Nos planos da Raízen, uma das maiores produtoras de derivados da cana-de-açúcar do mundo, está a operação de 20 novas plantas de etanol de segunda geração (E2G), também chamado de etanol verde, bioetanol ou etanol celulósico, até 2031. Para essa iniciativa a empresa reservou R$ 24 bilhões. Duas usinas tiveram as obras recentemente iniciadas no interior paulista. Uma das novas plantas é anexa à Usina Vale do Rosário, em Morro Agudo, e a outra na Usina Gasa, em Andradina. As unidades vão exigir aportes de R$ 2,4 bilhões. Cada uma terá capacidade para produzir 82 mil m3 de E2G por ano.
Atualmente, essas plantas estão na fase de contratação da terraplanagem. Com essas duas novas usinas em construção, a Raízen terá agora cinco obras de E2G em andamento, todas no Estado de São Paulo. Bomfim (em Guariba), prevista para ser entregue ainda neste ano; Univalem (em Valparaíso) e Barra (em Barra Bonita) devem ser inauguradas no próximo ano. Já as plantas de Gasa (Andradina) e Vale do Rosário (Morro Agudo) têm conclusão prevista para 2025. A obra mais adiantada é da unidade de Bonfim, que terá 71 mil m2 de área construída. Nessa planta, está sendo finalizada a montagem de equipamentos, conexões e de toda parte de instrumentação.
A próxima etapa será o comissionamento da planta. Nas obras das unidades de Barra e Univalem, estão sendo construídas as fundações dos prédios. Já as plantas Gasa e Vale do Rosário estão na etapa de terraplenagem e drenagem de águas pluviais. As obras têm um mix de estruturas pré-moldadas nas edificações, fundações e blocos moldados in loco e na parte industrial quase que 100% metálica.
“Raízen estima que, até 2031, após todas as unidades serem inauguradas, a capacidade instalada de produção anual será de aproximadamente 1,6 milhão de m3 de E2G”, revela Ozanan Pessoa, diretor de Projetos Renováveis da Raízen. Desde 2015 a Raízen produz E2G no bioparque Costa Pinto, localizado em Piracicaba (SP). É a maior planta de E2G do mundo, informa Pessoa, lembrando que o terceiro trimestre do ano safra 2022-2023 encerrou com 8 mil m3 produzidos e comercializados no período, e recorde de 30 mil m3 no acumulado da safra.
Segundo o executivo, todo o processo para que se extraia o etanol de segunda geração requer procedimentos altamente tecnológicos de pré-tratamento da biomassa, hidrólise e posteriormente fermentação. “A cada ano, inevitavelmente, surgem novas pesquisas e investimentos em tecnologias para alavancar esse biocombustível, que é muito importante para o setor sucroenergético e para a economia brasileira”, diz.
O etanol de segunda geração é um biocombustível avançado, feito a partir dos resíduos restantes do processo de fabricação do etanol comum (o de primeira geração, E1G) e do açúcar. “É um produto que usa matéria-prima de baixo impacto ambiental que seria descartada e que tem excelente ganho logístico.
O E2G tem uma pegada de carbono 30% menor quando comparado ao de primeira geração, e até 80% menor do que combustíveis fósseis, como a gasolina”, frisa Pessoa. Por ser fabricado a partir de resíduos como bagaço e palha de cana-de-açúcar, o E2G aumenta em 50% o potencial de produção de biocombustíveis, sem a necessidade de aumentar a área cultivada.
Segundo o diretor da Raízen, por utilizar como matéria-prima subprodutos do etanol comum, o etanol de segunda geração proporciona maior aproveitamento energético da cana-de-açúcar, o que resulta em uma maior eficiência agrícola. A produção de E2G acontece por um processo tecnológico de pré-tratamento da biomassa. As estruturas vegetais têm alguns compostos básicos: lignina, celulose, hemicelulose, cinzas e água.
A lignina é um composto estrutural de cadeia longa que confere rigidez à planta. Para que se possa produzir álcool, é necessário disponibilizar os carboidratos (celulose e hemicelulose) e, para isso, é necessário quebrar ou soltar a lignina dos demais compostos. Basicamente, o processo produtivo do E2G envolve três fases: pré-tratamento, quando a biomassa é tratada de forma que a celulose seja fracionada; hidrólise, que é a quebra da celulose e da hemicelulose em açúcares – glicose e xilose; e fermentação e destilação, que são etapas parecidas com o processo produtivo do etanol de primeira geração. A diferença é que a fermentação do açúcar xilose requer o uso de uma levedura geneticamente modificada.
Uma das inovações nas plantas de etanol de segunda geração mais recentes está relacionada ao tratamento de efluentes, como aponta Ozanan Pessoa. “Com a tecnologia de tratamento de efluentes para sua reutilização em 100% e sistema de tratamento de lignina para utilização também de 100%, focando na produção de valor e energia para o processo, a Raízen tornou o desenvolvimento da planta cerca de 50% mais eficiente energeticamente”, diz o diretor.
De acordo com Pessoa, toda carga orgânica gerada nos efluentes será tratada em biodigestores anaeróbicos, tornando, assim, a água tratada 100% reutilizável nos processos de pré-tratamento do bagaço de cana. Além da água, o biometano gerado a partir do procedimento tem sinergia com a planta de biogás existente no bioparque, permitindo potencializar a geração de energia. Joint-venture entre o Grupo Cosan e a Shell, “a Raízen é pioneira e única empresa do mundo a comercializar o etanol de segunda geração em escala global”, afirma o diretor.
A aposta em renováveis tem se revelado promissora para a companhia, sendo que a maior parte da produção das plantas de E2G em Morro Agudo e Andradina já está comercializada para diferentes clientes internacionais. Praticamente toda a produção do E2G é enviada para a União Europeia. “Os clientes do etanol celulósico da Raízen são, em geral, empresas que se preocupam com a descarbonização e que veem no E2G um produto premium, capaz de apoiá-los no atingimento de suas metas de sustentabilidade. A demanda contratada de E2G da Raízen já totaliza 4,3 bilhões de m3 comercializados por meio de acordos de longo prazo. Esse volume inclui o contrato que firmamos com a Shell em 2022, para fornecimento de 3,3 milhões de m3 de E2G até 2037”, salienta Pessoa.