Luiz Fernando Pires faz reflexão sobre economia global e valores empresariais, e afirma que a
Mascarenhas está se diversificando para crescer, embora considere que em 2009
ela possa repetir –e até melhorar – o faturamento de 2008: R$ 410 milhões.
Os ciclos de crescimento são mutáveis. Por isso, são ciclos. Contudo, os valores que embasam o comportamento empresarial são permanentes. Por isso, são valores. O raciocínio é do empresário e engenheiro Luiz Fernando Pires em depoimentoreflexão a esta revista, quando a Mascarenhas Barbosa Roscoe S/A – Construções começa os preparativos para comemorar 75 anos de atividades na engenharia brasileira.
Ele começa a análise focando o cenário ciclicamente em alteração do País. Ingressou em empresa de engenharia, como estagiário, em 1970; formou-se em 1972 e viu, no período de 1970 a 1980, uma época de crescimento contínuo. Por conta dessa fase positiva, as oportunidades de trabalho surgiam com extrema velocidade e profissionais, com currículos invejáveis, podiam ser substituídos sem traumas, porque o ambiente favorecia essas possibilidades.
Mas nos anos de 1980 a 1994 as coisas mudaram. O crescimento ficou reduzido e, em algumas áreas, praticamente estagnado. Então, deixou-se de contar com oportunidade para a formação e renovação de quadros. Muitos engenheiros migraram para segmentos diversos – órgãos públicos, estabelecimentos bancários, áreas sindicais e muitas outras.
O ensaio de uma melhoria começou em 1994. As empresas, no geral, voltaram a ter alguma oportunidade para crescer e se sentiram dispostas a voltar a treinar estagiários, em especial engenheiros recémformados. "Àquela altura", diz Luiz Fernando Pires, "sabíamos que, em havendo algum crescimento, algum aquecimento da demanda em serviços de engenharia, haveria falta de pessoal qualificado: faltaria pedreiro, carpinteiro e pessoal de nível técnico e engenheiro, até mesmo para as funções de gerência".
À frente da Mascarenhas, ele cuidou de preparála para aquele e outros ciclos, até 2008. Nesse e no ano anterior, assistiu a uma aceleração muito expressiva do crescimento brasileiro. Sentiu que aquele nível de crescimento talvez estivesse além da capacidade de sustentação da realidade. O País não tinha uma infraestrutura adequada àquele crescimento muito rápido. Nesse período registrava-se acirrada disputa por profissionais. E começaram a faltar máquinas e equipamentos. Caminhões eram entregues com atraso. Guindastes e tratores demoravam até seis meses para serem entregues.
Para complicar esse cenário e colocar tudo às avessas veio o evento deflagrado em setembro daquele ano: a crise global, iniciada a partir da quebradeira de bancos nos Estados Unidos. Como, hoje, as economias são intimamente interligadas e os modernos meios de comunicação transmitem as informações simultaneamente para todas as partes do mundo, a propagação da crise foi imediata. E traumática.
Difícil, na ocasião – e ainda hoje – dimensionar, com precisão, o impacto de tudo aquilo. Os efeitos se traduziram na redução das atividades produtivas no mundo todo. A esperança, agora, é que a economia, abalada em toda a sua estrutura, assente-se em eventual ponto de equilíbrio, a fim de que seja retomado o processo de crescimento. Especula-se quanto a isso em todos os lugares. Quando haverá a retomada? Quais os fatores que vão balizar, ordenar esse processo? Por ora, ninguém, com um mínimo de responsabilidade e prudência, arrisca um palpite.
Os economistas se assanham. Cada um tem a sua previsão. Alguns dizem que o Brasil voltará a crescer 4%; depois esse índice desce para 3% e até para 2%. E já andam dizendo que o crescimento não excederá a 1,5%.
Concretamente, o que está acontecendo nesse primeiro trimestre de 2009, na visão do engenheiro e presidente da Mascarenhas, é o seguinte: no segmento em que a empresa atua há longos anos – obras civis industriais – alguns empreendimentos foram mantidos e estão sendo tocados; os empreendimentos que se encontravam em andamento, continuam; novos empreendimentos estão começando, dentro das programações que já estavam elaboradas desde o ano passado. Contudo, diversos foram adiados e aqueles empreendimentos novos, que estavam sem programação, não puderam ser iniciados. Alguns estão paralisados. As paralisações, no caso da Mascarenhas, são exceções, mas são indício de que está havendo um processo de reacomodação do mercado.
OS VALORES PERMANECEM
Em sua primeira análise, no contexto da Mascarenhas, ao final deste primeiro trimestre, Luiz Fernando Pires considerou a probabilidade de um faturamento menor do que aquele obtido em 2008, quando a previsão fora a de faturar R$ 410 milhões. Levando em conta os empreendimentos em andamento, em
especial o contrato assinado com a Vallourec & Sumitomo, para o conjunto das obras civis da Laminação e da unidade de fabricação de tubos na região de Jeceaba-MG, ele começa a acreditar que 2009 poderá repetir o faturamento de 2008 e até obter algum crescimento adicional.
Nesse cenário, não deverá significar, em princípio, a redução de quadros. Até hoje, segundo ele, não foi demitido nenhum funcionários dos quadros permanentes. Entre engenheiros, técnicos e outros funcionários nesse nível houve redução apenas nos casos de obras que foram concluídas ou paralisadas. Houve dispensa de mão-de-obra local, mas não na administração. E a política da empresa continua a de estímulo à criação e manutenção de quadros.
"Entendemos que o processo de renovação da empresa é permanente. Temos de contratar novos funcionários, pois a diretoria vai cumprindo os seus ciclos e precisa de reciclagem e renovação. E nosso propósito é assegurar a possibilidade de sucessão, para nos renovarmos".
Sobre esse processo de mudança e renovação, o presidente da Mascarenhas tem um raciocínio claro: é da natureza das empresas e da natureza humana, a vontade de mudar. No começo de 2008, quando o mercado de obras estava muito aquecido, bastava que uma empresa oferecesse alguma vantagem, mínima que fosse, para que um engenheiro ou outro profissional tentasse de imediato migrar de uma empresa para outra.
Luiz Fernando Pires participou de um treinamento de mão-de-obra com pessoal do nível de gerência, até estagiários, e mostrou que os ciclos da vida são mutáveis, porque são ciclos. Já os valores, de uma empresa ou da sociedade, são permanentes porque são valores. Dentre os valores que ele preza e difunde em sua empresa estão o respeito, o foco nos relacionamentos, a simplicidade (poucos níveis hierárquicos), melhoria contínua (busca permanente pela evolução nos métodos, processos e novas tecnologias), sustentabilidade e comprometimento.
MANTER A EVOLUÇÃO NA ENGENHARIA
Evolução na engenharia significa investimento na formação e manutenção de equipes e investimentos em máquinas, equipamentos e em novas tecnologias. "Quanto a isso, temos cumprido todos os propósitos. Investimos em equipamentos novos, nacionais ou importados e na tecnologia disponível, esteja ela onde estiver. Da mesma forma como investimos em pessoas".
Ele diz que hoje a engenharia da empresa tem evoluído em todos os seus processos. Cita o exemplo do concreto, cuja aplicação é muito mais mecanizada do que há alguns anos. O mesmo ocorre com o processo de execução da concretagem. Os painéis de fôrmas são mais padronizados, e a dobra do aço é feita com maior rigor, mediante automação. Obra industrial de alto nível, a exemplo daquelas de responsabilidade da empresa, requer elevada tecnologia na engenharia.
"Hoje há três dados fundamentais na construção, sobretudo, obra industrial: o processo de verificação da qualidade é muito rigoroso; o processo de segurança e medicina no trabalho tem de ser transparente e absolutamente eficiente e a questão ambiental está embutida nos procedimentos. Os clientes (contratantes) não assinam os contratos antes que esteja adequadamente definida a questão da destinação dos resíduos resultantes da obra".
E há um pormenor interessante na reflexão do empresário: há as responsabilidades que já se encontram incorporadas na lei – as NRs – a que ninguém pode fugir e que precisam de serem obedecidas; e há aquelas responsabilidades que hoje se encontram enraizadas na consciência da sociedade. As normas, por exemplo, não prevêem a instalação e manutenção de escolas nos canteiros das obras; não prevêem programa de ginástica laboral antes do início das atividades diárias; também não prevêem determinadas atividades de lazer em alojamentos. "Mas nós adotamos programas com essas finalidades; as escolas, para melhorar o aprendizado; a ginástica laboral para que professores mostrem ser possível o exercício do pessoal em determinadas tarefas. Sem isso, o trabalhador pode estar mais vulnerável a problemas de coluna ou de algum acidente. E adotamos a atividade de lazer, para evitar, nos alojamentos, os problemas decorrentes do ócio ou do absenteísmo".
DIVERSIFICAÇÃO
Diversificar, para o presidente da Mascarenhas, não significa perder o foco das atividades centrais, mas encontrar meios para perpetuá-los. Ele cita um ditado inglês: "Nunca ponha todos os ovos num único cesto". Em especial num país marcado por mudanças e ciclos de crescimento, nada mais natural do que optar pela diversificação.
E a empresa fez essa opção. Tem um contrato de concessão na área de estacionamento e já assinou um contrato para fazer uma ligação viária – um túnel entre dois bairros de Niterói-RJ – o primeiro passo para explorar a concessão daquela travessia. A empresa aguarda apenas a liberação do licenciamento para começar a construção do túnel.
Ao mesmo tempo, ela estuda a participação, em consórcio com outras empresas, em concessões na malha rodoviária de Minas Gerais. A malha, administrada pelo Estado ou pelo governo federal, precisa das condições de operação eficiente das empresas privadas para se modernizar, a exemplo do que já acontece com as rodovias em São Paulo, considerada as melhores do País.
Além disso, a Mascarenhas constituiu uma empresa somente de máquinas e equipamentos. A empresa líder do grupo continua no leito natural de suas atividades (obras civis industriais), enquanto outra, a ETS – Engenharia, Tecnologia e Serviços Ltda, administra a aquisição e locação de equipamentos. Ela adquiriu os equipamentos da Mascarenhas e começou a disponibilizá-los também para o mercado. A primeira meta da ETS era conseguir 50% de faturamento fora dos limites da Mascarenhas. Segundo Luiz Fernando Pires, ela já alcançou essa meta.
O FUTURO DA EMPRESA
"O empresário é invariavelmente corajoso; senão, não seria empresário", diz Luiz Fernando Pires. E, como o empresário está sujeito a constantes sustos e trovoadas, em razão das alterações constantes dos ciclos econômicos, precisa, necessariamente, de atuar organizadamente. Por isso, além de presidir a Mascarenhas Barbosa Roscoe, ele é vicepresidente do Sinduscon-MG, o que o está ajudando no tratamento de problemas da categoria dos engenheiros, através da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), junto a instânc
ias públicas ou privadas.
Quanto às perspectivas para a empresa, entende que elas são boas. A Mascarenhas está preparada e equipada para realizar as obras mais avançadas em sua área de atuação, considerando que, embora o País tenha um parque industrial consistente, ainda produz tão-somente 5% da produção mundial de aço. Isso é muito pouco, em especial se for levado em conta o fato de que o Brasil exporta quase 50% de minério do mundo. Há, portanto, nesse segmento, um espaço muito amplo para crescer. Matéria-prima e tecnologia. Nesses dois pólos, há uma contradição: o Brasil exporta muita matéria-prima, ao mesmo tempo em que tem potencialidade para exportar aviões de última geração.
"Sim", diz Luiz Fernando, chegando ao fim de sua reflexão, "temos nossa experiência e entendemos que, sob esse aspecto, podemos nos considerar um exemplo. Um exemplo para os nossos profissionais, para os nossos sucessores e para o País".
Fonte: Estadão