Uma data e horário que não podem ser esquecidos no calendário da engenharia: 12 de janeiro de 2007, 15 horas. Vinte e cinco operários avançavam nos trabalhos de escavação do túnel daquela estação. De repente ouviram um barulho que consideraram estranho. Em seguida, sentiram vibrações. Um deles contaria mais tarde que sentiu uma pressão sob os pés e seguiu os demais que, em pânico, chegaram ao elevador de serviços e, prensados e aos gritos, conseguiram chegar à boca do poço central, 30 m acima. Eles tiveram sorte. Outras pessoas, no entanto, ficaram sob os escombros.
A cena, vista a partir do Edifício Passarelli, lembrava um filme de Spielberg: parte do entorno do poço virou pó. Caminhões pesados e uma van utilizada em transporte público, rolaram terra abaixo como se fossem pequenos brinquedos esmagados no abismo. O desastre produziu uma cratera de 80 m de diâmetro, arruinou um trecho da rua Capri e provocou a interdição e, em seguida, a demolição de residências. Balanço final: sete pessoas mortas, seis das quais nada tinham a ver com as obras ali em execução.
Os dias posteriores foram de análises, especulações. Cada parte procurando minimizar sua responsabilidade. Mas estava evidente que a engenharia brasileira jamais sairia daquela tragédia sem algum arranhão.
Em nota sobre a ocorrência, o Comitê Brasileiro de Túneis assinalaria que o método adotado nas escavações daquele trecho da Linha 4 do metrô (linha Amarela), o NATM, é normalmente empregado em obras desenvolvidas em condições similares àquela e que a tecnologia de escavação mecanizada por esse meio está limitada a diâmetros da ordem de 12 m para maciços rochosos, como é o caso do local do acidente.
A Linha 4, um contrato de R$ 1,81 bilhão, parte financiada pelo Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento – Banco Mundial (Bird) – e pelo Japan Bank for International Cooperation (JBIC), vinha sendo marcada por outros eventos. Por exemplo: ocorrera, dias antes, o desabamento de uma residência na rua Sumidouro e, na rua dos Três Poderes, no Caxingui, várias casas estavam apresentando rachaduras por conta do uso de explosivos no trecho em processo de escavação. As queixas, nesse sentido se avolumavam.
Diante das primeiras evidências, de que a engenharia, no caso, teria de ser repensada, alguns técnicos assinalaram: “As obras atuais são seguras? Não há obra 100% segura”. A afirmação partiu de Alberto Sayão, presidente da Associação Brasileira de Mecânica de Solos e Engenharia Geotécnica (ABMS). E, mais adiante, em matéria reproduzida nesta revista, ele assinalava: “Num acidente há duas alternativas: ou houve falha técnica (projeto, construção, fiscalização) ou a obra foi concebida com um nível de risco inadequado”.
Fontes do mercado de engenharia lembram que na época, ensaios de consolidação do solo através de injeções chegarm a ser executadas com bons resultados – mas que sua aplicação foi descartada por vários motivos de custos
As manifestações sobre o desastre não pararam de aparecer na imprensa. A tal ponto, que diversas entidades programaram um seminário, sobre o acidente, no Instituto de Engenharia. Ali, no entanto, uma surpresa: durante as 6 horas e tanto de discussões, o problema do desastre jamais foi encarado de frente. Os participantes preferiram permanecer na fímbria dos assuntos do que “mexer no vespeiro”. A alegação era de que as análises das causas estavam com o IPT. Sob essa argumentação, tudo passou a ser motivo para escapismos.
Com o tempo, o Consórcio Via Amarela, responsável pelas obras da Linha 4, convidou o geólogo britânico Nick Burton para explicar o que seria um dos fatores principais do desastre. O expert internacional apurou que uma enorme anomalia seria aquele fator . Tratava-se de um bloco de rocha com nada menos do que 15 mil t, curiosamente não identificado no mapeamento do subsolo, que teria contribuído para a ocorrência.
As explicações de Burton causaram alguma perplexidade: Como rocha daquela dimensão não fora identificada nas sondagens? E, se não foi identificada nas sondagens, por que não foi percebida no curso das escavações ao longo do trecho? Que rocha “fantasma” seria aquela? O fato é que as explicações do notável expert não foram suficientes para esclarecer a origem da tragédia.
No fundo, havia a expectativa de que o acidente pudesse ser explicado como uma fatalidade da natureza. Contra essa idéia se insurgiram vários técnicos, dentre os quais o geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, que afirmou: “Deveria ser crime culpar a natureza por desastre da engenharia”. De qualquer modo, o jeito era aguardar o laudo do IPT. E este finalmente foi concluído, 17 meses depois do desastre.
O laudo, enfim
O relatório do IPT, conquanto haja sido contratado pela Companhia do Metrô (contrato no valor de R$ 6,55 milhões), foi elaborado com isenção. Aponta a responsabilidade do consórcio construtores na conjunção de fatores técnicos que acabaram produzindo o desmoronamento na estação Pinheiros.
Fonte: Estadão