Por dentro da gestão de resíduos de obra: da geração à destinação final

Por dentro da gestão de resíduos de obra: da geração à destinação final

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O desafio invisível dos canteiros

Todo canteiro de obras é uma máquina de geração de resíduos. Concreto, gesso, madeira, plástico, metais, papelão — a diversidade de materiais e embalagens torna a gestão um processo complexo.
Segundo o IBGE (Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2023), o setor da construção civil é responsável por cerca de 60% dos resíduos sólidos urbanos gerados no país.

Com o avanço das políticas de sustentabilidade e o endurecimento da legislação ambiental, a gestão de resíduos de obra deixou de ser um item opcional para se tornar parte essencial do planejamento construtivo.


O que é gestão de resíduos de obra

A gestão de resíduos de obra é o conjunto de ações que envolvem o planejamento, coleta, triagem, transporte, reaproveitamento e destinação final de todos os materiais descartados durante as etapas de construção, reforma ou demolição.

Ela segue as diretrizes da Resolução CONAMA nº 307/2002, que classifica os resíduos da construção civil (RCC) em quatro grupos:

ClasseDescriçãoExemplo de materiais
AReutilizáveis ou recicláveis como agregadosConcreto, argamassa, tijolos, telhas
BRecicláveis para outras destinaçõesPlásticos, metais, papel, vidro, madeira
CSem tecnologia viável de reciclagemGesso, lã de vidro, isopor
DPerigososTintas, solventes, óleos, amianto

1. Planejamento: o primeiro passo

Uma gestão eficiente começa antes da primeira pá de concreto.
Na fase de projeto, o Plano de Gerenciamento de Resíduos da Construção Civil (PGRCC) define:

  • Tipos e quantidades estimadas de resíduos a serem gerados;
  • Pontos de armazenamento temporário;
  • Parcerias com transportadores e recicladoras;
  • Responsabilidades da equipe técnica e de campo.

Empresas que planejam o PGRCC desde o início reduzem em média até 40% do volume de descarte e 15% dos custos de transporte e destinação, segundo o SindusCon-SP.


2. Coleta e armazenamento no canteiro

Durante a execução, os resíduos devem ser separados por tipo e classe.
A triagem pode ser feita em baias sinalizadas, com caçambas ou contêineres específicos para cada material.

Boas práticas incluem:

  • Separação de resíduos limpos (sem contaminação) para reaproveitamento;
  • Evitar mistura de resíduos perigosos com materiais recicláveis;
  • Registrar volumes coletados e destinos no controle de rastreabilidade.

Empresas como MRV Engenharia, Tenda e Direcional já utilizam softwares de monitoramento de resíduos, integrados aos sistemas de gestão de obras (ERP e BIM).


3. Transporte e rastreabilidade

A logística reversa é parte essencial do processo.
O transporte deve ser feito por empresas credenciadas junto aos órgãos ambientais municipais, com documentos de controle de transporte de resíduos (CTR).

Ferramentas digitais permitem rastrear o resíduo desde o canteiro até a unidade de tratamento — um diferencial para auditorias ESG e certificações como LEED e AQUA-HQE.


4. Reciclagem e reaproveitamento

Grande parte dos resíduos de obra pode voltar à cadeia produtiva.
Exemplos de práticas adotadas no Brasil:

  • Britagem de concreto e alvenaria para uso como base e sub-base de pavimentos;
  • Reaproveitamento de madeira em fôrmas, paletes e mobiliário;
  • Reciclagem de metais e plásticos para insumos industriais;
  • Reuso de água de lavagem de betoneiras em processos de cura.

O SindusCon-SP estima que até 70% dos resíduos classe A podem ser reaproveitados ou reciclados quando há gestão adequada.


5. Destinação final e conformidade ambiental

Os resíduos que não têm potencial de reaproveitamento devem ser enviados a aterros licenciados ou usinas de reciclagem credenciadas.
A correta destinação é comprovada por meio de:

  • Manifestos de transporte (CTR eletrônica);
  • Certificados de destinação final (CDF);
  • Relatórios ambientais periódicos.

Empresas que negligenciam o processo estão sujeitas a multas ambientais e embargos de obra previstos na Lei Federal nº 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos).


6. Inovação e tecnologia na gestão de resíduos

Nos últimos anos, surgiram startups e soluções digitais que modernizam o controle de resíduos:

  • ResiduALL e e-CTR: sistemas de emissão e rastreamento de manifestos;
  • Smart Waste: sensores IoT em caçambas para monitorar volumes e rotas;
  • Construclean: plataforma que conecta construtoras a recicladoras certificadas.

Além disso, construtoras estão adotando modelagem BIM 5D para simular o volume de resíduos antes da execução, reduzindo desperdícios já no planejamento.


7. Canteiro sustentável: o futuro da construção

A gestão de resíduos de obra tornou-se um dos pilares das construções sustentáveis.
Empreendimentos certificados pelo LEED, AQUA-HQE e EDGE já exigem controle documentado e destinação correta de resíduos.

Além dos benefícios ambientais, há ganhos econômicos e reputacionais: obras mais limpas, menor custo com aterros e valorização da marca junto a investidores e compradores.


Da geração ao destino final, a gestão de resíduos de obra é um ciclo que exige planejamento, tecnologia e responsabilidade ambiental.
O setor da construção brasileira avança rumo a canteiros mais inteligentes, com controle digital e reaproveitamento de materiais.
A próxima década deve consolidar o conceito de “obra de impacto zero”, onde nada se perde e tudo se transforma.


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