A primeira grande enchente ocorrida em São Paulo-SP ocorreu em 1850, logo depois que o rio Tamanduteí foi retificado. Depois vieram outras, tanto em São Paulo quanto em diversas regiões do mundo. E, hoje, a cada ocorrência do gênero, mais se constata que tais eventos, incluindo os tsunamis, tempestades tropicais devastadoras e as fortes nevascas, vêm acompanhados de maior poder de destruição.
As explicações científicas são múltiplas: o mundo se urbanizou e queima milhões de t de combustível fóssil; grandes obras alteraram o equilíbrio nas cidades e no campo e os recursos naturais disponibilizados para a vida humana estão se exaurindo. Resumindo: a camisa de força que se tenta colocar na natureza resulta em mudanças climáticas de tal ordem, que as tragédias, de que o mundo é testemunha, vêm se multiplicando.
As previsões, por conta das mudanças climáticas, não têm nada de otimistas. Fala-se em desertificação, mais enchentes, derretimento de geleiras, ciclones e, no rastro dessas ocorrências, a propagação de doenças transmitidas pela água. A acreditar-se nas informações que se difundem como profecias apocalípticas, até 2020 – portanto dentro de um horizonte muito curto – 250 milhões de pessoas, somente no continente africano, estarão convivendo com a maior escassez de água.
Para se observar a situação de calamidade provocada por fenômenos naturais, sequer é necessário ir muito longe. Aqui mesmo, na maior cidade do País, São Paulo, a população de vários bairros da zona leste passaram quase dois meses debaixo de água e de esgoto, situação que levou a 4ª Vara da Fazenda Pública, acionada pela Defensoria Pública do Estado, a determinar que a prefeitura drene o local e deixe-o em condições minimamente satisfatórias para os moradores, num prazo de 30 dias.
Essas mudanças, adicionado o problema que o geógrafo Aziz Ab´Saber chama de periodicidade do El Nino, com ocorrências, segundo ele, registradas de 12 em 12, 13 em 13 ou de 26 em 26 anos, devem constituir um alerta para a engenharia e para as administrações públicas em todo o mundo.
Elas vão indicar a maior necessidade de planejamento de longo prazo; maior cuidado no detalhamento de obras rodoviárias, ferroviárias, portuárias, extensivo ao planejamento das grandes barragens e às obras urbanas, em especial aqueles que mexem com o subsolo das metrópoles. Haverá maior necessidade das análises científicas a partir das sondagens e dos estudos da geologia e da engenharia geotécnica. Da mesma forma como será preciso estudar os materiais, os novos equipamentos que venham a ser utilizados na interferência da natureza e nas edificações de toda sorte, sobretudo aquelas destinadas a abrigar multidões. Há de se prever as grandes cheias que extravam dos rios para as várzeas, destruindo tudo, inclusive pontes e viadutos e encostas saturadas que deslizam interrompendo rodovias ou soterrando áreas urbanizadas.
O geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, ao lançar, há algum tempo, em São Paulo, o livro Diálogos Geológicos, diz que a Terra aparentemente não aceita mais, de cabeça baixa, que o homem continue a depredá-la e a arruinar os seus recursos naturais. As mudanças climáticas sinalizam que é chegada a hora de a Engenharia e de outras atividades necessárias à sobrevivência e ao desenvolvimento humano, começarem a dialogar com ela. Antes que seja tarde.
Fonte: Estadão