Nildo Carlos Oliveira
A qualidade na engenharia, como em todas as atividades humanas, começa como uma luz acesa na inteligência. Ela não surge num piscar de olho, como uma descoberta instantânea. É uma sedimentação de experiências. Vem possivelmente desde que o sujeito abriu o primeiro buraco na montanha a fim de se proteger do vento, da chuva, do sol e dos animais. E agregou valores ao longo do tempo, derivando para a construção primorosa dos templos gregos.
Um conhecido de muitos anos, que se fez engenheiro e empresário de larga visão no autodidatismo e na intuição, chegou a concluir que engenharia é matemática e bom senso. Mas não é só. A engenharia, para alcançar o estágio da boa qualidade, passa primeiro pelo planejamento. A qualidade nasce como um ato de inteligência no primeiro esboço, no primeiro traço até se desenvolver para o pré-projeto e para o projeto definitivo.
O absurdo está em não se reconhecer esse ato de inteligência. Descartar o pensamento bem elaborado, antes de colocá-lo em prática, é negligenciar o risco de se estar cavando o próprio túmulo – ou o túmulo dessa insubstituível atividade humana.
Há por aí muitos exemplos estarrecedores de sandice de tal ordem. Às vezes, negligencia-se um projeto que previa a escavação do túnel de uma obra, inclusive de metrô, a determinada profundidade, a fim de fazê-la mais próxima da superfície. Barateia-se o custo, mas incide-se no risco de desmoronamentos ou de fissuras nas estruturas sob as quais o túnel será escavado.
A qualidade impõe o custo da inteligência, que deve ser simultaneamente um ato de consciência. E quanto custa a consciência?
Imagine-se construir um Boeing sem atentar-se, primeiro, para a qualidade do projeto, que deve ser um instrumento em permanente processo de recriação ou inovação, desde o primeiro traço, até a seleção das peças mínimas a serem tocadas pelos dedos hábeis do piloto exaustivamente treinado. O preço dessa estultice pode ser o fundo do mar.
E, no entanto, falar em qualidade às vezes eriça o ânimo pedante dos que raciocinam apenas com a planilha de custos.
Vamos e convenhamos: a qualidade na engenharia não pode ser vista como um leilão ao contrário: vai “levar” (construir) a obra quem oferece o menor preço. Deve ganhar quem oferece a melhor solução ou o projeto mais inteligente. Não se deve deixar que a engenharia, como uma atividade da inteligência, se estilhace como obra da imbecilidade humana.
(Este pequeno artigo, publicado há algum tempo em O Empreiteiro, é reproduzido aqui, na integra, dada a oportunidade para uma tomada de posição sobre o tema).
Fonte: Nildo Carlos Oliveira