Anvisa). Conta ainda com 10 gates, 150 vagas de estacionamento e uma infra-estrutura completa para que a permanência dos transportadores no terminal seja a mais adequada. O empreendimento possui ainda as suas próprias estações de tratamentos de água e esgoto.
O Iceport receberá investimentos da ordem de US$ 30 milhões e será composto pelos seguintes equipamentos: frota de 10 caminhões (Truck parking lot); uma câmara frigorífica autoportante para 14.256 posições/pallets; seis transelevadores totalmente automatizados; uma câmara frigorífica convencional para 1.500 posições/pallets; antecâmaras com 13 docas para carga e descarga; três túneis de congelamento com 36 posições/pallets cada; 30 tomadas para contêineres. Serão 16 mil posições pallets e uma capacidade de movimentação – entrada e saída – de 320 pallets por hora, capaz de movimentar em torno de 900.000 t/ano.
“A aposta é que o aumento das exportações e da demanda internacional façam do Iceport um pólo de escoamento da produção de carnes, aves e peixes de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. Vamos suprir também parte da carência de estocagem de produtos congelados enfrentada hoje pelo Pais”.
Todos os equipamentos utilizados no porto de Navegantes são novos e modernos e representam o que existe de melhor em termos de operação portuária no mundo. O porto possui três portêineres Post Panamax, com capacidade para até 50 movimentações por hora, oito transtêineres e dois guindastes MHC que garantem agilidade e segurança na movimentação da carga. Caminhões especiais, reach staker e front loaders dão velocidade a todo o processo. Com esta configuração o porto será capaz de movimentar mais de 1 milhão de TEUs por ano.
De acordo com Castilho Ribas, Navegantes tem empreendido esforços no sentido de superar os seus principais gargalos. Entre eles, a construção de uma linha de transmissão de energia com 27 km de extensão, em fase final de conclusão, e o acesso rodoviário ligando o empreendimento à BR 470, em construção.
Em parceria com o porto de Itajaí, a companhia desenvolve estudos técnicos que aperfeiçoem a entrada de navios no canal, bem como a manutenção da dragagem. “As operações no porto de Navegantes tiveram início em outubro de 2007 e vêm evoluindo gradativamente. A nossa expectativa é a de consolidar nossa operação no segundo semestre de 2008 quando teremos todos os equipamentos de movimentação em operação”, diz o diretor superintendente.
O Porto de Navegantes conta com estrutura completa para movimentar com um cais de 900m de extensão e quatro berços, um canal com produtividade de 11,30m e uma bacia de evolução de 400m de largura, que permite a atracação dos maiores navios que navegam na costa brasileira.
Ribas diz que a Iceport contribuirá para melhorar a condição de estoques da indústria e a necessária sinergia com a operação portuária, reduzindo as pressões de logística que normalmente ocorrem em determinados estágios da produção. “Nosso objetivo é oferecer aos clientes um eficiente serviço, apoiar a sua logística, além da ampliação da capacidade de armazenamento na região. Buscamos intensificar investimentos na área de logística, oferecer condições atrativas para os usuários, integração com a operação portuária e nos tornar uma das empresas mais competitivas no segmento de logística”, reforça.
Fonte: Estadão