Indústria do aço fica apreensiva com impacto da crise financeira global, mas a alta do dólar e a queda dos impostos podem ter efeitos compensatórios nos negócios
O impacto da crise financeira europeia, a desaceleração do crescimento da China e dos Estados Unidos e seus reflexos no Brasil fizeram a indústria do aço e áreas afins esfriarem as expectativas de desempenho este ano. O setor esperava um crescimento de 5% ou 6%, mas o cenário adverso deixa dúvidas sobre o desempenho da economia.
Um excedente de oferta de aço no mercado mundial de 500 milhões de t e a queda de consumo nos países desenvolvidos também contribuem para esse quadro preocupante, mas algumas medidas de redução de impostos e a alta do dólar podem estimular o setor no segundo semestre.
O crescimento do Produto Interno Bruto brasileiro no primeiro trimestre, de apenas 0,86%, confirma o fraco desempenho do setor produtivo, principalmente da indústria. A redução dos investimentos previstos é a mais imediata da crise.
Entre 1994 e 2010, as siderúrgicas investiram US$ 34,1 bilhões. Para os próximos anos estavam previstos investimentos de US$ 5 bilhões/ano, mas o cenário mundial fez com que as empresas do setor adiassem a implantação de novos projetos.
O presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, afirma que, diante das projeções macroeconômicas do País para 2012, estima-se o consumo aparente de produtos siderúrgicos em 26,4 milhões de t, o que representa um aumento de 5,4%.
“Estamos revisando esses números, mas isso não muda o fato de o mundo pós-crise ser muito mais complexo e competitivo, o que torna ainda mais importante preservar o mercado interno.”
Marco Polo adverte que o predomínio de produtos primários na nossa pauta de exportação pode levar a um processo de desindustrialização no País.
O Brasil, assim como os vizinhos da América do Sul, vem sentindo o aprofundamento da desindustrialização provocado pelo aumento das importações diretas e indiretas de aço, com reflexo direto no setor metal-mecânico.
A participação da indústria manufatureira no valor agregado caiu de 18,1%, em 2005, para 15,8%, em 2010, de acordo com dados divulgados pelo Sindicato das Empresas Distribuidoras de Aço (Sindisider).
O presidente do sindicato, Carlos Jorge Loureiro, observa que as indústrias estão deixando de comprar produtos fabricados aqui e preferem importar peças prontas. Mais de 60% das exportações da China para o Brasil são de produtos metal-mecânicos
Para Loureiro, a situação tem levado as siderúrgicas a trabalhar abaixo da capacidade instalada de 47,8 milhões de t/ano. “A ocupação chegou a superar 95% da capacidade, mas atualmente está abaixo dos 80%. A ArcelorMittal mantém desligado um dos três fornos porque não encontra mercado para seus produtos.”
Este esfriamento na produção fez a empresa – a maior fabricante de aço do Brasil – deixar na geladeira o plano de investir US$ 1,2 bilhão na ampliação da fábrica de Monlevade, em Minas Gerais, uma das mais antigas do País.
O grupo pretendia dobrar a produção de fio-máquina usado na fabricação de pregos, parafusos e arame. Benjamim Batista, executivo da holding que controla o grupo, disse recentemente acreditar em uma melhoria no segundo semestre devido às medidas adotadas pelo governo.
A geração de empregos também sofre os efeitos da desaceleração. O setor não costuma gerar muitos postos de trabalho, mas tem impacto em outros que o são. O boletim do Instituto Aço Brasil aponta que para cada emprego criado na indústria do aço são gerados outros 23 na cadeia produtiva. Se os produtos derivados do aço que foram importados em 2010 – um total de 5,9 milhões de toneladas – fossem produzidos no Brasil, teriam sido gerados 582 mil empregos.
Marco Polo de Mello Lopes, do Aço Brasil, frisa que o governo está atento ao problema. “O Senado corrigiu recentemente uma distorção grave na economia brasileira que prejudicava a produção e geração de empregos, aprovando o projeto que unifica em 4% a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em operações interestaduais com produtos importados.”
Apesar do temor de que a crise na Zona do Euro se alastre e contamine outros mercados, os representantes do setor siderúrgico brasileiro acreditam em uma recuperação no segundo semestre.
O otimismo baseia-se no anúncio de medidas de estímulo à economia que contemplam os setores de veículos e de máquinas e equipamentos, principais consumidores de aço longo no País.
O pacote do governo prevê renúncia fiscal de R$ 2,1 bilhões até agosto e inclui corte de alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para veículos e juros menores em linhas de financiamento do BNDES para bens de capital. A cotação do dólar a R$ 2 também deve ajudar a equilibrar o mercado, pois dificulta as importações, outro problema para o desempenho da siderurgia nacional.
Loureiro, que também é presidente do Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço (INDA), destaca que a alta nas vendas de veículos em maio ainda não foi suficiente para retomar as encomendas.
“As montadoras, principalmente de caminhões, continuam com os pátios lotados. Só vamos sentir o efeito das medidas um pouco mais para a frente, quando houver aceleração da produção e novas encomendas.”
A indústria automotiva, responsável por 30% do consumo de aço do país, amargou uma queda de 10% na produção, entre janeiro e abril. Mas os números de maio já indicam aumento nas vendas de veículos.
Em declarações recentes, o empresário André Gerdau Johannpeter, presidente do maior grupo brasileiro de aço e número um nas Américas na produção de aço longo, apontou o crescimento dos EUA como a boa notícia do momento.
Ele disse que o melhor desempenho da economia norte-americana não acontece na velocidade que todos gostariam, “mas é gradual e constante”.
“As medidas tomadas pelo governo de estímulo ao consumo, redução de imposto para os automóveis e aumento de prazo para financiamento a imóveis, devem causar melhorias no desempenho econômico no segundo semestre”.
Alguns projetos anunciados recentemente animam o setor siderúrgico. O Grupo Açotubo planeja investir R$ 42 milhões (US$ 20,7 milhões) este ano na modernização de unidades já existentes e na implantação de uma nova planta em Minas Gerais.
A nova instalação de R$ 12 milhões (US$ 5,9 milhões), em Contagem, (Grande Belo Horizonte), atenderá a demanda dos estados do Norte, Nordeste e parte do Centro-Oeste a partir de fevereiro de 2013. A fábrica vai processar aços especiais para aplicação no setor de petróleo e gás.
Os planos de investimento preveem também a modernização de um centro de distribuição em Minas Gerais, orçado em R$ 18 milhões (US$ 8,8 milhões). A Açotubo tem sede em São Paulo e filiais na Bahia, no Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
A metalúrgica Metasa anuncia investimentos em duas novas plantas no Rio Grande do Sul, localizadas nas cidades de Charqueadas e Rio Grande. De acordo com a direção do grupo, o objetivo é iniciar a produção de estruturas em Charqueadas até janeiro de 2013. Para a unidade de Rio Grande, a Metasa ainda não divulgou o cronograma de implantação.