Ao todo, 18.428 km de estradas formam quatro das principais rodovias brasileiras – BR-116, BR-163, BR-101 e BR-230. Juntas, elas cortam alguns dos principais Estados do País e são trechos importantes para escoamento de produção agrícola e industrial, logística rodoviária, turismo e fonte de economia para as cidades atravessadas. Mas a falta de acostamento, pavimento deteriorado, acidentes, roubos, transformam as quatro rodovias também em pesadelos para os motoristas que passam por elas. Esses problemas, somados à imperícia e à imprudência, produzem dados assustadores: as rodovias brasileiras matam quase 40 mil pessoas por ano, segundo estatísticas do Departamento Nacional de Trânsito (Denatram); causam perdas por roubos de US$ 32 milhões, conforme dados da Confederação Nacional de Transporte (CNT) e causam prejuízos anuais, com as mortes no trânsito, de R$ 23 bilhões, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Para o diretor do Segmento Industrial de Pneus e Negócios da empresa de logística Ceva (antiga TNT), Ricardo Melchiori, que anteriormente foi diretor de Transportes da empresa, um dos maiores problemas é o fato de a principal modal para a malha logística do País ser o transporte rodoviário. “Dentro da matriz de transporte, o rodoviário é fundamental para a distribuição de bens. Por isso, é essencial que as rodovias estejam em estado satisfatório para que tudo flua bem”, esclarece.
BR-101 – A INTEGRAÇÃO INTERCONTINENTAL ESTÁ LONGE
Não é o que acontece em toda a extensão da BR-101. A rodovia, com 4.551 km, corta toda a costa brasileira e atravessa Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) prevê obras na região Sul, com a duplicação do trecho que vai de Palhoça (SC) a Osório (RS) e investimentos previstos, até 2010, de R$ 2,25 bilhões. Essa duplicação é considerada fundamental para a integração internacional. A rodovia faz parte do chamado Corredor do Mercosul, que inclui as BRs 381 e 116, e proporciona a interligação, em pista dupla, das regiões Sudeste e Sul. As obras favorecerão a conexão terrestre entre o Brasil, a Argentina e o Uruguai, dois fundamentais mercados do Mercosul. Mas, segundo Melchiori, é justamente na ligação dos Estados do Nordeste que a BR-101 mostra seu lado mais problemático. “A estrada está bastante precária e isso prejudica a região, que já é deficitária em termos econômicos”. Para exemplificar o que diz, ele destaca os cerca de 800 km do trecho que vai de Recife (PE) a Salvador (BA). “Se as condições não estão boas, acabam prejudicando toda a operação logística. Atrás disso, resultam em custos altíssimos de manutenção e de outros tipos de perdas, como roubos e acidentes”, diz. Pelo menos um trecho, que compreende toda a extensão entre Natal (RN) e Palmares (PE) e que é a principal ligação entre as capitais litorâneas nordestinas e o centro-sul do Brasil, já está em obras. São 335,7 km de adequação da capacidade e modernização, divididos em oito lotes. Três já estão em execução pelo Exército Brasileiro e os outros cinco se encontram em fase de licitação pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (Dnit). Essa obra de restauração e duplicação da BR-101 está estimada em R$ 1,5 bilhão.
BR-163 ATRAIU COLONOS, QUE FICARAM ABANDONADOS
A gerente de Movimentação de Estoques da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Marisa Ribeiro Tosta, considera a BR-163 uma das rodovias com maior necessidade de recuperação, principalmente no eixo Norte. A rodovia, com 4.354 km de extensão, corta os Estados de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Pará, até a fronteira com o Suriname. “Para nós, essa rodovia daria maior retorno em termos de ganho no escoamento das safras para exportação e para o mercado interno, principalmente para a soja, o milho e o algodão. No caso do algodão, o volume exportável, tanto do Mato Grosso como do Mato Grosso do Sul, segue para os Portos de Santos e Paranaguá. Portanto, a Rodovia BR-163 é de grande valia porque atravessa o Mato Grosso, o Mato Grosso do Sul e o Paraná, sendo a melhor alternativa para o Porto de Paranaguá”, analisa. Marisa também destaca que há um trecho de cerca de 700 km no Pará que é de terra e que, ao ser pavimentado, favoreceria o escoamento para exportação por via fluvial. No Norte, a 163, também chamada Cuiabá-Santarém, foi construída pelo regime militar nos anos 1970 para servir como eixo colonizador da Amazônia, mas a estratégia não deu certo; ela está quase toda abandonada. Em 2005, o governo federal lançou o Plano BR-163 Sustentável, com o objetivo de diminuir os impactos sociais e ambientais da pavimentação e implantar um modelo de desenvolvimento sustentável na região. A principal idéia era transformar a BR-163 em um corredor de exportação através do rio Amazonas, para escoar a soja e outros produtos ligados à agropecuária. A previsão de investimentos é de R$ 1 bilhão. Por enquanto, o plano não saiu do papel. O repórter e ambientalista Paulo Leandro, que já fez inúmeras reportagens sobre a situação da BR-163 lembra que ao longo do traçado da rodovia vivem mais de dois milhões de habitantes. “As pessoas foram atraídas pelo governo brasileiro para a Amazônia na década de 70, com a promessa de terras. Hoje,os moradores do entorno das rodovias são punidos por a terem desmatado, plantado, construído cidades, fazendas e indústrias. De herói a desbravador, o colonizador das rodovias BR-163 e BR-230 passou a ser tratado como marginal”.
BR-230 FOI RETOMADA PELA FLORESTA
O problema, segundo a diretora comercial de Operações Logísticas do Grupo Julio Simões, Irecê Andrade, é a falta de investimentos em infra-estrutura, no tocante à construção de estradas, modernização de vias e investimento em segurança. “As condições das BRs 101, 116, 163 e 230 são muito precárias e o risco de acidentes é muito grande, o que torna a operação logística menos produtiva”, analisa. Um exemplo claro do que fala a diretora é a BR-230, antiga Transamazônica, que liga horizontalmente, com 4.962 km, a Paraíba, o Ceará, o Piauí, o Maranhão, o Pará e o Amazonas. O diretor da Ceva, Ricardo Melchiori, afirma que, em termos logísticos, essa rodovia é pouco considerada por pertencer a uma região inóspita e haver sempre o risco de o motorista não encontrar parte da estrada por causa da floresta. “Se não se constrói em def
initivo, a floresta engole tudo e, no caso da BR-230, a situação é que a floresta voltou a recuperar o que tinha perdido na construção dessa rodovia”, diz. O resultado é que não se podem aproveitar os benefícios da ligação horizontal. “O trânsito é sempre na vertical – ou o motorista sobe, ou desce –, ocasionando custos maiores de logística, mais emissão de gases poluentes, mais quilometragem”, destaca.
BR-116 INCLUI A RODOVIA DA MORTE
A BR-116 é a principal rodovia brasileira. Com seus 4.561 km de extensão, corta os Estados do Ceará, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O fato de uma parte dela – a divisa do Rio de Janeiro e São Paulo – ser privatizada, segundo Melchiori, faz com que a rodovia esteja melhor. Entre os principais problemas da BR-116 estavam 800 m de pista na divisa do Paraná com São Paulo. Essa parte da estrada, conhecida como Rodovia da Morte, sofria com a falta de duplicação e aumentava o risco de acidentes para os 21 mil veículos que trafegam diariamente por ela. No mês passado (abril), o Dnit concluiu essa duplicação, com uma obra avaliada em R$ 21 milhões, que restaurou a antiga pista, que passou a ter, agora, duas faixas no sentido Curitiba.
Fonte: Estadão