Não há porque criticar o sentimento e as medidas práticas de solidariedade do governo brasileiro a países vizinhos, cuja população sofre os traumas de tragédias naturais, com mortes e prejuízos difíceis de serem calculados.
A solidariedade brasileira tem sido uma peculiaridade secular e tem sido vista quase como uma extensão de nossa razão de ser, conforme ocorreu recentemente no caso do Haiti e, agora, no terremoto do Chile.
Anteriormente ela já se manifestara em relação a outros países, senão por conta de tragédias, ao menos por conta de posição política que o governo gostaria de tornar uma marca registrada para efeito externo.
Aparentemente, também não haveria o que criticar na participação brasileira na construção da chamada Rodovia Bioceânica. Afinal, ela nasce aqui e, se por acaso se estende aos portos de Arica e Iquique, no Chile, cruzando depois, em sua maior parte, o território boliviano, promoverá a integração, que é sua finalidade principal. As vantagens econômicas futuras compensarão os investimentos brasileiros ali aplicados.
Da mesma forma justifica-se a construção da ponte Brasil-Bolívia, a ser construída com 1.220 m de extensão e 18 acessos, que vai transpor o rio Mamoré, entre as cidades de Guajará-Mirim e Guayaramerin, resultado de um acordo (ver decreto 6.858 de 25 de maio de 2009), pelo qual o governo brasileiro desembolsará, quase em sua totalidade, recursos da ordem de R$ 250 milhões.
"Brasileiro é tão bonzinho", dizem os que desejam criticar projetos desse tipo. Nada, no entanto, carece de crítica, nesse reconhecimento de que os povos, sejam em momentos trágicos, sejam em momentos de euforia até futebolística, merecem o abraço fraternal.
A crítica fica apenas por conta de nossas necessidades urgentes. O Brasil, com suas mil e tantas tragédias naturais passadas e recentes – sem que fosse mexida uma folha para atenuar os traumas que elas provocaram – e com a maioria de sua população na faixa da pobreza ou da miséria, e com uma geração de jovens prontos para pularem dos bancos universitários para o mercado de trabalho, e sem terem oportunidade para isso, também carece de solidariedade. Deste e dos próximos governos.
Fonte: Estadão