O preço que o governo garante hoje, para tornar viável uma obra pública, jamais será o mesmo originalmente anunciado. Os argumentos são vários, alguns até compreensivelmente aceitáveis, mas todos merecedores de questionamentos. É que, na raiz das mudanças já subsiste a esperteza, já está embutido o jeitinho brasileiro de mostrar que, por aqui, uma coisa jamais será a mesma coisa.
Falo isso referindo-me a duas obras futuras: a usina hidrelétrica de Belo Monte e o trem de alta velocidade RJ-SP.
No caso de Belo Monte, o governo resolveu adotar um aumento de 22% no preço máximo originalmente previsto a ser cobrado pela energia. As razões que justificariam o aumento centram-se no custo extra das exigências para o licenciamento ambiental da obra e aos ajustes para tirar o projeto do papel. A proposta é de que a tarifa máxima para o leilão seja de R$ 83,00, valor R$ 15,00 a mais do que aquele inicialmente acertado.
Difícil imaginar que o governo, ao anunciar o valor original, não soubesse que ele seria objeto de variações futuras. A prática de mostrar um preço, para depois cobrar outro, tem sido usual para remover obstáculos iniciais e atender a reivindicações de grupos interessados.
Com a tarifa do trem de alta velocidade acontece algo talvez mais grave, se a mudança vingar. Aqui, o que há é uma alteração nas regras. O governo adotará uma tarifa-teto para a chamada classe econômica e liberará as demais, a fim de que o preço das passagens do trem tenha alguma equivalência com o preço das passagens de avião. No fundo, são ajustes dos segmentos interessados na obra, aos quais o governo se rende, aparentemente com alguma comodidade.
Manipulação
Em discurso, em Itaboraí, o presidente Lula da Silva, com Dilma a tiracolo, disse que os que defendem investimentos em metrôs e trens querem que "o pobre deixe a rua livre para eles". Está aí uma manipulação que seria cômica, não fosse ridícula.
Fonte: Estadão