Que o Trem de Alta Velocidade (TAV) não é mais prioritário no governo, já sabíamos de longa data. O grave é que, ao lado desse projeto, irrelevante diante das urgências do País, prioridades reais também perdem velocidade nos planos federais
Muita tinta com estudos, desenhos e gráficos e gestões políticas e econômicas internas e externas, além de análises sobre mudanças de projeto para atendimento de interesses municipais ao longo do traçado Campinas-São Paulo (SP) e Rio de Janeiro já escorreram sobre trilhos imaginários até que o governo se desse conta do inevitável: não há tempo para a construção do trem-bala para a Olimpíada e, sequer, para outros eventos internacionais futuros que acaso venham a acontecer no País. De modo que, conforme diz o ministro César Borges, dos Transportes, “o assunto não saiu de pauta, mas não está sendo priorizado”.
Para O Empreiteiro, que vem acompanhando o caso do trem-bala brasileiro desde os seus primórdios, ele jamais deveria ter sido prioridade. Já no editorial da edição OE 496, de abril de 2011, a revista salientava: “Desmorona a idéia de que o TAV é prioridade”.
A possibilidade da construção dessa obra adquiriu fôlego depois que o Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo e, o Rio de Janeiro, para sediar a Olimpíada. Houve euforia demais e racionalidade de menos. Foi passada à sociedade a justificativa de que o TAV seria essencial.
Antes mesmo de estudos sobre eventual demanda de passageiros e avaliação das taxas de retorno compatíveis para a contrapartida de investimentos privados e governamentais, difundiu-se pela imprensa um conjunto de vantagens que esse meio avançado de transporte proporcionaria. Mostrou-se até que o percurso, na ligação entre aquelas cidades, poderia ser feito em menos de duas horas. O executivo que por ventura tivesse encontros de trabalho no Rio de Janeiro poderia tomar o trem em São Paulo às 7 da manhã e ainda disporia de um tempinho no período para banhar-se em Copacabana, antes de partir para as reuniões programadas.
Mas o cronograma, o projeto, os interesses políticos e o preço da obra começaram a conspirar contra ela. Inicialmente o trem-bala fora orçado pelo governo em R$ 33,1 bilhões. Contudo, empresários de obras públicas, mais objetivos nas avaliações, calcularam que empreendimento de tal porte, cuja construção incluiria a transposição, em túnel, da Serra das Araras, além de uma sucessão muito grandes de outras obras de arte especiais ao longo de um traçado de 520 km, iria requerer cuidadoso estudo socioambiental, desapropriação de áreas rurais e urbanas, medidas compensatórias e montagem e manutenção de canteiros descentralizados. Ao final, a construção e o conjunto da superestrutura não deveriam ficar por menos de R$ 50 bilhões.
Outros problemas apareceram. Prefeitos de cidades situadas no caminho da futura ferrovia começaram a reivindicar “paradas estratégicas”. Ele deveria parar em São José dos Campos; em Aparecida (para embarque e desembarque de romeiros) e em outras cidades mais. Verificou-se, assim, que aos poucos, com essas reivindicações, o TAV correria o risco de se tornar mais um trem convencional.
Enfim, os dados reais se impuseram. Ora, se o País poderia dispor de tais recursos para o TAV, por que não utilizá-los em obras mais urgentes? Por exemplo: a expansão da rede de metrôs de São Paulo, Rio e por aí em diante. Além do que, havia uma série muito ampla de outras obras de mobilidade urbana, previstas para a Copa do Mundo, e que deveriam ficar como legado para as próximas gerações.
Diante de tais evidências, o TAV acabou perdendo a vez e a sua prioridade foi colocada em xeque. Mas as demais prioridades permanecem. O que estamos vendo, no entanto, é que até as iniciativas consideradas inadiáveis, estão perdendo a prioridade. Onde estão os monotrilhos prometidos para a Copa? Onde os BRTs? E as estações de transbordo de trens para os metrôs para facilitar os acessos dos torcedores? E os demais acessos? E os terminais portuários? E as obras aeroportuárias, muitas das quais ainda inconclusas? O TAV perdeu a prioridade e, lastimavelmente, obras mais urgentes, também.
Fonte: Nildo Carlos Oliveira