Uma visão crítica de alerta

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Observadores atentos avaliam potencial do País e seus desafios
Lições de casa em meio à turbulência

Em resposta à prioridade máxima do Brasil em 2009, de garantir o crescimento do PIB num cenário mundial de retração, são importantes as medidas anunciadas pelo governo, como a flexibilização dos depósitos compulsórios no Banco Central, a redução de impostos na indústria automotiva e eletroeletrônica além, ainda, do aumento dos investimentos públicos. Entretanto, tais providências são insuficientes, pois esbarram em problemas pontuais e estruturais não resolvidos, que dificultam bastante a reação do País à crise.
Dentre essas questões, a mais urgente é garantir que os recursos injetados no sistema financeiro por meio da liberação dos depósitos compulsórios cheguem à economia real. Sem essa conseqüência prática, a medida é infrutífera e desnecessária, considerando que os bancos brasileiros, felizmente, não estão precisando de socorro. Se esse dinheiro não for usado para financiar a produção e o consumo, é melhor que retorne ao Banco Central, sendo destinado a engrossar o investimento público.
Complemento decisivo à maior oferta de crédito pela utilização dos recursos dos compulsórios é a imediata redução dos juros. Todas as nações estão reduzindo as taxas, dando preferência ao fomento de suas economias ante um eventual recrudescimento da inflação. O Brasil, contudo, segue na contramão desse processo, mantendo os juros reais altos, apesar de as previsões mais atualizadas sobre os índices inflacionários indicarem recuo em 2009.
Quanto aos problemas estruturais, um dos mais graves é a cultura equivocada dos gastos públicos. Como é possível observar na peça orçamentária para o ano novo, aprovada pelo Congresso Nacional, o custeio da União é algo paradoxal ao perfil que se espera do Estado contemporâneo. É um conjunto de despesas resultante de várias décadas de equívocos na gestão dos organismos públicos, que continuam inchados, onerosos para os contribuintes e ineficazes no atendimento em áreas cruciais, como saúde, educação, segurança e infraestrutura.
Em épocas de vagas gordas, tais distorções ficam um tanto esquecidas, mas em períodos de crise mostram-se em sua plenitude e limitam o poder de reação do Estado. É óbvio que as medidas anunciadas pelo governo brasileiro para impedir a retração seriam mais consistentes em termos de volume de dinheiro, não fossem os recursos já comprometidos com a manutenção de uma estrutura pesada e anacrônica.
Tivesse a União, assim como estados e municípios, um custeio mais racional, seriam melhores as suas condições para socorrer a economia, tanto com o aumento dos investimentos públicos, quanto por meio de redução tributária mais ampla do que a anunciada. De maneira direta (com maior aporte financeiro em obras de infraestrutura e melhoria dos serviços públicos) e de modo indireto (permitindo que, em vez de impostos exagerados, as empresas investissem maiores valores na produção e no mercado), o governo ajudaria muito mais o País do que lhe permite uma peça orçamentária permeada de despesas supérfluas ante o presente cenário econômico.
Os elevados gastos estatais, é pertinente lembrar, também se incluem entre as causas dos juros altos, que refletem a generosa remuneração dos títulos públicos com os quais o governo gira sua imensa dívida, já quase do tamanho do PIB. Tudo isso é mais grave e visível no contexto da crise. Em momentos como este, torna-se um fardo ainda mais pesado para a sociedade e os setores produtivos arcar com carga tributária tão elevada quanto à brasileira. Assim, tem um gosto bem amargo iniciarmos o novo ano – com o fator agravante da recessão anunciada nos países desenvolvidos – sem a realização da reforma tributária. É frustrante observar que sequer o projeto do Executivo, ainda longe dos anseios nacionais quanto à redução dos impostos, tenha caminhado no Congresso Nacional.
E, por fim, diante de uma crise cujo tamanho e duração ainda desconhecemos, caberiam medidas governamentais de limite às importações, prestigiando o produto brasileiro e garantindo empregos aqui e não no Exterior. Há tempos temos alertado sobre todas essas questões, inclusive nos momentos de maior euforia dos mercados, quando os problemas ficam latentes. Mais do que nunca, o governo precisa dedicar-se à sua solução, pois a crise evidencia as fragilidades do País ante os furacões do sistema financeiro globalizado. Não fizemos as lições de casa quanto tínhamos céu de brigadeiro. Agora, teremos de realizá-las em meio à turbulência.

* Paulo Skaf é presidente da Federação e do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp)

Fonte: Estadão


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