Nildo Carlos Oliveira
O engenheiro Cândido Mariano da Silva Rondon foi um construtor de nação. Dois livros recentes, escritos por estudiosos estrangeiros, realçam e recolocam com maior destaque do que publicações brasileiras, essa característica do homem de origem indígena por parte dos bisavós maternos e da bisavó paterna.
Rondon nasceu em Mimoso (MT) no dia 5 de maio de 1865, portanto há 144 anos. Foi um desbravador de sertões e um explorador de florestas, responsável pela instalação pioneira de 2.270 km de linhas telegráficas e 28 estações de comunicação. É por isso que todo o ano, no dia 5 desse mês, se comemora aqui "O Dia das Comunicações no Brasil".
O caboclo, diretor de engenharia do Exército no período de 1919 a 1924, tem aspectos de sua vida analisados pela jornalista Candice Millard, de Kansas City, no caudaloso livro O Rio da Dúvida, em que narra a viagem do ex-presidente norte-americano Theodore Roosevelt e Rondon pela Amazônia, em 1914, para conhecer os mistérios daquele rio antes jamais explorado. A obra, para cuja elaboração a jornalista realizou ampla e documentada pesquisa, incluindo contatos no Rio de Janeiro com netos e outros descendentes do marechal Rondon, é uma publicação da Companhia das Letras, em tradução de José Geraldo Couto.
O outro livro, Rondon, da série Perfis Brasileiros, também daquela editora, é um trabalho do professor Todd A. Diacon, chefe do Departamento de História da Universidade de Tennessee em Knoxville (EUA. A obra aprofunda a análise sobre o trabalho do engenheiro, levando à conclusão de que ele não foi apenas o desbravador e o sertanista que, saindo da escola militar da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro, conduziu a bom termo a comissão construtora de linhas telegráficas ligando Goiás e Mato Grosso e, depois, estendendo-as até o Acre, atravessando 1.650 km de sertões e 1.980 km de selvas até então desconhecidas.
Rondon, responsável pela integração do País via instalação de linhas telegráficas, foi também quem manteve os primeiros contatos pacíficos com tribos indígenas da região, dentre as quais os bororos, terrena, nhambiquara, urupá, jaru, karipuna, ariqueme, guaraya e outras, deixando o caminho aberto para que naturalistas, geógrafos e outros pesquisadores e sertanistas consolidassem as aproximações. Uma de suas exigências era a de que os povos contatados fossem respeitados e colocados sob a proteção da comissão e, portanto, do governo. Foi a partir desses encontros pioneiros que ele cravou, para a posteridade, a frase célebre: "Morrer, se preciso for; matar, jamais". A expedição construtora e desbravadora de Cândido Rondon movimentava-se a pé, em canoas ou no lombo de bois e mulas. Uma de suas tarefas foi a construção da estrada entre Tapirapuã e a estação Utiariti para instalar um acampamento no Juruena, destinada a servir de base de operações entre os rios Juruena e Madeira e fixar o traçado da linha telegráfica. Em plena selva, ele costumava comemorar o 7 de Setembro com todo o ritual. Ordenava que o Hino Nacional fosse tocado em um gramofone levado na expedição exclusivamente para esse fim, e mandava que a bandeira brasileira ficasse hasteada num mastro comprido, cravado no meio do mato.
Quando designado pelo governo brasileiro para integrar a expedição de Theodore Roosevelt , destinada a conhecer o interior mais profundo do País, ele sugeriu ao ex-presidente norte-americano um empreendimento binacional mais ousado: explorar e mapear o rio da Dúvida. Em hipótese alguma ele queria ser apenas um guia turístico para norte-americano ver. A expedição teria de ser um empreendimento científico capaz de produzir resultados. E Theodore Roosevelt topou a parada, embora, reconhecesse, depois, os graves prejuízos materiais e humanos da decisão: homens, animais e apetrechos de viagem que sobrecarregavam a expedição, tiveram de ser deixados em alguns pontos, no meio do caminho, dada a inviabilidade de transportá-los.
Rondon foi, para Roosevelt, o modelo de homem e militar que ele aplaudiria e admiraria durante o resto de sua vida. Considerava-o um oficial disciplinado, estudioso e capaz de grandes ações humanitárias, motivo pelo qual o incluiu como um dos quatro maiores exploradores de seu tempo, ao lado de Roald Amundsen, Richard Byrd e Robert Peary.
O engenheiro e sertanista, forjado na filosofia de Augusto Conte (positivismo), fundou o Serviço de Proteção ao Índio e chegou a ser indicado para o Prêmio Nobel da Paz pelo Explorer´s Club de Nova York. Segundo o historiador Todd Diacon, "a invenção e reinvenção de Cândido Mariano da Silva Rondon continuará a acompanhar a invenção e a reinvenção da nação brasileira".
Frase da coluna
"A Medida Provisória 458, recém-aprovada na Câmara dos Deputados, permite legalizar milhares de posses de terras públicas com até 1.500 hectares (15 km²) nos Estados amazônicos. Com os adendos, chancela um festival de grilagem na região…" Da ex-ministra Marina Silva, em denúncia formulada em sua coluna na FSP.
Fonte: Estadão