Ele me apareceu em fins da década de 1960. Eu e o Joseph Young tentávamos manter em pé a revista de arquitetura e urbanismo chamada Planejamento e Construção. Na época, a revista publicou o projeto das Torres Gêmeas, em Manhattan; editara obras iniciais de Ruy Ohtake, Cristófaro Cristofani, Siegbert Zanettini e projetos de Paulo Mendes da Rocha, Vilanova Artigas, Jorge Wilheim, José Magalhães Jr. e de outros arquitetos, que já eram nomes nacionais e outros, nem tanto.
Lembro muito bem quando ele me apareceu, porque, naqueles dias andava redigindo matéria sobre um dos grandes edifícios paulistanos, o prédio que abrigaria o Hilton Hotel, na avenida Ipiranga, então em fase de construção e que fora concebido “para funcionar como um grande transatlântico de luxo”.
O jovem engenheiro era espigado e gaúcho. E se revelava absolutamente obcecado pelo vento. Formado pela Escola de Engenharia da Universidade do Rio Grande do Sul, ele começou a falar sobre o tema que passaria a dominar toda a sua vida, até hoje: a ação do vento em prédios de grande altura.
Entupiu-me a mesa com papelada exibindo desenhos e cálculos. Dizia que, àquela altura, já não seria concebível a elaboração de projetos de arquitetura – e de estruturas – sem levar-se em conta um dos fatores fundamentais no trabalho. E me apontava, nos desenhos, como as estruturas deveriam incorporar os ensaios que teriam de ser realizados em canais específicos: os túneis de vento.
Até então, a engenharia civil começava a utilizar o túnel de vento de São José dos Campos para aquele fim. E, como prova da essencialidade desses ensaios, era indicada a obra de um hotel, no Norte, cuja estrutura, em modelo reduzido, não resistira ao primeiro farfalhar do vento. Com o impacto, esfacelou-se. O proprietário da obra exigiu novo projeto, desta vez imune àquele vexame.
Joaquim Blessmann evoluiu. Tornou-se nome nacional e, depois, internacional na matéria. Ganhou o título de doutor em ciências pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), do Centro Técnico Aeroespacial (CTA). Mais tarde teria papel preponderante no projeto do túnel de vento da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
De longe, depois que publicamos, na revista Planejamento e Construção, os seus primeiros trabalhos, pudemos acompanhar, nas décadas seguintes, o acervo técnico-cultural que ele foi acumulando. O consultor em aerodinâmica das construções, com estudos e ensaios sobre a ação estática e dinâmica do vento em obras com até 200 m de altura, desde torres hiperbólicas, pilares de viadutos, cobertura de ginásios e arquibancadas de estádios de futebol, estações de metrôs e terminais aeroportuários e outros empreendimentos, incluindo o mastro do pavilhão nacional em Brasília, passou a ter o nome divulgado nos maiores centros de ensaios e pesquisas do gênero no mundo.
Tornou-se imensa a contribuição de Blessmann nos aperfeiçoamentos de normas brasileiras, portuguesas, argentinas e de outras nações nesse campo. Tem artigos editados nas mais expressivas publicações científicas dos Estados Unidos e da Europa e resultados de suas pesquisas se encontram no Building Research Establisment Report, London; na norma belga Action du vent sur les constructions, na norma européia European Codes and Standards – Eurocode ENV 1991 e em outras publicações.
Ele hoje está aposentado. Contudo, a imagem que me ficou para sempre foi a do jovem engenheiro espigado, calmo, que me apareceu falando do vento. Até pensei que ele me procurara para falar do minuano, este, quase um personagem na obra de Érico Veríssimo. Mas o que ele queria mesmo era falar do vento no desenvolvimento da engenharia.