Nova Friburgo, Petrópolis, Teresópolis, Sumidouro. Os nomes dessas e de outras cidades estão gravadas, pela tragédia, na memória do País. E a minha expectativa é de que eles jamais deixem de constituir matéria essencial dessa memória.
Se, por acaso, houver um esforço nacional espontâneo, dedicado a difundir e a relembrar os números de mortos, feridos, desabrigados e desalojados pelas inundações e desabamentos que vêm acontecendo pelo Brasil afora, a administração pública talvez venha a adotar, um dia, providências efetivas para evitar a repetição, em diversas escalas, dessa vergonha nacional.
Porque, vamos e venhamos: trata-se mesmo de alguma coisa vergonhosa. Em pleno limiar de uma nova década de um século novo, marcado pelo desenvolvimento técnico em tantas áreas, em especial nos campos do planejamento e da engenharia, vêm as chuvas e provocam, por baixo, 630 mortes. Há homens públicos que encaram esse fato como algo que pode acontecer. E aconteceu. Afinal, alegam eles, o que aquelas cidades tiveram pela frente foram "fenômenos naturais".
Gostaria de registrar que não acredito nessa espécie de simplificação. Há os fenômenos naturais, claro. O aquecimento global é mais do que uma evidência. As mudanças climáticas deixam todo mundo com os nervos à flor da pele. Mas, não me venham dizer que a tragédia não poderia ter sido ao menos minimizada. Poderia sim e, para fortalecer esse argumento, quero dizer que não é de hoje que se encontra nas mãos da administração pública o poder de planejar e de construir moradias populares longe de áreas de risco ou em áreas onde esse risco é calculado para que não provoque tragédias da dimensão que temos visto.
Com os instrumentos técnicos hoje disponíveis o poder público pode mapear as áreas de risco; executar obras de drenagem de modo a desviar o curso de águas que poderão atingir determinados maciços; e identificar as áreas mais suscetíveis a deslizamentos. O fato concreto, no entanto, é que o poder público só acorda para isso depois do fato consumado.
Mas não quero me ater unicamente ao poder público. Acredito que a Engenharia não deve ficar passiva diante da negligência da administração pública. Ela deve denunciá-la e possui estatura e estrutura para isso. É cômodo cobrar medidas do poder público, sem formular cobrança rigorosa, se possível, mostrando a desfaçatez de quem costuma deixar tudo como está para ver como é que fica. Porque o que fica é a angústia, a impotência, a dor sem tamanho.
Fonte: Estadão