Brasília, por Cingapura

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O inconcebível, o inacreditável, acontece. A princípio, não havia como acreditar. E não se trata de nenhum sentimento desses que podem ser considerados extemporaneamente xenófobos. Trata-se tão somente de uma reação natural, diante de fatos, de imediato, julgados rotundamente inaceitáveis.

Mas, deixando à margem essas manifestações de perplexidade, o que acontece é isso: Brasília, criação de três cérebros privilegiados – JK, o empreendedor; Lúcio Costa, o gênio do urbanismo brasileiro e Niemeyer, o gênio da arquitetura moderna aqui e alhures – vai sofrer um processo de revisão em seus fundamentos urbanísticos, tendo em conta a preparação da Capital Federal para os próximos 50 anos.

Engana-se, no entanto, quem imaginar a revisão como uma decorrência da extensão do pensamento nacional que orientou aquela arquitetura e aquele urbanismo. As alterações virão de fora, a partir de uma empresa estrangeira que sequer submeteu-se a uma concorrência internacional para participar de uma tarefa desse porte e que tivesse, até, a presença de escritórios de arquitetura e de urbanismo nacionais.

A empresa contratada pelo governo do DF, presidido pelo petista Agnelo Queiroz, sem licitação e pelo valor de US$ 4,5 milhões, é a Jurong Consultants, de Cingapura. Ela vai elaborar o que já está sendo chamado de projeto “Brasília 2060”.

Brasília, há 25 anos Patrimônio da Humanidade por decisão da Unesco, vem há tempos requerendo revisões. Ela extrapolou os limites de sua proposta original. E se torna evidentemente inviável com uma população superior a 2 milhões de habitantes.

Mas o Brasil dispõe de profissionais e de empresas de projeto e consultoria absolutamente capacitados para empreender uma revisão desse porte, segundo licitações elaboradas com critérios – inclusive abrindo campo para a participação de consultores externos – mas no esforço para a manutenção da identidade de uma criação que é um marco da excelência da arquitetura do País.

Entregar tal iniciativa a uma empresa estrangeira, segundo estratégias de negócios aparentemente intramuros, sem divulgação ampla de propósitos junto à sociedade e junto às entidades dos arquitetos, é mais do que uma inconsequência. O governo do DF deve vir a público para se explicar e, se possível, justificar-se.

Fonte: Nildo Carlos Oliveira


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