Não se pode mexer com a velha Europa. Sobretudo, a velha Europa que se acostumou a ancorar-se no euro. Séculos atrás também não se poderia mexer com ela. Ela sabia apontar os canhões de seus navios contra os países frágeis, por estas plagas ou pelas águas do Caribe, para mostrar o domínio que exercia no mundo.
Com a criação do euro costurou um poder econômico em que repete o refrão dos Três Mosqueteiros: "Um por todos, todos por um". Ocorre que o mercado tem suas leis e, estas, são mais perversas do que tiros de canhão ou golpes de espadas afiadas. O desequilíbrio econômico pôs a Grécia a pique. E ela, para salvar-se, apelou aos parceiros.
A resposta de socorro econômico chega tarde, mas acompanhada de uma serie de exigências. São tantas, que o antigo eixo democrático do mundo, a terra de Sócrates e Platão, vê-se atingido naquilo que lhe pode parecer mais caro: a liberdade de adotar suas próprias ações. Por isso, o primeiro-ministro George Papandreou referiu-se à necessidade de um referendo para saber se o povo grego – os trabalhadores que levam o país nas costas – aceita as exigências que os demais países do euro lhe fazem, para a concessão do empréstimo. O socorro vem acompanhado de um punhal na garganta do povo grego.
Transcrevo o final do artigo do jornalista Clóvis Rossi, "O fuzilamento da Grécia", publicado na FSP de anteontem: "… escrevo vendo, pela TV, Papandreou sentado ante o pelotão de fuzilamento formado pelo presidente Nicolas Sarkhozy, pela chanceler Angela Merkel, pelos líderos da Comissão Europeia e pela diretora-gerente do FMI".
E são esses países, integrantes do G20, que hoje exigem do Brasil e de outros "emergentes", que os ajudemos a sair do poço da crise econômica em que se meteram. Frise-se: uma crise que não foi gerada aqui, mas dentro deles mesmos. Como o Brasil, com tantas necessidades, com tanta pobreza e miséria, colocado no 84º lugar, dentre os 187 países relacionados no Índice de Desenvolvimento Humano, da Organização das Nações Unidas, pode ser pressionado para ajudar a velha Europa?
Fonte: Estadão