Com investimentos previstos da ordem de R$ 1,7 trilhão até 2027, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que abrange obras nas áreas de transportes, energia, infraestrutura urbana, inclusão digital, saneamento, entre outras, precisa de projetos bem estruturados, governança na sua execução e de agentes públicos e privados com recursos para investir, além de contar com mão de obra qualificada disponível.
Nas versões anteriores do PAC, um dos maiores problemas foi a falta de cuidado na elaboração dos projetos básicos e executivos, ou até a ausência deles. Além de esticar o cronograma de obras, a má qualidade dos estudos de projeto pode elevar os custos finais da construção. “Os agentes públicos não se preocupavam com isso. O objetivo era contratar pelo menor preço possível e com tempo exíguo para elaboração do projeto básico”, afirma Sergei Augusto Monteiro Fortes, vice-presidente de Engenharia e Arquitetura do Sinaenco.
Segundo ele, a qualidade dos projetos acaba sendo incipiente. “Muitas vezes a lei de licitações é desrespeitada, pois projeto é trabalho intelectual e precisa ser contratado por técnica e preço, não só por preço. A lei também definia extensivamente o que precisa conter um projeto e o agente público costuma licitar obras sem um projeto completo”, assinala.
“Sempre privilegiando o menor custo e para dar início logo à obra, os agentes públicos atropelavam o processo. Havia casos em que não se previa sondagem do terreno, por exemplo. Como realizar uma obra de infraestrutura sem avaliar preliminarmente o terreno?”, questiona Fortes. “Isso fez cair muito a qualidade dos projetos e, consequentemente, das obras, que atrasavam, uma vez que se ia descobrir os problemas durante a construção.”
Esse “desprestígio da engenharia na infraestrutura”, como destaca Fortes, fez cair o interesse da mão de obra especializada, que migrou para outros setores. “Há ainda muitos engenheiros sênior e júnior no mercado, mas poucos plenos. Ou seja, o profissional que está em ascensão prefere optar por outros setores, uma vez que a renda nessa faixa está achatada. Isso vem diminuindo a oferta de profissionais qualificados no mercado e agora que o setor está aquecido pode impactar nas obras do PAC”, diz o vice-presidente do Sinaenco.
Mas a situação pode começar a mudar a partir do próximo ano, segundo Fortes. “Com as alterações na lei das licitações, que dá mais peso ao projeto, as coisas podem melhorar. A partir da nova legislação, que entra em vigor no final deste ano, a ênfase precisa ser técnica na contratação dos projetos, e não mais voltada exclusivamente ao preço. Naturalmente, isso vai fazer com que os projetos tenham mais qualidade. Por extensão, as obras públicas também tendem a melhorar na fase de construção”, salienta.
O novo PAC enfrenta desafios
“O setor está otimista com o Novo PAC, que foi anunciado em um contexto de novas regulações como a lei geral de licitações e a lei das estatais, que foram reformuladas, e que devem oferecer uma maior segurança jurídica para empresas e governos”, afirma Luiz Albert Kamilos, presidente do Sindicato da Indústria da Construção Pesada do Estado de São Paulo (Sinicesp) e vice-presidente da Brasinfra. “O setor da infraestrutura brasileira oferece melhores perspectivas para o desenvolvimento econômico, por meio de obras públicas nos setores rodoviário, saneamento básico, energia, habitação, entre outros”, completa.
Ainda que as perspectivas sejam otimistas, restam desafios a serem superados. “O cenário ainda é desafiador se analisarmos os investimentos mínimos necessários no setor. Para dinamizar a infraestrutura, em todos os níveis, calcula-se que seriam necessários investimentos correspondentes a pelo menos 3% do PIB nacional. Além de uma maior participação do Estado nos investimentos, o sucesso do Novo PAC está condicionado à governança e planejamento. O sistema logístico brasileiro ainda padece de uma estrutura de planejamento de médio e longo prazo”, destaca Kamilos.
Segundo o presidente do Sinicesp, os projetos e programas de obras, tanto em nível nacional quanto no contexto dos estados, foram estruturados contando com aportes significativos da iniciativa privada, por meio de concessões e PPPs. “Um dos efeitos não benéficos desses modelos é a impossibilidade de pequenas e médias empresas participarem dos editais, principalmente pela incapacidade de se alavancarem financeiramente para as disputas e posterior execução das obras”, afirma.
“A situação conjuntural afetou todos os setores da economia e o segmento de infraestrutura não ficou imune aos efeitos das dificuldades de 2021. Isso reduziu a oferta de profissionais nos canteiros. O ritmo dos novos projetos e das obras dita a dinâmica do mercado de mão de obra. É evidente que para uma situação de crescimento, a demanda será maior e os profissionais mais preparados serão disputados.
Neste momento as coisas estão sob controle, mas já há carência em algumas qualificações específicas e certamente isso se agravará com a efetiva implantação dos novos investimentos na execução das obras públicas”, avalia Kamilos. “O Estado precisa retomar seu protagonismo como principal agente financiador de obras públicas. O setor privado não poder ser o principal agente promotor do desenvolvimento da infraestrutura nacional”, conclui.