São dois assuntos diversos e, conquanto quilometricamente distantes um do outro, ajudam a ilustrar essa mentalidade obstinadamente medíocre que está na raiz do autoritarismo dos que, ressalvadas as exceções, conquistam alguma escala de poder, no País.
Está aí o caso desse delegado de São José dos Campos que ocupou uma vaga de estacionamento reservada, na rua, a deficientes físicos e, de quebra, agrediu um cadeirante que ousou fazer-lhe reclamação.
Fatos idênticos ocorrem em outros lugares, sobretudo em shopping centers. Um dia desses reclamei da ocupação irregular de uma vaga destinada idosos a um "segurança" do estabelecimento e ele me segredou, apreensivo, tratar-se de "gente grossa", com quem não deveria mexer.
Aí, vem essa questão dos cartões de crédito corporativo. É de imaginar-se que os detentores do poder de usá-los, lá no topo do governo federal, os estarão utilizando de modo adequado, legítimo, na cobertura austera de gastos realizados nos limites dos quefazeres funcionais. Mas, se os estão usando com essa crosta de austeridade, por que o sigilo?
Está na memória de muita gente – e isso ainda foi lembrado ontem, pela imprensa – o festival do uso indevido dos cartões, objeto de uma CPI que não deve ter levado a resultado satisfatório. Tanto é, que o aumento da cobertura de gastos, com esse expediente, tem aumentado bastante.
O temor, quando o uso dos cartões corporativos passa a ser motivo para ser atribuído a "gastos secretos", é de que a falta de transparência alimente posturas que possam ser interpretadas, no mínimo, como suspeitas. Por que despesas pagas com o dinheiro do contribuinte têm de ser, necessariamente, mesmo em certos casos, secretas?
No fundo, no fundo, o comportamento autoritário, seja contra um cadeirante na rua, seja contra o contribuinte, que ao longo de 2010 injetou uma arrecadação de R$ 826 bilhões nos cofres do governo, é a medida de uma perversidade nacional. A frase – "Você sabe com quem está falando?" – ainda é o padrão em qualquer instância de poder.
Fonte: Estadão