É compreensível a obsessão, entre empresários e governo, quanto à necessidade do cumprimento, a qualquer custo, do cronograma das obras de infraestrutura para suporte aos três eventos esportivos internacionais que vêm aí pela frente: a Olimpíada Militar no Rio de Janeiro no ano que vem, a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016, também na cidade carioca.
Os prazos são uma inevitabilidade, conforme está registrado em matéria desta edição. Contudo, eles não justificam um posicionamento político que os coloque acima do bem e do mal. Datas são datas. Mas, o mais importante do que elas, é o legado que elas podem deixar para a sociedade.
Muitos se apegam às datas do calendário como um pretexto para justificar a obsessão. Para os que pensam desse modo, prazos são prazos e não há como deixar de fazer as obras previstas, mesmo que isso implique deixar à margem as práticas mais corriqueiras de um cuidadoso planejamento. Contudo, não deve ser assim.
O País dispõe de competentes empresas de consultoria de engenharia e de experiência em todos os segmentos da engenharia para cumprir as diversas etapas das obras, sem recorrer ao expediente do improviso, esquecendo-se de que a infraestrutura a ser construída, ampliada ou reformada, não deve atender apenas à demanda de um determinado período histórico, mas à demanda permanente da sociedade.
Temos aí exemplos de um lado e de outro. O exemplo da África do Sul, cujos jogos começaram com as obras de infraestrutura ainda em andamento, e o exemplo da Espanha, com a renovação urbana de Barcelona, que soube estruturar-se para os jogos olímpicos de 1992 e estimulou o renascimento desta cidade, hoje um ícone do ponto de vista de planejamento urbano e de revitalização econômica e social.
No Brasil, a peça-chave do processo é o governo. É ele que está com a bola nos pés para iniciar a jogada contra ou a favor da sociedade, nesse campo. A ele cabe direcionar as iniciativas, a partir das quais os empreendedores privados buscarão as adequações para seguir-lhes a orientação. E a ele compete também as iniciativas para um gerenciamento correto, isento, do cronograma. Como, nessa matéria, invariavelmente o governo se revela inapto, que convoque as empresas de engenharia capacitadas para isso a fim de que o trabalho resulte satisfatório e segundo as especificações técnicas adotadas.
A data no calendário não deve ser um pretexto para escapar às exigências da fiscalização e aos critérios técnicos recomendados. Hoje, já se está falando em "obras temporárias". Seriam empreendimentos realizados de afogadilho, como se o dinheiro público pudesse ser aplicado em obras que amanhã serão desmanteladas como um castelo de cartas e que não terão nenhuma utilidade posterior para a sociedade que desembolsou o dinheiro a fim de construí-las. No fundo, a opção por "construções temporárias" para dar solução provisórias ao sufoco em aeroportos, seria muito mais do que desperdício: seria uma irresponsabilidade.
E, por falar em tema dessa ordem, é de se chamar a atenção para mudanças enunciadas na Lei de Diretrizes Orçamentárias, prestes a ser votada na Comissão Mista de Orçamento do Congresso. O governo, contando com o braço parlamentar do senador Tião Viana (PT-Acre), apega-se à possibilidade da adoção da fiscalização por preço global – não porque esta seria uma medida mais saudável e eficiente, mas para criar mecanismo que lhe permita fiscalização mais flexível de obras que ele esteja contratando. Resumindo: através desse expediente, ele estaria golpeando o TCU, que há algum tempo determinou a paralisação de 41 projetos, incluindo 13 do PAC, por supostas irregularidades.
Todas as mudanças em legislação do gênero são justificáveis, desde que o objetivo seja o aperfeiçoamento em favor dos benefícios revertidos à sociedade. Quando, no entanto, têm em vista apenas a remoção de um obstáculo, de uma pedra no meio do caminho, é essencial condená-las.
Fonte: Estadão