Um telefonema. E de imediato Tancredo atendeu o jornalista

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Tancredo Neves fora eleito em 15 de janeiro de 1985 o primeiro presidente civil do País ao final de mais de 20 anos de regime militar. A posse estava prevista para o dia 15 de março. Em fevereiro ele se encontrava no Palácio da Liberdade, em BH, quando a revista O Empreiteiro telefonou para ele

Havia uma grande expectativa quanto ao programa de obras que Tancredo Neves estava elaborando, com a sua equipe, para o começo de seu governo, em um cenário político que ficou conhecido como Nova República. Lastimavelmente, internado no Hospital de Base de Brasília, um dia antes da data prevista para a posse, ele veio a falecer mais tarde, em São Paulo, aos 75 anos, vítima de infecção generalizada. Hoje, invocando aquele tempo, Nildo Carlos Oliveira, que então respondia pela editoria executiva da revista, nos dá o seguinte depoimento:
"A ideia era fazermos matéria de capa antecipando o programa de obras do governo da Nova República. Tancredo fora eleito. Estava no Palácio da Liberdade, em BH, reunido com a sua equipe. Uma oportunidade e tanto para tentarmos obter, diretamente na fonte, algumas informações que consolidariam a matéria em perspectiva. Como fazê-lo? Simples. Telefonar para lá.
Mas, conversar com um homem que acabara de visitar vários países; que tinha uma agenda milimetricamente fechada em razão de tantos compromissos para montar o ministério e estabelecer uma política coerente com o novo Brasil que deveria surgir depois de tantos anos de ditadura, parecia missão impossível. Em particular, porque o nosso veículo era uma revista de engenharia, voltada para a área da infraestrutura, sem o alcance massivo dos grandes jornais e redes de televisão. De qualquer modo, telefonei-lhe.
O assessor de imprensa do presidente eleito, me surpreendeu. Passou-lhe o telefone como se o gesto fosse o ato mais natural. E conversei com o presidente Tancredo Neves como se estivéssemos um ao lado do outro. Rapidamente ele me falou de seu programa de governo, informando que, no que diz respeito a obras públicas, não abriria mão de duas prioridades: construção e emprego.
Na matéria publicada na edição 207 de fevereiro daquele ano salientei que a construção da Nova República não passaria apenas pela ordenação econômica, política e constitucional. Ela reclamaria (como está no texto original), alterações profundas na concepção da montagem da infraestrutura de obras no País, e que a infraestrutura seria o elemento indutor do impulso capaz de promover amplas melhorias no mercado interno brasileiro.
Da conversa rápida com aquele mestre da política extraí algumas lições: Primeiro: uma lição de humildade. Nada da imponência e da arrogância identificadas nas autoridades públicas que vieram se sucedendo e que se colocam em posição de inacessibilidade, como se fossem ungidas pelos deuses. Segundo: ele sabia exercer a arte da política com a precisão dos exímios esgrimistas do pensamento e da ação. Terceiro: tinha a sabedoria de trabalhar com o futuro. É dele a seguinte frase: `… pretendo lançar um programa de obras públicas espalhadas por todo o território nacional, sobretudo em áreas carentes, voltadas para o saneamento, melhorias urbanas e habitação popular.’
O plano do governo Tancredo Neves se apoiava, para ser viabilizado, em um processo de descentralização e privilegiamento de obras que permitissem a multiplicação de benefícios sociais. Lastimavelmente, ele não pode assumir o governo. E o vácuo provocado pelo seu falecimento perdura até hoje."

Fonte: Estadão


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