Há esperança de que o Rio, em 50 anos, seja uma cidade mais justa,
com infraestrutura compatível com a sua modernidade e a necessidade de melhorar a qualidade de vida
Rosane Santiago-Rio de Janeiro (RJ)
Éprovável que nos próximos anos a cidade do Rio de Janeiro consiga resolver seus problemas mais graves do ponto de vista de urbanização, transporte, saneamento, habitação, qualidade de vida e educação.
Nessa primeira década do século 21, a cidade passou a ser considerada a grande anfitriã de eventos internacionais. Há muito tempo não acontecia uma interação tão produtiva entre os governos municipal, estadual e federal com relação a investimentos. Para os Jogos Olímpicos, a cidade espera recursos da ordem de US$ 17 bilhões de dólares, quantia que, com a Copa de 2014, terá um acréscimo de US$ 7 bilhões, de acordo com estimativas do governo e de empresários. Esse dinheiro será investido, principalmente, em obras de infraestrutura, de melhoria das vias e serviços de transporte público, além de segurança.
"Quando a cidade foi escolhida para sediar a Olimpíada 2016 foi feito um plano estratégico para o pós 2016. Projetos estruturantes para o Rio de Janeiro sempre existiram, mas o impulso da Olimpíada determinou que estes fossem executados com cronograma previamente fixado. A primeira ação da prefeitura foi centralizar um escritório de projetos que coordena todos os setores, olhando-os sistemicamente", segundo Antônio Carlos Dias, diretor Comercial da Agência Rio Negócios.
Ele diz que "as mudanças, que agora serão feitas, marcarão o Rio para os próximos 50 anos. Uma das obras previstas é o Porto Maravilha, projeto orçado em US$ 1,8 bilhão". Situado no centro da cidade, envolvendo parte da região portuária, numa área correspondente aos bairros de Ipanema e Leblon, o projeto foi feito para criar infraestrutura urbana e resgatar um território que estava comprometido economicamente.
O secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar, cita a revitalização da área portuária como uma das pérolas do projeto olímpico: "É uma Parceria Público-Privada de R$ 7,5 bilhões que vai renovar toda a infraestrutura e o sistema de transporte da área portuária, com a implantação de um Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), abrangendo não só a Zona Portuária, mas outras áreas da região central da cidade, inclusive com acesso ao Aeroporto Santos Dumont. Destaco com essa revitalização a construção de edificações comerciais e residenciais, inclusive grande parte das edificações residenciais, que servirão aos Jogos Olímpicos que serão realizados naquela região ficará como legado de residências para os moradores da cidade após o evento. Outro ponto: os investimentos maciços em atividades culturais, de gastronomia, de lazer e entretenimento que vão tornar a área portuária uma região de especial qualidade urbanística, social e cultural. Além disso, há em curso investimentos maciços no sistema educacional da cidade, no sistema de saúde pública, o que nos leva à expectativa de que a cidade venha a passar por um processo de transformações urbanísticas e sociais só comparado talvez ao que a cidade de Barcelona viveu por ocasião dos jogos olímpicos, no início da década de 90 naquela cidade" .
Alfredo Britto, arquiteto reconhecido por seus trabalhos em favor da preservação do patrimônio histórico, se empolga quando sabe do tema da entrevista: "Desejo mesmo que daqui a 50 anos o carioca tenha em sua vida cotidiana uma qualidade e uma dignidade que ainda não possui". Ele diz que nos próximos 50 anos terão que estar resolvidas questões como transportes e qualidade dos espaços públicos, habitação e educação. "A questão do transporte se liga, sobretudo, à irracionalidade que se criou ao fazer com que as pessoas trabalhem a dezenas de quilômetros da sua moradia. Uma cidade do futuro deverá comportar pessoas residindo próximas ao trabalho, utilizando uma rede de transportes públicos interligados e adequados a esta população. Isso significa uma inversão total, muito radical, de uma postura errada que foi um dia o incentivo à indústria automobilística e ao automóvel como sonho de consumo".
Delmo Pinho, subsecretário de Transportes do Estado do Rio, concorda com Brito: "Atualmente temos carros demais, engarrafamentos demais e nosso trabalho é criar perspectivas de poder trazer uma solução adequada ao transporte individual. Temos que dar à população a possibilidade de um bom transporte coletivo. Em cinquenta anos seguramente a condição do transporte será outra, mas isso depende do que estamos fazendo agora. Esperamos uma melhoria bastante significativa no transporte do Rio de Janeiro já para 2016. Tem sido concedida maior atenção aos corredores de ônibus devidamente estruturados, metrô, bondinhos de Santa Tereza, trens do subúrbio, barcas, ligações rodoviárias, BRTs (em desenvolvimento e construção) e os BRSs, que já estão sendo utilizados".
Projetos que há anos estavam engavetados começam a sair do papel: a Linha 4 do Metrô, além da construção dos grandes corredores de transportes públicos de massa, como os quatro grandes BRTs (Bus Rapid Transit) que compreendem a Transoeste, Transcarioca, Transbrasil e a Transolímpica. Está havendo também o reaparelhamento do sistema de transporte ferroviário de passageiros.
Pinho acredita que é importante, para visualizar o futuro, falar de outros dois projetos: "Um deles é para o transporte de carga. Estamos elaborando o mapeamento logístico do Rio de Janeiro e o estudo das demandas das cargas a serem transportadas em 2040 – pretendemos estar trinta anos a frente das necessidades. Isso não é só fundamental para a cidade ou o estado, é para o bem do país. É uma atuação a fim de promover transportes de carga eficientes, sem esquecer que ainda por muito tempo eles vão acontecer por via rodoviária, pois para podermos transportar bens o caminhão ainda é o que prevalece".
"A outra ação e, cada vez mais acreditamos no êxito desta, é a popularização do transporte por bicicletas". O secretário explica que esse programa se estende a outras áreas do Estado. "O nome do programa é Rio Estado de Bicicleta e um dos pilares dele é o financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para fazer um estudo de algumas redes de inserção metropolitana".
Outra obra esperada é a ligação metroviária Rio-Niterói-São Gonçalo – a Linha 3 do Metrô do Rio de Janeiro -, para atender ao Rio e Niterói, sob a baía de Guanabara, chegando até São Gonçalo, com um movimento previsto superior a 400 mil
passageiros/dia. A Noronha Engenharia, responsável pelo projeto da obra da ponte Rio-Niterói (nos anos 1970), inovou na construção desta obra, prevendo a utilização de técnicas avançadas para a época, tais como as perfurações mecanizadas em rocha, a bentonita, execução de fundações profundas, e emprego de elementos pré-moldados de concreto protendido solidarizados através de produto epoxídico.
Para o projeto do túnel, a empresa previu uma tecnologia do século 21, com o emprego do Mix Shield, um tatuzão de terceira geração que age na escavação nas mais diversas condições geológicas, equilibrando pressões do terreno, em profundidades superiores a 70 m, abaixo do nível do mar.
O diretor técnico da Noronha Engenharia, Bernardo Golebiowski, assim define a Linha 3: "Um sistema metroviário de alta confiabilidade, com total segurança, que reduzirá a duração de viagens. O translado da Estação Carioca até Alcântara, por exemplo, que hoje se faz, no mínimo, em 1,30 hora, levaria, com o novo modal, somente 20 minutos. Além disso, há que se considerar outros fatores que, aliados ao conforto, trarão benefício ao meio ambiente, reduzindo significativamente a emissão de gases poluentes, com a diminuição da quantidade de ônibus em circulação".
Maravilhosa e ecológica
Em todo Brasil e no mundo se fala muito dos eventos que acontecerão no Rio de Janeiro, mas o primeiro deles, o menos divulgado, é a Conferência Rio +20, que acontece já em 2012. A Rio+20 será a continuação das já tradicionais reuniões da ONU sobre o tema, entre as quais as Conferências de 1972 em Estocolmo( Suécia), a de 2002, em Joanesburgo( África do Sul) e a mais badalada delas, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio-92 (ou Eco 92).
Segundo Alfredo Britto, a cidade já era chamada de cidade maravilhosa desde o século XIX. "O Rio tem um panorama que é uma coisa muito rara. Durante muito tempo, ela continuou com este equilíbrio, na escala entre as belezas naturais e edificadas. A questão maior foi quando nos anos 50 aconteceu uma necessidade de desenvolvimento e nós estávamos atrelados à economia americana".
O presidente do Instituto Pereira Passos, Ricardo Henriques, pontua algumas das atividades que considera mais importantes nesta área: "Proteger as áreas de risco fazendo contenções e retomar as florestas, identificar o que são pontos de risco, o que acontece nestas áreas, oferecer garantias para os moradores que estão lá, assim como beneficiar as moradias para o entorno. Uma Cidade linda e sustentável passa também pelo tratamento dos resíduos sólidos, pelo uso da água, da energia solar, pelo uso das florestas e das encostas. Acho que a gente está disputando este projeto no mundo, o de mostrar efetivamente, de maneira consistente, uma estratégia de cidade assentada em uma economia sustentável".
O poder público parece começar a se mobilizar com relação à Baía da Guanabara. O secretário de Habitação, Jorge Bittar, ressalta as iniciativas da prefeitura e do governo do estado com investimentos maciços na área de saneamento básico. "A meta é reduzir drasticamente o déficit de coleta em tratamento de esgotos na cidade do Rio de Janeiro. A prefeitura está atuando de maneira maciça na região de planejamento chamada AP5, zona Oeste da cidade, e o governo do estado investindo nas demais áreas, com desenvolvimento da ampliação das estações de tratamento de esgoto, por exemplo. São ações que vão melhorar muito a qualidade de vida na cidade e em toda a baía de Guanabara, na qual a cidade do Rio de Janeiro é participante. Eu destaco, além disso, os investimentos na área de resíduos sólidos. O Rio de Janeiro está implantando em Seropédica um moderníssimo centro de tratamento de resíduos sólidos que resolverá o problema da situação do lixão de Caxias, o lixão de Gramacho, que deverá ser fechado até o próximo ano".
Bittar continua: "Temos investido também em reflorestamento na cidade do Rio de janeiro, que tem a maior floresta urbana do mundo e deverá ser ampliada. A Secretaria Municipal de Habitação ao reassentar populações em áreas de risco também trabalha com investimentos pesados em reflorestamento".
Ricardo Henriques, presidente do IPP, avalia: "A cidade cresce num cenário internacional, portanto deve ser sustentável e isso tem impacto do ponto de vista da economia e da qualidade de vida. Uma opção consistente e racional para pensar todo o resto a longo prazo".
Fonte: Estadão