Com 12,4 km de extensão, a construção da maior ponte sobre lâmina d´água da América Latina, ligando Salvador a Itaparica, representa alguns desafios para a engenharia. Com investimento de R$ 10,4 bilhões, a concessão ocorre por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP) entre o Governo da Bahia e os grupos chineses CRCC e CCCC, que terá a duração de 29 anos e outros 6 anos de construção. Em fevereiro, o Tribunal de Constas do Estado (TCE) aprovou a homologação da proposta de consenso entre o Estado e Consórcio, destravando o processo para tocar as obras do empreendimento, cuja instalação dos canteiros de obras deve ocorrer no início de 2026.
Antes disso, os serviços de sondagem das fundações vêm sendo realizados pelo Consórcio Sondagem Ponte Salvador-Itaparica, formado por CHEC Dredging e a Concremat. O programa de sondagens previsto no projeto estima 102 furos ao longo de 12,4 km do traçado e no prazo de 8 meses.
Esse serviço se realizado com equipamentos convencionais causaria atrasos significativos no cronograma. O Consórcio optou então pela parceria com a FHDI – Fourth Harbour, que utilizou equipamentos de alta performance, com intercâmbio entre profissionais brasileiros e chineses, para enfrentar as dificuldades na campanha de sondagens da futura ponte. Foram empregados então três perfuratrizes e balsas de grande porte trazidas da China, da série HD, que possuem a tecnologia do Sistema de Compensação de Ondas, que usa sensores para detectar os movimentos do mar e ajustar a perfuratriz em tempo real.

ONDAS DE MAIS DE 2 M NO MAR
A Baía de Todos os Santos, segunda maior baía do mundo, enfrenta grandes variações de maré, ondas que chegam a ultrapassar 2 m, ventos fortes, correntes e intenso fluxo de embarcações. Por isso, é necessário mais tempo para deslocamento e estabilização da balsa, além de um equipamento estável e potente para perfurações profundas, a mais de 120m de profundidade, e obtenção de materiais do subsolo para análises geológicas. Também é essencial encontrar balsas que tenham espaço suficiente para a perfuratriz, o canteiro e a equipe de operação especializada.
Segundo a Concremat, havia ainda a necessidade de armazenamento adequado dos testemunhos durante a operação, para posteriores ensaios laboratoriais de solo e rocha, garantindo a integridade do material coletado e a qualidade nos resultados.
Esse trabalho é crucial para estudar o terreno e dimensionar as fundações da ponte. Atrasos nos testes impactariam o cronograma, aumentariam o tempo para elaboração dos projetos executivos, e gerariam custos extras com logística e riscos no transporte.
Com as três perfuratrizes e balsas chinesas, tendo as perfuratrizes da série HD a tecnologia de Sistema de Compensação de Ondas, foi possível reduzir o Root Mean Square Error (RMSE) em mais de 85%, permitindo uma operação mais estável e precisa, mesmo em condições de ondas altas, e possibilitando a obtenção de amostras de solo e rocha no local dos pilares de sustentação da ponte.
As amostras dos testemunhos foram embaladas, identificadas e armazenadas em um contêiner controlado na balsa. Depois, são enviadas para um laboratório no canteiro da obra, onde dois operadores realizam as análises. A operação ocorre em dois turnos, totalizando 16 horas diárias, com logística de apoio. Além disso, segundo o Consórcio, reuniões diárias, utilizando o método Lean Construction, ajustam a programação considerando as condições climáticas e marítimas.

RESULTADOS
Com os equipamentos apropriados, a execução da sondagem já ultrapassou 70%, mesmo em condições adversas do clima. Perfurações mais profundas, até 120 metros, aumentaram o tempo de trabalho, mas a conclusão da campanha, de acordo com a Concremat, cumprirá o prazo de 8 meses previsto.
Se utilizadas perfuratrizes convencionais, a produção esperada seria de no máximo 0,5 m de rocha/hora. Com o equipamento da série HD, a média foi de 1,2 m/hora por perfuratriz, aproximadamente 20 m/dia, considerando as 16 h/dia de trabalho.
Com três balsas simultâneas e dois turnos de operação, a Concremat atingiu a produção de 60 m/dia. Sem essa tecnologia, seriam necessárias 8 perfuratrizes e 48 balsas, em dois turnos, para manter o cronograma. Outro fator positivo, é que a decisão de instalar um laboratório próprio de solo e rocha no canteiro da obra proporcionou confiabilidade nos resultados e agilidade nos testes. Se terceirizados, os resultados demorariam um mês, mas no laboratório próprio o prazo caiu para apenas 10 dias, com
apenas dois operadores, uma redução de 67% no prazo.
COMO SERÁ A CONSTRUÇÃO DA PONTE SALVADOR-ITAPARICA
Com 12,4 km de extensão, a ponte Salvador-Itaparica, na Bahia, será a maior travessia sobre lâmina d’água da América Latina. No total, o complexo da ponte terá 46,4 km, considerando também os acessos viários (30km em Itaparica e 4 km em Salvador). Isso porque no projeto está prevista, além da construção da ponte em si, a requalificação dos sistemas viários da capital baiana e da Ilha de Itaparica. Até agora a maior ponte do Brasil, Rio-Niterói tem 13,3 km de extensão, mas inclui os acessos viários. Do total, apenas 8,83 km são sobre a linha d’água.
Acessos viários em Itaparica: o sistema viário de Itaparica possui aproximadamente 30 km de extensão, compreendidos entre a chegada da Ponte Salvador–Itaparica até a Ponte do Funil, através de uma nova rodovia projetada, que compreende a construção de viadutos incorporados em três interseções.
Recuperação e duplicação de trecho da BA-001, nas proximidades de Cacha Prego até a cabeceira da Ponte do Funil.

NO CURRÍCULO, PONTE ESTAIADA DE 5,3 KM
As sócias chinesas na Concessionária Ponte Salvador-Itaparica estãoentre as maiores construtoras do mundo. Listada na Bolsa de Valores de Hong Kong, a CCCC tem faturamento anual US$ 98 bilhões e mais de 100 mil funcionários. Com negócios em mais de 150 países, ocupa a 61ª posição no ranking da Fortune Global 500. É líder em segmentos como: construção portuária, estradas, pontes e fabricação de
guindastes e contêineres.
CCCC está entre as companhias que projetou e construiu as maiores pontes do mundo da atualidade:
sete das dez principais pontes; cinco das dez maiores pontes de suspensão; cinco das dez pontes estaiadas com os vãos mais longos e seis das dez considera das melhores pontes de travessia marítima. Um dos exemplos é a ponte Changtai Yangtze River Bridge, sobre o rio Yangtze, considerada a maior ponte estaia da do mundo, com comprimento total de 5,3 km e vão principal de 1.176 m.
Já a CR20, do grupo CRCC, é uma das 500 maiores empresas do mundo, com faturamento anual na casa dos US$ 154 bilhões, 20 mil funcionários e presença em mais de 20 países e regiões. A companhia projetou e construiu importantes rodovias e pontes na China: autoestrada de Six Daxing para o Sinan, incluindo ponte de 1,2 km de comprimento e 29,7 m de altura; autoestrada de LJ-Four Yanan para Yanchuan – sistema de 13 pontes, sendo que cada ponte com cerca de 2,5 km de comprimento e 36,5 m de altura; e autoestrada de JJTJ–Three Jianli para Jiangling – uma ponte de 2,5 km de comprimento e 27,9 m de altura.

De acordo com a Concessionária Ponte Salvador-Itaparica, não apenas a capital baiana e a Ilha de Itaparica serão beneficiadas pela ponte, mas 250 municípios e cerca de 10 milhões de pessoas serão impactados pela obra. Além disso, com a ponte e os acessos, cerca de 100 km de estrada serão evitados e mais de 40% do tempo de viagem será reduzido por não ser mais necessário realizar o contorno pela BR 101, além de facilitar o acesso a outras regiões da Bahia e outros Estados, aproximando destinos turísticos da capital.
Já sobre a montagem dos canteiros de obras (ao menos um em cada cabeceira da ponte) haverá também uma espécie de canteiro flutuante sobre balsas, no mar. “As balsas seguem o modelo robusto do projeto, pois receberão guindastes, máquinas e equipamentos de grande porte e toda a logística para construção que uma estrutura dessa exige”, contou Cláudio Villas Boas, CEO da Concessionária Ponte Salvador-Itaparica.
A construção da estrutura foi dividida em três etapas: trecho de aproximação na Ilha de
Itaparica, com 4,6 km; etapa em Salvador, com 6,9 km de extensão; e trecho estaiado, com 0,9
km de comprimento e 85 m acima do nível do mar. Isso vai permitir a navegabilidade de navios
de grande porte, como transatlânticos, petroleiros, ferry-boat e plataformas de petróleo. A ponte contará com pistas em ambos os sentidos, cada uma delas com duas faixas, e uma terceira
faixa que, inicialmente, funcionará como acostamento. No pico das obras, cerca de 7 mil trabalhadores comporão a força de trabalho.
A espanhola Sener Engenharia e Sistemas é a empresa de engenharia
responsável por elaborar o projeto offshore.
PONTE COMPREENDE QUATRO TRECHOS, TÚNEIS E VIADUTOS
- Acessos viários em Salvador: construção das estruturas que compõem os acessos entre os bairros da Calçada e Água de Meninos e um conjunto de viadutos, além de dois túneis praticamente paralelos aos existentes na Via Expressa.
- Ponte Salvador-Ilha de Itaparica: após conclusão do sistema viário de Salvador, começam as obras de 12.4 km de extensão da ponte. Nesse trecho do empreendimento, a construção foi dividida em três etapas: aproximação da Ilha de Itaparica, de Salvador e trecho estaiado.