Recessão nos mercados domésticos empurra as empresas globais a buscar oportunidades no exterior. Matéria cedida com exclusividade pela ENR-Engineering News Record
O total dos contratos no mercado doméstico cresceu 6,1% em 2012, somando US$ 233,99 bilhões, enquanto que os serviços no exterior representaram faturamento de 22,4% e elevaram-se a US$ 74,46 bilhões.
Há diferenças marcantes entre o setor privado e público nos Estados Unidos — enquanto que a atividade manufatureira avançava 22,9% em 2012, mantendo ascendente a curva que já havia subido 82% no ano anterior; a de processos industriais expandia 21,9%; a de energia cresceu 15,3%; a de petróleo melhorou em 13,1% e a de telecomunicações ampliou-se em 10,4%.
Já os segmentos de infraestrutura do mercado norte-americano cresceram pouco — e até encolheram. Obras domésticas de transporte expandiram-se em 3,9%; projetos de água reduziram-se em 25,8%; as de esgotos recuaram pelo quinto ano consecutivo, perdendo 0,7% em 2012. O setor mais ativo continua sendo edificações em geral, subindo 3,6%, significando um total de US$ 113 bilhões.
Ainda existem megaprojetos
As maiores construtoras da lista ENR Top 400 Contractors podem celebrar a conquista de megaprojetos em 2012. A Bechtel, que obteve US$ 19 bilhões em contratos novos, destacou o projeto de engenharia de uma nova planta de gás natural liquefeito em Moçambique, para a Anadarko Moçambique Área 1, e uma planta termelétrica de ciclo combinado no Texas, EUA.
A Fluor também teve um ano bom. Em um consórcio que participa recebeu sinal verde para iniciar o projeto de reposição da ponte Tappan Zee, em Nova York, orçado em US$ 3,14 bilhões. A empresa ganhou contrato de uma unidade de craqueamento de etileno para a Dow, no Texas. O backlog consolidado da empresa em 2012 atingiu US$ 37,5 bilhões, abaixo do ano anterior, “devido à retração da indústria de mineração e metalurgia”, segundo sua direção.
Houve uma série de negociações de construtoras que planejavam entrar em novos mercados regionais nos EUA via aquisição de concorrentes locais. Na outra ponta, quem fez associações de porte colocou empenho em concretizar as sinergias, como é o caso da Balfour Beatty, que tem trabalhado em numerosos projetos com a coirmã Parsons Brinckerhoff, capitalizando os talentos dos seus quadros.
Setor privado retoma projetos
A crise da economia norte-americana, que só agora parece amainar, prejudicou o fluxo de arrecadação nos três níveis do governo, cujas obras foram ainda prejudicadas pelos cortes de orçamento ativados de forma automática e obrigatória por conta do impasse na aprovação do orçamento federal, centro da briga entre os dois partidos do País. Assim, as perspectivas no mercado de infraestrutura ainda são incertas.
O setor privado parece dar sinais de retomada dos seus empreendimentos, que haviam sido suspensos com a crise econômica. Os bancos e instituições financeiras também estão ativando suas linhas de crédito, provavelmente influenciados pelos seus clientes dos segmentos industrial, comercial e imobiliário. O presidente da Beck Group, Fred Perpall, alerta que os clientes estão mais cautelosos com seus investimentos, exigindo planos alternativos para diferentes cenários, visando sempre a agregar o maior valor possível aos empreendimentos.
O presidente da JE Dunn Construction, Terry Dunn, aponta que há demanda por projetos multirresidenciais, hotéis e edifícios de escritórios. É a primeira vez na história que a retomada pós-recessão está sendo liderada pelo setor privado. Analistas financeiros estimam que haverá ainda dois ou três anos de crescimento moderado, mas a economia norte-americana está na direção certa, afirma ele.
Indústria manufatureira inicia novo ciclo
Há empresários animados com o cenário que se desenha, com a formação de uma classe média global que deseja produtos norte-americanos de qualidade, cujo preço se tornou competitivo com a queda do custo da energia e juros baixos. Há indicadores de instituições industriais que preveem um ciclo de expansão de cinco a dez anos da indústria manufatureira. Entretanto, essas novas indústrias são muitas vezes retrofit de instalações existentes e serão altamente automatizadas, empregando pouca mão de obra — algumas dezenas de funcionários, ao invés de centenas.
A revolução do gás natural de xisto não só derrubou os preços do insumo, mas também gerou forte demanda de obras de infraestrutura, como modernização de gasodutos e novos projetos. Alguns incidentes de vazamentos em dutos em anos recentes aumentou o monitoramento das agências públicas e as operadoras estão investindo para melhorar a integridade dos sistemas. A maioria dos projetos se localiza no Golfo, além de outras regiões isoladas como, North Dakota, e não se limita apenas à produção e transporte do gás de xisto, mas também atrai projetos petroquímicos a jusante e plantas manufatureiras na indústria do plástico. Esses empreendimentos industriais por sua vez vão demandar mais infraestrutura e energia. O presidente da Fluor, David Seaton, estima que algo em torno de US$ 35 bilhões de projetos EPC vão agitar o mercado de engenharia e construção.
O mercado de energia lida com um cenário de incerteza regulatória desde que um tribunal federal invalidou a regra de poluição interestadual estabelecida pela Agência de Proteção Ambiental em 2012, afetando diretamente novos projetos de gás, incluindo termelétricas que antes queimariam carvão.
A indústria de energia renovável vive também um futuro incerto, assim que os incentivos fiscais começarem a expirar – a receita federal determinou que tais isenções somente seriam válidas para plantas cuja construção tenha início até 31 de dezembro próximo, o que provocou uma corrida para aprovação de projetos.
Faltam obras menores em transportes
Este mercado sofre com escassez de recursos há alguns anos, prejudicado pelo impasse político no Congresso norte-americano. Há um grande número de megaprojetos de transportes em fases variadas de engenharia financeira, mas há poucas obras de porte médio em escala regional, que dependem de recursos das municipalidades e estados atingidos pela crise econômica no país. Construtoras estão buscando a modalidade PPP e outros mecanismos de financiamento para viabilizar empreendimentos de porte, que podem ainda contar com uma linha de financiamento específico do governo federal. O projeto de substituição da ponte Goethels, em New Jersey, de US$ 1,5 bilhão, é uma PPP, por exemplo.
Uma das dificuldades que retarda o avanço da modalidade PPP é a falta de experiência dos investidores norte-americanos neste tipo de projeto, ao contrário de construtoras canadenses e europeias, que conhecem suas peculiaridades há anos. Existe uma crescente atuação dessas empresas nos projetos PPP, contando inclusive com financiamento oficial dos seus países de origem, ao contrário das suas concorrentes norte-americanas, que dependem do mercado financeiro local.
As projetistas globais ganharam 37,8%de receita na América Latina
De acordo com a pesquisa Top 200 International Design Firms da revista ENR-Engineering News Record, publicada em julho de 2012, reunindo os números da receita do ano de 2011, a região que mais cresceu em faturamento para os projetistas globais foi a América Latina/Caribe, com avanço de 37,8% sobre o ano anterior, atingindo o total de US$ 5,3 bilhões. Em seguida, vem a região Ásia/Austrália, que cravou alta de 26,3%, com um total de US$ 16,82 bilhões.
O mercado europeu surpreendeu com crescimento de 14,4%, somando US$ 15,17 bilhões de contratos em 2011. Os Estados Unidos foram a única região onde os serviços de projeto e consultoria recuaram, caindo 4,8%, para US$ 6,45 bilhões. Somando as receitas da lista Top 200, os projetistas globais expandiram em 13,3% seu faturamento fora do seu país de origem, representando um total de US$ 65,31 bilhões; enquanto que os contratos domésticos elevaram-se em 9,8%, para US$ 65,34 bilhões. Combinando esses números, este grupo conquistou 11,4% a mais de receita conjunta, para US$ 130,54 bilhões em 2011.
O processo de consolidação continuou. Duas das maiores aquisições foram a da Halcrow inglesa, cujo controle passou à CH2M Hill, e a Genivar, canadense, mais conhecida no seu país, que assumiu a WSP Group inglesa, que possui sólida atuação no exterior. Royal Haskoning e DHV Group, ambas da Holanda, fundiram suas operações, com 8 mil empregados em 35 países. Pelo padrão global, entretanto, a empresa resultante ainda é considerada pequena.
As projetistas europeias de grande porte, como a Mott MacDonald inglesa, têm enfrentado com sucesso a turbulência do mercado global. Seu presidente, Keith Howells, afirma: “Mantivemos nossa estrutura de 2009 no auge do mercado e atravessamos a crise com perdas na lucratividade, mas intactos”. W.S.Atkins, como suas concorrentes de igual porte, tinha pouca exposição em países com graves problemas, como a Grécia. Seu presidente Uve Krueger adianta que parte da sua equipe em Portugal foi transferida para o Oriente Médio.
Na opinião de Krueger, nesses tempos de crise, “os governos precisam focar medidas de longo prazo para sustentar a economia — e isso geralmente implica investir na melhoria da infraestrutura”. Ele acredita que a modernização da infraestrutura vai perdurar por anos afora. “Este será o século da engenharia”, diz ele.
Krueger alerta que está havendo uma mudança geográfica na demanda global, à medida que a participação no PIB mundial dos países industrializados tende a cair para menos de 50%. Ao mesmo tempo, clientes pressionam os projetistas e gerenciadoras em prover recursos técnicos e financeiros.
Este tipo recente de demanda e restrições financeiras estão levando os projetistas a ampliar seu escopo de serviços. “Com medidas de austeridade na maioria dos mercados, o foco em gerenciamento de ativos está se fortalecendo, com as condições econômicas pressionando por melhor gestão, maior redução de custos e pela visão de ‘ciclo de vida’ nas decisões de investimento”, lembra Tony Porter, diretor da Opus International Consultants, da Nova Zelândia. Ele aponta que a gestão de infraestrutura tornou-se uma prioridade inadiável em países carentes de recursos. “Esta visão mais holística, de longo prazo, na concepção, construção, comissionamento, operação, manutenção de infraestrutura, é o futuro da engenharia consultiva”.
Crise europeia tem poucas exceções
A Escandinávia representa um pouco de luz no cenário turbulento da Europa, enquanto governos e investidores esperam pelas medidas que a Comunidade Europeia reluta em tomar. A Cowi dinamarquesa destaca que a Noruega sustenta forte demanda, enquanto que o mercado no seu país vai se expandir com a ligação ferroviária fixa Fehmarn Belt em direção à Alemanha. Não há falta de recursos nesta região.
Ajustes são inevitáveis. A Aecom Europe enfrentou o colapso do mercado de transporte na Espanha ao transformar sua base local, de 300 funcionários, num centro de recursos para dar suporte a contratos em outros países. A empresa hoje focaliza mais os clientes comerciais e se vale dos seus quadros na Inglaterra para tocar projetos em mercados como a Europa Oriental, onde há demanda significativa na Rússia, Polônia e Romênia.
Pelos mesmos motivos, a concorrência no Oriente Médio é feroz entre as projetistas europeias. Embora haja ênfase nos projetos de infraestrutura na região, registra-se também uma retomada no segmento de edificações, como, por exemplo, nos Emirados Árabes. Iraque também representa um mercado potencial, com todas as dificuldades conhecidas. Os países que tiveram recentes mudanças de regime político sofrem naturalmente com uma parada temporária dos trabalhos em infraestrutura e empreendimentos privados.
Entre os países emergentes, por causa dos problemas na Europa, a China e a Índia passam por certo desaquecimento no mercado de engenharia, mas quem está lá não quer sair. A Mott, por exemplo, tem 150 técnicos envolvidos em consultoria de alto nível e suporte a investidores de fora. A Hatch tornou-se a primeira projetista 100% estrangeira a obter a licença Classe A para operar em projetos metalúrgicos de larga escala na China.
A Cowi dinamarquesa investe na sua operação na Índia, onde possui 100 empregados e espera dobrar os seus quadros em três anos. Atkins abriu escritório lá e traçou uma política de atuar em pro
jetos que não competem com projetistas locais. Mas, nesse caso, a concorrência se intensifica, à medida que atrai um número crescente de projetistas da Europa com o mesmo escopo.
A holandesa RH/DHV espera crescer no Brasil, onde ganhou um contrato de consultoria num projeto aeroportuário em São Paulo. A Hatch assumiu o controle da MEK Engenharia, dedicada a projetos hidrelétricos e eólicos. Mott também planeja uma aquisição no País. Mas a Cowi dinamarquesa considera “o mercado brasileiro difícil, por causa do complexo regime fiscal”. Devagar, as projetistas globais vão chegando ao Brasil.
Fonte: Revista O Empreiteiro