Só em 57 anos País pode alcançar universalização

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Para o presidente da Abcon, Yves Besse, falta conscientização dos municípios e fiscalização do Ministério das Cidades para universalizar serviços públicos de água e esgoto no Brasil

Qual é a dificuldade para se universalizar o saneamento básico no Brasil?

Yves Besse – Uma das principais dificuldades é o não cumprimento da nova lei de saneamento (11.445/2007) que, entre outros pontos, estabelece regras visando à universalização. Esse descumprimento acontece principalmente pela falta de conscientização dos municípios e de fiscalização do Ministério das Cidades.

O setor passou 20 anos para construir o novo marco regulatório, agora que temos diretrizes claras de como atingir a universalização dos serviços públicos de água e esgoto, surgem segmentos trabalhando para adiar a aplicação da lei.

Onde está o verdadeiro entrave para que isso ocorra?

Yves Besse – A cada iniciativa tomada pelo setor privado para reverter a situação atual do saneamento, enfrentamos o preconceito de um segmento desestruturado e ultrapassado, dominado por empresas públicas.

O executivo e o legislativo são burocráticos, eles se mostraram favoráveis à participação do setor privado, mas não se mobilizam para remover os obstáculos e esclarecer os municípios sobre as alternativas existentes para a solução dos problemas de água e esgoto. Falta também o apoio do Ministério Público no combate às iniciativas inconstitucionais, como as no Paraná e no Rio Grande do Sul.

O que essas deficiências trazem de consequências negativas para o País?

Yves Besse – A falta de saneamento básico provoca a morte de sete crianças por dia no Brasil, além de custos e impactos sociais fantásticos. Saneamento está diretamente relacionado à saúde pública, mas a falta dessa percepção torna difícil a sua solução.

Em que medida as concessionárias privadas podem contribuir para minimizar os problemas?

Yves Besse – O principal papel do setor privado é o de ajudar os municípios a resolverem seus problemas de água e esgoto. A parceria entre o público e o privado é o caminho, porque temos competência em gestão, podemos investir em tecnologias de ponta e viabilizar os investimentos para obras de saneamento.

O que o governo e os órgãos oficiais devem e podem fazer? Ou o que falta fazer?

Yves Besse – O governo federal deve acompanhar a aplicação das leis do marco regulatório e também divulgar e incentivar os municípios a praticarem os modelos de parceria público-privada (PPP) disponíveis.

A Câmara e o Senado devem evitar a descaracterização do marco regulatório discutindo e barrando os projetos de leis casuísticos, não permitindo que qualquer regulamentação modifique a lei.

Os legislativos estaduais devem atentar para interpretações dos Tribunais de Contas do Estado e trabalhar pelo seu esclarecimento. O Ministério Público deveria fiscalizar a aplicação do marco regulatório.

E, por último, cabe ao Executivo Federal proporcionar parcerias entre operadores e financiadores. A Caixa e o BNDES precisam desburocratizar o processo de empréstimo, modernizar seus modelos de financiamento e cumprir suas funções de viabilizar recursos para o desenvolvimento urbano nacional.

O que está previsto de investimentos?

Yves Besse – Para que a universalização dos serviços de saneamento seja alcançada, é necessário investir R$ 270 bilhões, que é o valor atualizado dos R$ 200 bilhões divulgados pelo Ministério das Cidades em 2000.

No ritmo atual dos investimentos em saneamento, levaremos 57 anos para atingir a meta de universalização. Para acelerar esse ritmo, os municípios têm de examinar todas as alternativas e levar o saneamento a sério.

A Copa 2014 e das Olimpíadas 2016, que serão realizadas no Brasil, podem desencadear uma mudança para melhor? Esse eventos não deveriam deixar um saldo positivo para a população?

Yves Besse – Receber eventos desse porte pode, sim, ser uma oportunidade para promovermos as mudanças necessárias e não passarmos a vergonha de mostrar para o mundo a realidade dos municípios brasileiros em relação ao saneamento.

Yves Besse – Hoje só 32% dos esgotos domésticos são tratados no País. Só estaremos preparados se tomarmos uma atitude firme para que a nova lei do saneamento seja aplicada e que o privado seja visto como um parceiro, capaz de ajudar os municípios a resolverem seus problemas.

Quais são as perspectivas de um dia termos um cenário ideal de saneamento em todo o território nacional?

Yves Besse – Quando usarmos a política para fazer saneamento e não o contrário. Quando o País entender que o acesso aos serviços públicos de água e esgoto, além de ser um direito constitucional, é uma questão de desenvolvimento social e de saúde pública.

É possível destacar algumas concessionárias que mereçam destaque em função do que estão realizando?

Yves Besse – Existem companhias estaduais competentes, como a Sabesp, Sanepar e Copasa, e empresas privadas eficientes. As empresas estaduais mais modernas já veem o setor privado como um parceiro para acelerar seus investimentos e melhorar a operação.

No ranking da oferta dos serviços de saneamento nas maiores cidades do Brasil, divulgado pelo Instituto Trata Brasil, dos 10 municípios com melhores serviços, três contam com a participação da iniciativa privada.

Nós todos, empresas públicas e privadas temos de oferecer serviços de qualidade aos brasileiros. Mais do que merecer, é um direito da população.

Yves Besse é presidente da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon) e da CAB ambiental.

Fonte: Estadão


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