Nildo Carlos Oliveira
Está em circulação, desde o ano passado, a segunda edição de um livro polêmico: "Quebra de contrato, – o pesadelo dos brasileiros" – assinado pelo empresário Murillo Mendes, sócio da Mendes Júnior, e pelo jornalista Leonardo Attuch, com prefácio de Mauro Santayana. Produção editorial a cargo da Folium Comunicação (Belo Horizonte-MG), a obra é um documento com mais de 360 páginas, reunindo depoimentos de economistas, juristas e empreendedores, além de dossiês e de outras informações que acabam compondo o perfil de uma das maiores empresas de construção pesada do País: a Mendes Júnior, responsável por obras das mais importantes, realizadas dos anos 50 para cá.
O livro não se atém a dados e à visão de conjuntura econômica comumente conhecida. É trabalho de análise, que disseca o amadurecimento do pensamento empresarial brasileiro voltado para a industrialização, como um rompimento ao antigo modelo agroexportador. Apóia-se na História dentro do cenário do imediato pós-2ª Guerra Mundial, quando o País se lançou à ousadia desenvolvimentista e identificou, na carência de infraestrutura, notadamente nas áreas de transportes (rodovias, ferrovias, hidrovias) e energia, os seus maiores óbices.
Murillo e Attuch desenham o ambiente no qual a Construtora Mendes Júnior cresceu, participando de empreendimentos tais como a hidrelétrica de Furnas, as rodovias Transamazônica e Belém-Brasília, a Ferrovia do Aço, Itaipu e outras obras de grande porte.
No embalo de seu crescimento, ela se internacionalizou. E marcou o seu nome – e o nome do País – em obras no Iraque, já então considerado uma peça política preferencial no tabuleiro da política internacional. Naquela fase, conforme acentua Murillo Mendes, o Brasil não dispunha de divisas, mas tinha crédito no exterior. E, o Iraque, ao mesmo tempo em que nadava em petróleo, exibia um atraente programa do ponto vista de investimentos em infraestrutura. Contudo, veio a Guerra do Golfo. E a empresa, que fazia obras ali, contando com financiamento que envolvia instituições de direito privado controladas pelo governo brasileiro, não teve alternativa, senão preparar suas equipes de trabalhadores para o repatriamento.
A história da Mendes no Iraque não parou nesse capítulo. Poderia até se imaginar que, em razão da guerra e das determinações oficiais para que ela deixasse aquele país, haveria acordo pelo quais ela voltasse com a segurança de receber o que lhe era devido. Mas não foi isso o que aconteceu. O Iraque não pagou o que devia, os créditos acabaram repassados ao Banco do Brasil e este, em vez de tentar receber do governo iraquiano, executou a empresa, gerando o maior contencioso do gênero no Brasil.
Ao lado deste contencioso, houve outro. A Mendes construiu a hidrelétrica de Itaparica para a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco, chegando a banca a obra com seus próprios recursos, conforme reconheceram, na época, algumas autoridades da área de energia. Na hora do acerto de contas, no entanto, abriu-se campo para o segundo contencioso que debilitaria a empresa: o contencioso da Chesf. Apesar dessas duas pendências, que resultaram em centenas de pedidos de falência da empresa, o velho construtor mineiro resistiu. E continua na resistência.
No final do livro, no capítulo em que trata de "O império da lei e a lei dos imperadores", o empresário diz que os dois contenciosos tratam evidentemente de indenizações que são valores muito altos incidentes sobre companhias controladas pelo Estado. "No entanto, tais empresas são organizações de direito privado, assim como a Mendes Júnior. Portanto, as regras que valem para um lado devem valer para o outro. Afinal, a lei não discrimina. É igual para todos". Os fatos vão comprovar se será assim mesmo. Murillo dedica o seu livro aos cidadãos e empreendedores que acreditam na possibilidade da construção de uma sociedade na qual "prevaleça o império da lei e não a lei do imperador".
Fonte: Estadão