Engenharia recoloca em dia ponte de 2.550 m sobre o Paraná

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Em meados dos anos 1960, a ponte Maurício Joppert, então considerada a maior do País, surpreendeu os meios técnicos pelo arrojo construtivo. Hoje, volta a surpreender pelos cuidados com que foi recuperada, modernizada e devolvida ao tráfego

Nildo Carlos Oliveira

Foi um trabalho técnico minucioso, às vezes quase artesanal, mas realizado com a delicadeza que a estrutura histórica merecia. Ventos fortes e temperatura elevada, que poderiam influenciar nos serviços de concretagem; a manutenção do tráfego, nos limites que as circunstâncias exigiam; e a descoberta de que mexihões-dourados, oriundos da Ásia, estavam grudados em alguns tubulões e deveriam ser removidos, foram algumas das causas que mudaram a rotina das operações.

A ponte Maurício Joppert, hoje Hélio Serejo, em homenagem a um dos defensores da construção da travessia, foi projetada, calculada e construída com concreto protendido pela empresa Sérgio Marques de Souza S. A. — Engenharia e Comércio, contratada, para esse fim, pelo antigo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER). Ela resultou do atendimento a constante reivindicação dos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.

Antes que a ponte fosse construída, a travessia, naquele trecho do rio Paraná, pela então BR-34, entre os municípios de Presidente Epitácio, lado paulista, e Bataguassu, lado sul-mato-grossense, era feita por balsa, um serviço que ficava a depender da inconstância das águas e da força do vento. Por ali se cruzavam também comboios de barcaças de grande porte, que transportavam madeira e outros produtos, a caminho do porto de Presidente Epitácio, então o segundo maior porto fluvial do País.

Pelos dados da empresa projetista, ela foi concebida com dois encontros de 15 m de extensão implantados nas margens; com 35 m de vãos de 45 m, vencendo o canal junto à margem, do lado paulista, a Ilha Tibiriçá e o trecho alagado da margem de São Paulo; com sete vãos de 112,50 m no canal principal e dois vãos de 78,75 m estabelecendo a concordância entre os trechos com vãos de 45 m e 112,50 m.

A estrutura dos vãos de 45 m é formada por quatro vigas pré-moldadas de concreto protendido, com 2,60 m de altura e 15 cm de alma; já a estrutura dos vãos de 112,50 m, também de concreto protendido, é constituída pela associação de balanços duplos com um comprimento livre de 30 m e vigas pré-moldadas de 45 m de comprimento.

Os tubulões nas margens de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Ilha Tibiriçá foram cravados diretamente no terreno, em elementos de 4 m a 6 m de comprimento, emendados na medida em que se processava a cravação. Para as fundações no leito do rio, foram fabricados em solo, com comprimento especificado, e transportados para o sítio de aplicação por um flutuante equipado com uma torre e guincho de 100 t de capacidade. A cravação ocorreu com o emprego de ar comprimido.

Depois de entregue ao tráfego, em agosto de 1965, a ponte Maurício Joppert inaugurou nova fase para o escoamento da produção agrícola regional, uma vez que apressava o transporte de produtos até a fronteira com o Paraguai e a Argentina. Contudo, o tempo passou e a falta de manutenção periódica, agravada pelo desgaste natural e pela ação das intempéries, levou aquela importante estrutura a uma situação de risco. Por conta disso, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), que substituiu o DNER, tomou a iniciativa de recuperá-la – um trabalho iniciado em 2011.

O projeto executivo de engenharia para a recuperação ficou a cargo da empresa Portante Engenharia de Projetos e os serviços foram colocados à responsabilidade da Concrejato, contratada para realizar, além da recuperação, a substituição do piso de concreto, com uma diferença: ela deveria atualizar os padrões da estrutura na conformidade das condições atuais de tráfego, uma vez que hoje ele é feito por caminhões mais rápidos, maiores e com maior capacidade de carga. A capacidade no trecho é para até 45 TB hoje, o que justificou a opção da construção de um piso de concreto armado, para funcionar como uma sobrelaje.

As obras de recuperação

Os engenheiros Ronaldo Ritti e Maria Aparecida Soukef Nasser, respectivamente diretor e gerente de obras especiais da Concrejato, informam que a empresa foi contratada não apenas para realizar os serviços de recuperação, mas para também substituir o piso de concreto, adequando-o às novas solicitações de tráfego e peso. E a execução da obra teria de combinar as diversas interfaces à impossibilidade, absoluta, da interrupção do tráfego, prevista inicialmente para o período noturno.

Tais condições impuseram à contratada ajustar uma logística para que a ponte continuasse a funcionar por 24 horas. E todos os trabalhos deveriam levar em conta procedimentos capazes de evitar patologias decorrentes de vibrações durante a execução do pavimento. Assim, os cuidados técnicos transcenderam àqueles recomendados no projeto de recuperação, prevendo um tempo maior para a cura úmida pós-concretagem.

O piso antigo, desgastado, passou a ser removido. Foram feitas a limpeza e a retirada dos resíduos, deixando-se a superfície da laje apicoada e pronta para receber o novo pavimento, desta vez de concreto armado. E, para garantir que o piso passasse a funcionar com uma sobre laje, foi prevista a instalação de grampos de aço na interligação da estrutura existente, usando-se telas de aço na armação do concreto.

Novas linhas de grampos foram ali colocadas para melhorar a ligação entre os pisos e reduzir o efeito da vibração ocasionada pelo tráfego contínuo. Para tornar melhor o acabamento final, a Concrejato dispensou o uso de réguas vibratórias, recomendado no projeto, e, sob a orientação e consultoria da Concremat, executou aquele serviço com acabadoras Gomaco C 450. Essa operação foi monitorada a cada 100 m do chamado “Quociente de irregularidade longitudinal (QI)”. O vassouramento posterior garantiria a melhor aderência, para segurança dos usuários da ponte.

A engenheira Maria Aparecida Soukef diz que a Concremat Laboratório responsabilizou-se pelo acompanhamento do controle tecnológico do concreto, desde o fornecimento e controle do traço e ensaios granulométricos de materiais, até a emissão de relatórios com os resultados obtidos.

E, de repente, os mexilhões

Um dado que chegou a provocar 30 dias de atraso no processo da recuperação, mas que não deixa de ser curioso, ocorreu na execução de reforço da
infraestrutura, quando se recorreu ao uso de formas especiais e aplicação de groute. Esse trabalho exigiu a mão de obra de uma equipe subaquática.

A equipe especializada preparava-se para começar os reparos dos tubulões dos pilares 20 e 21, quando identificou mexilhões-dourados (o nome científico é Limnoperna fortunei) agarrados nas peças de concreto. Os técnicos tentaram removê-los à mão, mas isso, logo se comprovou, seria uma operação muita lenta.

Pela pesquisa que a empresa realizou, os moluscos devem ter surgido na bacia hidrográfica do Alto Paraná ali por volta do ano 2002. Possivelmente teria aparecido por conta de um princípio de cultivo no local. Como a operação aparentemente não deu certo, eles foram abandonados e começaram a se multiplicar. O fato é que eles não poderiam continuar ali, pois os reparos nos pilares teriam de ser realizados. O jeito foi utilizar jatos d´água para desalojá-los.

Outros serviços

Barreiras New Jersey. O projeto previa um acréscimo da pista, mas, por causa da impossibilidade de realocação dos cabos elétricos, isso não pôde ser feito. Por isso, as barreiras de proteção de concreto, New Jersey, foram instaladas ao longo dos 2.550 m da ponte, faceando a canaleta existente. Houve também a colocação de novo gradil metálico fixado sobre as barreiras. As defensas metálicas foram projetadas depois e inseridas nas cabeceiras da ponte.

Juntas de dilatação. As juntas antigas foram substituídas. As novas acompanham o piso novo e garantem a movimentação estrutural e a estanqueidade previstas. Foram realizadas também a recuperação dos pilares e a troca de aparelhos de apoio. A empresa utilizou treliças metálicas para garantir o acesso e a segurança dos colaboradores na realização desses trabalhos.

A ponte, com pintura de pista, drenagem, sinalização e serviços adicionais, está modernizada e segura, segundo a Concrejato. Está apta ao tráfego, mas, pela sua história e pela importância da função dos seus 2.550 m sobre o Paraná, para a economia dos dois estados, vai requerer a atenção pública para que sempre seja objeto de manutenção periódica.

Ficha técnica

Obra: Ponte Maurício Joppert

Cliente: Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit)

Tipo de intervenção: Recuperação

Local: BR-267/MS, divisa com SP

Ano da obra: 2011/2012

Empresa contratada: Concrejato

Apoio: Laboratório Concremat

Principais parceiros: Pentagrama (pisos); Salioni (concreto); Qualiserv (Demolição); Uniontech (Juntas de dilatação)

Quantitativos

Volume de demolição: 5.488,60 m³

Volume de concreto: 6.240,66 m³ (infra, meso, super e New Jersey)

Quantidade média de funcionários da obra: 70 colaboradores

Volume de aço utilizado: 404.010,23 kg (infra, meso, super e New Jersey)

Pintura Guarda-Corpo: 5.100 m (existente)

Guarda-Corpo (passeio): 5.100 m (fabr., instalação e pintura)

New Jersey: 5.100 m

Apicoamento: 27.999,00 m²

Fonte: Revista O Empreiteiro


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